A disputa judicial entre Maria Zilda Bethlem e a TV Globo pode inaugurar um novo capítulo na relação entre atores veteranos e a maior emissora do país. A atriz, que trabalhou na Globo por cerca de 40 anos, move um processo contra a empresa alegando que suas obras foram licenciadas para terceiros sem autorização e que os pagamentos pelas reprises seriam injustos e desproporcionais. A ação, ainda em julgamento pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, pode abrir caminho para que outros artistas também reivindiquem valores mais altos pelos chamados direitos conexos.
Nos documentos da defesa da Globo, aos quais a reportagem da coluna Outro Canal, do UOL, teve acesso, a emissora afirma que a ação da atriz "beira a má-fé" e a acusa de tentar "enriquecer ilicitamente". A empresa diz ainda que Maria Zilda teria recebido R$ 218 mil entre 2018 e 2024, conforme registros que ela mesma anexou ao processo – os quais, segundo a Globo, foram fornecidos por seu setor jurídico.
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A emissora argumenta que todos os contratos assinados pela atriz previam, expressamente, a possibilidade de exibição, reexibição e licenciamento das obras sem necessidade de autorização adicional. "Beira a má-fé a afirmação de que as obras audiovisuais teriam sido 'ilicitamente licenciadas a terceiros'", afirmou a Globo nos autos, reforçando que não há ilegalidade nos pagamentos realizados nem na distribuição do conteúdo.
A atriz, por sua vez, afirma que durante décadas de trabalho com a empresa, não havia uma legislação específica nem cláusulas contratuais claras que abordassem remunerações por reprises em TV por assinatura ou streaming. Na ação, Maria Zilda também critica os valores pagos nos últimos anos, que considera abaixo da realidade do mercado. Em 2020, durante uma live com a atriz Maria Padilha, ela revelou ter recebido apenas R$ 237,40 pela reprise da novela Selva de Pedra (1986) no canal Viva.
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Sem atuar em novas produções da Globo desde 2016, quando participou da novela Êta Mundo Bom, a atriz exigiu que a emissora apresentasse seus contratos à Justiça. A Globo, por sua vez, alegou que sempre forneceu a documentação sempre que solicitada, mesmo sem ordem judicial.
Contorrnos coletivos
Mais do que uma disputa individual, o processo movido por Maria Zilda pode ganhar contornos coletivos. A iniciativa da atriz é vista por alguns no meio artístico como um possível precedente para outras ações semelhantes. Nomes como Mateus Solano, Tuca Andrada, Sergio Marone, Nívea Stelmann e até Sônia Braga já se manifestaram publicamente sobre os baixos valores pagos pelos direitos de reprises.
Se a Justiça entender que há brechas ou omissões nos contratos da época — especialmente no que diz respeito às novas mídias como o streaming — a decisão pode abrir margem para que outros atores também busquem compensações financeiras.
Procurada, a Globo limitou-se a dizer que "não comenta processos em andamento". Maria Zilda não respondeu aos contatos da reportagem.
Enquanto o processo corre na Justiça do Rio de Janeiro, os desdobramentos são acompanhados de perto por profissionais da indústria audiovisual. O caso pode não apenas redefinir a forma como se calcula o valor de reprises, mas também provocar uma revisão nos contratos firmados nas últimas décadas com artistas da televisão brasileira.