Por Marcos Danhoni *
“A pior das instituições gregárias se intitula Exército. Eu o odeio. Se um homem puder sentir qualquer prazer em desfilar aos sons de música, eu desprezo este homem ... Não merece um cérebro humano, já que a medula espinhal o satisfaz. Deveríamos fazer desaparecer o mais depressa possível este câncer da civilização. Detesto com todas as forças o heroísmo obrigatório, a violência gratuita e o nacionalismo débil. A guerra é a coisa mais desprezível que existe. Preferiria deixar-me assassinar a participar desta ignomínia”.
Albert Einstein
Vou dividir esse artigo em quatro episódios para demonstrar os “porquês” de as Forças Armadas brasileiras serem consideradas enclaves institucionais destinados ao golpismo e ao assassinato em massa.
Cité Soleil, Porto Príncipe, Haiti – 6 de julho de 2005:
A “força de paz” da ONU no Haiti (Mission for Stablization of Haiti - MINUSTAH) liderada pelo general Augusto Heleno, com a desculpa de desarmar rebeldes presumivelmente armados, ordena uma incursão de suas tropas e abre fogo contra a população da favela de Cité Soleil, na capital do país caribenho. Na matança, que resultou em mais de cem pessoas abatidas a tiros, ordenada pelo general Heleno, a vítima mais conhecida foi Dread Wilme, líder comunitário aliado do ex-presidente do Haiti exilado, Jean-Bertrand Aristide. Numa ação golpista, Augusto Heleno, com esse homicídio múltiplo, e a mando dos EUA, assassina uma liderança de oposição no mais pobre país da América Latina.
A ação em Cité de Soleil não foi o único crime cometido pelas tropas do general brasileiro. Centenas ou milhares de mulheres naquele país foram violentadas por soldados de sua tropa. Heleno fechou seus olhos complacentes para esse crime em massa. Porém, a ONU o expeliu logo as acusações virem à tona. (Importante lembrar que é no Haiti que se formará o plano para os golpes de 2016 e 2018, com a deposição ilegal de Dilma, a prisão de Lula e a eleição de Bolsonaro, usando fraudes alicerçadas na Lava Jato e no impulsionamento maciço de fake news).
Arraial de Canudos, Bahia – 5 de outubro de 1897:
Depois de quatro expedições de ataque do Exército Brasileiro contra o Arraial de Canudos e seu líder, Antônio Conselheiro, a revolta é suprimida ao preço de muito sangue derramado. Em 5 de outubro de 1897 termina a guerra fatricida: o populacho famélico se rende, com o glorioso Exército Brasileiro prometendo poupar a vida dos derrotados. No entanto, a promessa não é cumprida e todos são mortos e degolados. Antônio Conselheiro também estava morto. Ele havia falecido de disenteria em 22 de setembro daquele ano.
Acosta Ñu, Paraguai – 16 de agosto de 1869
Estamos nos estertores da Guerra do Paraguai. O glorioso Exército Brasileiro trava sua última batalha contra os insurgentes de Solano López, presidente do Paraguai. Seus últimos bastiões de resistência estão numa força popular de seis mil pessoas, a grande maioria formada por adolescentes e crianças. Esta batalha ficou conhecida como “La Batalla de los Niños”. As forças da Tríplice Aliança (Brasil-Argentina-Uruguai) somam 20 mil homens. O embate durou oito longas horas, com a destruição total das forças paraguaias. Nosso exército não concedeu a graça a nenhum dos derrotados e assassinou em massa os últimos sobreviventes, degolando todos. Na História que reescreveriam depois, deram ao entrevero o nome militar de “A Batalha de Campo Grande”.
Em algum lugar na lúgubre Ditadura Militar de 1964:
O coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, famoso meganha e torturador bajulado pelas Forças Armadas brasileiras, e com licença para matar concedida pelos monstros que conspurcaram o poder no Golpe de 1964, diverte-se com as torturas e sevícias ao casal Telles. Não bastasse isso, prende os dois filhos do casal, de 4 e 5 anos, e torturam pai e mãe com choque elétricos e na cadeira do dragão. Os filhos aterrorizados são impedidos de consolar seus pais que perdem sangue, vomitam e urinam na sala de escura. Este foi um entre milhares de atos de tortura permitida pelo Estado terrorista implantado a partir de 1964.
As Forças Armadas brasileiras estão repletas de histórias de monstruosidades, golpes e assassinatos de Estado. O legado destes episódios é a ignomínia de uma instituição golpista por natureza, corrupta e repleta de bestas-feras dispostas a destruir a democracia para acomodar seus egos e locupletarem-se com o botim da guerra que empreenderam em direção ao genocídio e ao sepultamento da razão.
*Marcos Cesar Danhoni Neves é professor titular da Universidade Estadual de Maringá e autor do livro “Lições da Escuridão”, entre outras obras.
**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.