Violência contra a mulher: ouçam e apoiem as vítimas!, por Li Lacerda

Deixar de dar voz, likes ou audiência a acusados ou condenados por violência contra a mulher não é censura, é proteção à sanidade mental das vítimas.

Foto: Governo do Estado de Mato Grasso do Sul
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Por Li Lacerda *

Investiguem os suspeitos. Quando uma mulher sofre qualquer tipo de violência e procura o amparo da Justiça para impor limites ao seu sofrimento, a Justiça faz sua parte: impõe medidas protetivas em desfavor do agressor pressupondo que este vá obedecer à determinação judicial. Impõe ao pleito o sigilo de justiça para que a mulher, mais segura, tenha condições de seguir com sua vida. Mas e quando o abusador tem voz, visibilidade e uma rede de proteção? Como fica a vítima?

Nesse ano trágico, denúncias de violência contra a mulher ganharam a grande imprensa e repercutiram nas mídias sociais. Sim, os fatos narrados chocam e revoltam. Alguns acusados experimentam as consequências sociais e profissionais antes mesmo de um desfecho judicial. Mas e a vítima? O sigilo que se impõe sobre a identidade para sua legítima proteção é incompatível com a voz e visibilidade que se dá ao acusado quando o mesmo é uma pessoa pública. O Judiciário brasileira acumula casos estarrecedores de atletas, artistas, políticos, escritores, executivos, empresários, jornalistas, funcionários públicos de elite que respondem ou foram condenados em processos de violência contra a mulher, mas que são beneficiados pelo segredo de justiça, pela vergonha ou medo das vítimas de retaliações, ou julgamento pela exposição. Pior que isso, são homens que se beneficiam do fato de serem pessoas públicas e que estão mantendo a imagem de profissionais exemplares, bons pais, bons cidadãos, engajados em campanhas sociais inclusive de violência contra mulher.

Existem casos que vão além da falta de dignidade: aqueles em que os chefes dos abusadores têm consciência das graves acusações, mas preferem ignorar em nome do que só uma força superior pode explicar, ou não tomam a posição de checar tais acusações. Ou seja, a negativa do acusado basta! Só tomam posicionamento quando pressionados pela repercussão posterior ou por pressão de patrocinadores. E acreditem, muitas empresas que têm mulheres como seu público alvo empregam e/ou patrocinam, com conhecimento ou não, esse tipo de aberração. E nesse círculo vicioso, vítimas adoecem e lotam o sistema público e privado de saúde para longos e caros tratamentos psicológicos. 

Opiniões de seus agressores como se estivessem acima de qualquer suspeita. Mulheres que estão atrás das telas de seus celulares e computadores lendo, enojadas e revoltadas postagens de abusadores recriminando com opiniões sobre abusos que eles mesmos na escuridão praticam. Homens investigados, processados ou condenações por violência física, psicológica, moral e patrimonial contra mulheres. Homens com histórico de boletins de ocorrência na casa das dezenas, medidas protetivas (sim, no plural) ativas contra si. Ações criminais de toda sorte e artigos do código penal, que vai de ameaça e ao estelionato. Homens com esqueletos de homofobia e preconceito mantidos embaixo de seus tapetes, "personalidades" que mantêm a "boa imagem pública" coagindo e ameaçando qualquer um que publique algo sobre sua vida pregressa. Negam os fatos, ameaçam, acusam vítimas de forjarem provas, alegam que não foram condenados em última instância.

Investiguem! Até porque muitos usam o artifício de ignorar ou fugir da Justiça para não responderem por seus crimes.

A manifestação do acusado deve ser junto ao poder Judiciário e somente lá. A Justiça não torna uma pessoa ré sem indícios de crime. Juiz só concede medida protetiva quando a mulher de fato está em risco. Vitimismo de acusados em redes sociais e imprensa não é presunção de inocência para dar fim a vigilância da sociedade. Investiguem!

Deixar de dar voz, likes ou audiência a acusados ou condenados por violência contra a mulher não é censura, é proteção à sanidade mental das vítimas. É não colocar sal na ferida da vítima, é não expor sua dor em carne viva em praça pública!

Ouçam as vítimas e as protejam!

*Li Lacerda é jornalista de entretenimento, integrante de movimentos sobre feminismo negro e ativista pelo combate de violência psicológica contra a mulher. 

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.

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