O ator Zé de Abreu tem sido alvo há pelo menos 6 anos de uma série de críticas e acusações envolvendo suposta obtenção irregular de recursos da Lei Rouanet. Segundo o próprio ator, as difamações começaram ainda na época do governo Michel Temer, quando estava em evidência o discurso da bancada evangélica que engajava apoiadores contra supostos beneficiários da lei, após exposições e apresentações que chocaram a moral religiosa do setor. Naquele momento, essa era uma pauta que aglutinava setores da extrema direita.
“Recebi a ligação de um dos assessores do Ministério da Cultura (MinC), que trabalhava com a Lei Rouanet. Ele é antropólogo, e falou que estava uma perseguição terrível lá dentro contra os funcionários, aquela coisa de assédio contra simpatizantes do PT, e todo mundo indo atrás de rede social dos funcionários. Ele disse que não estava aguentando e tinha pedido demissão. Também falou que estava um ‘pega pra capar’ lá dentro e que eu era o mais visado. E aí começa a aparecer o Luciano Hang e outras figuras da direita, pegam um projeto em que eu era ator, e começam a botar nas redes como se eu fosse o proponente”, explica.
O ator explica que a responsabilidade sobre os projetos é do proponente, ou seja, do CPF ou CNPJ que assina o projeto. Ele, no caso, seria apenas um ator escalado para trabalhar.
“Pegaram o projeto de uma ex-mulher minha, que estava aprovado e arquivado fazia dois anos, reabriram o projeto e começaram a inventar que eu tinha que devolver R$ 360 mil, R$ 390 mil, cada hora era um valor. E eu não tinha nada a ver com isso”, conta Zé de Abreu. De acordo com o ator, o projeto sequer se tratava de um patrocínio da Petrobrás, como declarado na ocasião pelos detratores, mas de uma aquisição de espetáculos em viagem. A cada dez cidades em que a peça era apresentada, a produção recebia um pagamento pelo serviço prestado.
Mais tarde, em 2019, já no governo Bolsonaro, e em meio a um contexto em que Zé de Abreu fazia o personagem de “presidente autodeclarado do Brasil” para ironizar o então recém empossado presidente, circularam na internet novas informações falsas sobre o ator e sua suposta utilização indevida dos recursos da Lei Rouanet.
“Eu não conseguia provar que não tinha nada a ver com isso, então me botaram na CPI da Lei Rouanet e fiquei como número um lá, pra ser convocado. Mas nunca fui. Chegaram a ligar para Paris, onde eu estava, dizendo que iam mandar o jatinho da Polícia Federal me buscar como se a PF tivesse jurisprudência na França. Pegaram uma suposta nota fria de uma ex-mulher minha e como é que eu vou saber se isso é verdade, uma vez que não tenho acesso ao processo e o projeto estava arquivado fazia mais de dois anos? Eu tenho aqui a cópia do projeto arquivado. Os caras abrem e começa a aparecer nota fiscal fria? Como é que eu vou saber se é verdade? De toda forma, não conseguiram achar nada no meu nome”, relatou.
Agora Zé enviou um ofício ao MinC solicitando sua situação cadastral. Na resposta, o ofício aponta um único projeto em que o ator figura como proponente. Uma peça de teatro, proposta em 1999, durante o governo FHC, que homenageava o escritor, jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues. O ator afirma que desde que começaram as acusações tentava, sem sucesso, a obtenção deste ofício junto ao Ministério da Cultura e à Secretaria Especial de Cultura (durante os hiatos, tanto no governo Temer como no último período, em que o MinC esteve extinto).
“Eu não tinha nem acesso a isso. E o Mário Frias [ex-secretario especial da Cultura de Bolsonaro] todo dia postava que eu era um ladrão da Lei Rouanet. E isso escalou para níveis que começaram a afetar meu cotidiano. Tive uma briga em um restaurante, quando cuspi em uma pessoa que me chamou de ladrão. É foda você ficar levando porrada sem nunca ter roubado porra nenhuma. Eu trabalho desde os quatorze anos. Não paro de fazer novela. Assinei outro contato com a Globo hoje. Só produzo teatro uma vez a cada vinte anos”, afirmou.
Com o documento em mãos que comprova a sua não existência como proponente de projetos recentes vinculados à Lei Rouanet, Zé de Abreu agora estuda processar as autoridades – sobretudo ex-ministros e ex-secretários da Cultura –, os meios de comunicação e as figuras públicas que deram voz às acusações. “A acusação saiu de dentro do MinC. Daí o Malafaia publicou isso, depois o Alexandre Frota também publicou e foi se tornando uma bola de neve. Ninguém nunca desmentiu nada”, concluiu o ator de 76 anos que afirma ter prints de dezenas de acusações infundadas contra si.