CUTLURA

Ziraldo, 91 anos: o gênio por trás do clássico “O Menino Maluquinho”

Preso na ditadura militar, cartunista já ganhou o Nobel da Literatura Infanto-Juvenil; veja trajetória

Ziraldo Alves Pinto é considerado mestre da literatura infanto-juvenil brasileira.Créditos: Marcelo Correa/ Divulgação
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Em 24 de outubro de 1932, na cidade de Caratinga, no interior de Minas Gerais, nascia Ziraldo Alves Pinto. Entre sete irmãos, ele era o mais velho. O menino que vivia desenhando nas paredes de casa, nas calçadas e salas de aula, logo tornou-se cartunista, escritor, pintor, teatrólogo e jornalista. Além disso, tornou-se um dos maiores nomes da literatura infantil brasileira.

São várias as criações de Ziraldo que não só povoam o imaginário infantil por gerações, mas como têm um reconhecimento acadêmico de qualidade e grandeza. De acordo com especialistas, o escritor já é um clássico e sua criação pertence ao primeiro escalão do cânone cultural brasileiro.

“O Menino Maluquinho” talvez seja o personagem mais inesquecível. A criança repleta de energia e imaginação que vive com uma panela na cabeça e pensa fora da caixinha ganhou adaptação em diversos formatos com o passar dos anos: TV, streaming, teatro, vídeo game, ainda com uma série mais recente na Netflix, em 2022.

Em seu aniversário no ano passado, seu colega da literatura infanto-juvenil, o quadrinista Maurício de Souza destacou o legado do amigo. "Falar do Ziraldo é chover no molhado", já que "todo mundo tem um grande carinho por ele e seus personagens". Segundo ele, "Ziraldo sempre diz que o mais importante é ler. Mas para que isso aconteça, cada vez mais, é preciso ter autores como ele para arrebatar milhões de crianças leitoras".

Maurício de Souza e Ziraldo. Créditos: Jo Ribes/Divulgação

A carreira de Ziraldo começa quando ele ingressa na literatura na década de 60 com a revista em quadrinhos Turma do Pererê. Em 1969, ele publica Flicts, seu primeiro livro infantil. Hoje, já lançou mais de 150 títulos para crianças.

Em uma entrevista concedida para a Revista Crescer, Ziraldo revelou que não tinha altas expectativas com a personagem. “Quando lancei O Menino Maluquinho, eu não tinha a menor ideia de que o livro teria tamanha repercussão, que um dia teria toda essa história que construiu”. Para ele, a identificação das crianças pode ter sido um fator primordial para que isso acontecesse. 

“Acredito que o Maluquinho teve tamanho alcance nesses anos todos por despertar identificação nos leitores. As crianças leem a história e se identificam com o personagem, sentindo algo como: “Opa, isso é comigo!”, “Eu sei o que ele está sentindo”, “É isso que eu sinto!”.

Trajetória de Ziraldo

Ziraldo iniciou sua carreira no jornalismo em 1954, contribuindo para a Folha da Manhã (hoje conhecida como Folha de S.Paulo) com uma coluna focada no humor. Sua fama se espalhou por todo o país quando ele se juntou à equipe da revista O Cruzeiro em 1957 e, mais tarde, ao Jornal do Brasil em 1963. Seus personagens cativantes, incluindo Jeremias, o Bom; a Supermãe e o Mirinho, rapidamente conquistaram o coração dos leitores.

Em 1960, Ziraldo lançou a Turma do Pererê, considerada a primeira revista em quadrinhos brasileira criada por um único autor e também a primeira a ser totalmente produzida em cores no Brasil. Apesar de ter alcançado uma das maiores circulações da época, a Turma do Pererê foi cancelada em 1964, logo após o início do regime militar no Brasil. 

Ainda em 1960, Ziraldo foi agraciado com o prestigioso “Nobel” Internacional de Humor no 32º Salão Internacional de Caricaturas de Bruxelas, além do prêmio Merghantealler, a mais importante honraria da imprensa livre da América Latina. Em 2004, ele ganhou o Prêmio Internacional Hans Cristian Andersen, considerado pequeno Nobel da Literatura.

Na década de 70, a Editora Abril tentou relançar a revista, mas não conseguiu repetir o sucesso inicial. A Turma do Pererê voltou às bancas em outras ocasiões, com uma edição encadernada pela Editora Primor em 1986 e em formato de almanaque pela Editora Abril na década de 1990.

Ziraldo também foi um dos fundadores e posteriormente diretor do jornal O Pasquim, um tabloide que se opunha ao regime militar. Sua posição contra o regime é considerada uma das prováveis razões para sua prisão, que ocorreu um dia após a promulgação do Ato Institucional Número Cinco (AI-5).

O cartunista lançou em 1980 o livro “O Menino Maluquinho”, que se tornou seu maior triunfo editorial e foi posteriormente adaptado para a televisão e o cinema. Na TV, a obra foi adaptada em 2006 pela TV Brasil, sob o título “Um Menino muito Maluquinho”. A série durou uma temporada, com 26 episódios. 

Cena da série "O Menino Maluquinho animado". Créditos: Divulgação

No cinema, a obra foi adaptada três vezes. A primeira adaptação foi “Menino Maluquinho - O Filme”, lançado em 1995, seguido por uma sequência em 1998 dirigida por Fernando Meirelles, intitulada “Menino Maluquinho 2 - A Aventura”. A adaptação mais recente é “Uma Professora Muito Maluquinha”, de 2010.

Em uma entrevista à BBC News Brasil, a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Leonor Werneck dos Santos considerou as obras de Ziraldo " grande impulso à literatura infantil no Brasil, que trouxe a literatura infantil para um lugar de destaque”. Segundo ela, “ele fala com a criança sem didatismo, sem ser moralizante, mesmo abordando temas mais 'cabeludos'. Ele consegue desenvolver qualquer temática com leveza, sensibilidade e criatividade. Por exemplo, vejo que o Menino Maluquinho, o personagem mais emblemático e mais conhecido, é uma alegoria da infância, a criança sapeca e 'maluquinha', que não era nada mais que uma criança feliz".