EMOÇÃO E FÉ

Frase de Dom Pedro Casaldáliga em novela emociona o Brasil

O bispo poeta do Araguaia ganhou vida nas palavras do personagem interpretado por Irandhir Santos e gerou comoção nas redes sociais

Cena da novela Renascer - Tião Galinha (Irandhir Santos) cita Dom Pedro Casaldáliga.Créditos: Reprodução/TV Globo
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O Brasil se emocionou hoje ao lembrar de Dom Pedro Casaldáliga, numa fala magistralmente interpretada por Irandhir Santos, que encarna o personagem Tião Galinha. O ex-catador de caranguejo se torna a voz potente na luta dos sem-terra e durante a assembleia dos camponeses, resgata o texto memorável do poeta do Araguaia, o bispo dos pobres:

“Malditas sejam todas as cercas!
Malditas todas as propriedades privadas que nos privam de viver e de amar!
Malditas sejam todas as leis, amanhadas por umas poucas mãos, para ampararem cercas e bois e fazerem da terra escrava e escravos os homens!”

Rapidamente o vídeo com trecho da fala do profeta claretiano tomou as redes sociais e aplicativos de mensagens. E não é pra menos. Em tempos de aridez e fundamentalismo religioso que se alastra entre católicos e evangélicos, relembrar a frase marcante e carregada de denúncia profética de Casaldáliga é um refrigério para aqueles que ainda têm alguma identificação com o Cristo dos Evangelhos, tão diferente do apresentado pelos super pastores e padres estrelas.

Quem foi Dom Pedro Casaldáliga

Pedro Casaldáliga nasceu em 1928, em Balsareny, na região da Catalunha, Espanha, em uma família católica. Desde cedo, enfrentou a repressão violenta, marcada pela martirização de seu tio, padre Luís, junto com dois companheiros em 1939, um evento que influenciou profundamente sua vocação religiosa.

Casaldáliga possuía diversos talentos artísticos, incluindo poesia, cinema, teatro e música. Após ser ordenado padre claretiano, ele assumiu várias missões que compatibilizavam com seus dons, tornando-se educador, mestre de noviços, redator de revista, líder dos Cursilhos de Cristandade e missionário junto a operários, migrantes e refugiados. Seu trabalho missionário o levou à Guiné-Bissau, onde se deparou com as dificuldades do Terceiro Mundo, o que o motivou a seguir em missão para o Brasil.

Em julho de 1968, o religioso estabeleceu-se em uma comunidade missionária na região do Araguaia. Em 13 de março de 1970, o Papa Paulo VI criou a Prelazia de São Félix do Araguaia, uma área de 150 mil km², e nomeou Casaldáliga como seu primeiro bispo prelado. Sua ordenação episcopal ocorreu em 23 de outubro de 1971, às margens do rio Araguaia.

Ao chegar em São Félix do Araguaia, encontrou um povoado de apenas 600 habitantes, sem escolas e com apenas um hospital para atender aos indígenas. A região carecia de infraestrutura básica, enfrentando fome crônica, doenças endêmicas, exploração de mão de obra, trabalho escravo, violência, altos índices de mortalidade infantil, analfabetismo e prostituição.

Profundamente comovido pela miséria e marginalização, Casaldáliga optou por uma vida simples e simbólica, rejeitando os adornos tradicionais da mitra, báculo e anel episcopal. Em seu convite de ordenação episcopal, ele destacou sua escolha por uma vida austera e dedicada ao povo. Dedicou-se inteiramente aos indígenas, camponeses e ribeirinhos, confrontou a exploração capitalista e a miséria do povo sertanejo desde o primeiro dia, identificando a injustiça e o uso criminoso do Estado contra os pobres como causas da opressão, tornando-se um defensor da Teologia da Libertação, optando pelos pobres e adotando o lema episcopal "humanizar a humanidade". Rejeitou os símbolos tradicionais do poder eclesiástico, preferindo ser chamado simplesmente de Pedro.

Sua radicalidade e compromisso com os pobres fizeram dele uma figura venerada. Ficou conhecido por sua coerência com o evangelho, sua poesia simples e tocante, e sua capacidade de inspirar e transformar corações e mentes. Pedro deixou um legado de luta pela justiça social e de dedicação aos mais vulneráveis.