Os desafios de comunicar em um mundo sem empatia

A ausência do lugar de debate onde, por essência estaríamos, conectados

Reprodução/Trespontos Labs
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Por Mariana Lélis* e Thiago Ribeiro** Não parece ironia que justo a era da conectividade seja lembrada também pela decadência da empatia? Agora, imagina os desafios de comunicar ideias, visões de mundo, debater caminhos e buscar a construção de um projeto comum e colaborativo, em torno do que é público. Pois atores políticos, instituições públicas, partidos, imprensa, entre tantos, vivem diariamente o desafio de comunicar em um mundo, ao que tudo indica, carente de empatia. Vamos falar um pouco sobre isso… Uma questão de empatia Entendida como a capacidade de olhar pela lente do outro, sentir o que outro sente, estar no lugar do outro, a empatia, importante para o convívio social, quem sabe até uma questão de sobrevivência, tem perdido espaço para uma espécie de vazio, onde antes deveria haver um lugar comum, um espaço de encontro. Em se tratando de Redes Sociais, parece que a coisa toda é ainda mais profunda. Em tempos de polarização, acúmulo de atividades, multi formatos, múltiplas telas, múltiplas possibilidades, parece que reconhecer, ouvir e respeitar o ponto de vista do outro é uma habilidade que as pessoas (eu, você, eles e elas) estão perdendo, pouco a pouco, em alguns casos, ou aos montes, quando se trata do debate político. Parece que no meio de likes, memes, fakes e até correntes, nos perdemos. Perdemos a nós mesmos, enquanto perdemos a capacidade de encontrar os outros. Em "Desabilidade" (Editora Nós), o escritor italiano Roberto Parmeggiani aborda nossa incapacidade de nutrir relações com aquele que difere de nós. Esse cenário tem se refletido no comportamento de usuários das redes, que assumem postura muitas vezes arbitrária, incoerente, intolerante e até maldosa. Há ódio, há ignorância, quando não, indiferença e silêncio. Não há reconhecimento do outro, tão pouco respeito por suas ideias e seu lugar. Uma escapada agora do universo digital, para uma possibilidade assustadora: será que isso não seria reflexo do que somos também no dia a dia, nas relações com colegas de trabalho, amigos e familiares? Sem aquela velha dicotomia entre real e virtual, que nem cabe mais, ainda resta a provocação: somos assim na rede, porque somos assim na vida? Não há comunicação sem empatia Voltando ao nosso desafio inicial: imagine você, ator político, entidade pública, partidária, mandatário ou postulante, profissionais de comunicação, veículos de imprensa: consegue imaginar o tamanho do problema que temos pela frente? Vamos ao básico. A comunicação remete ao um espaço comum, um lugar onde o singular não existe. O que digo só existe de fato quando ecoa no seu entendimento, seja pela concordância, seja pela discordância, nunca pela indiferença. Meu debate não existe sem suas ideias, mas nós estamos matando o interlocutor, como quem mata o mensageiro. Por aqui, e talvez no mundo todo, o debate virou sinônimo de discórdia e, na falta de habilidade de construir o consenso, eventualmente possível mas não obrigatório, optamos sempre pela cisão e pelo rompimento. E é nesse lugar que produzir conteúdo para seus perfis na Rede, caro amigo, cara amiga, mais do que nunca, deveria pressupor o debate, abrir janelas para que os passantes participem, entrem e se sintam realmente em casa para discordar. Por isso, o que importa não é tanto o que você quer dizer, mas o tema que você pretende discutir. A verdade não é sua, provavelmente nunca será, mas isso não é o desmonte do posicionamento, do seu lugar de fala, da sua visão de mundo, mas a clareza de que suas verdades não são o fim, mas o início do debate. Do outro lado, haverá sempre as verdades do outro, cada um com a sua, e é aí que acontece a magia. Não é o conteúdo, são conversas que importam O melhor conteúdo, portanto, não será aquilo que você tem a dizer, mas o debate que você deseja travar. Não à toa, o conteúdo, antes rei, tem seu espaço (ainda nobre) relativizado pela importância das interações. Não é novidade, embora seja um conceito que ainda provoque resistências, que são as conversas que importam, não o que você diz. As conversas são organismo vivo, e tem vontade e dinâmica próprias, porque dependem do outro. O resto é uma escolha. Então, entenda que seu papel, como ser político, é promover o debate e não dizer coisas. Agora, use sua imaginação para trazer essa reflexão para sua rotina, na vida e nas redes, principalmente quando estiver planejando seu conteúdo, administrando sua presença online: como criar um espaço comum, se você não consegue enxergar o lugar do outro? Como fazer um trabalho com empatia em um ambiente sem empatia? E, por fim, em um mundo tão veloz, conectado e fluído, em que atenção das pessoas talvez seja o bem mais disputado de todos, há sempre pouco tempo para ouvir e, naquilo que sobra, só nos resta falar. Certo? Errado. Ou melhor. Vamos debater mais sobre isso?   *Mariana Lélis é jornalista, especialista em Monitoramento e Presença Digital. Atua na área de política **Thiago Ribeiro é publicitário, fundador da Trespontos Labs, especialista em Comunicação e Inteligência Política no Ambiente Digital