Fazendo quimioterapia e radioterapia para tratar um câncer no pulmão e prestes a lançar um novo trabalho - a música "Change", que chega às plataformas digitais nesta segunda-feira (27) -, Rita Lee segue sendo uma figura ímpar na história da música brasileira e mostra que continua ligada no cenário político e social do país.
Aos 73 anos, a cantora que gravou a música Mágica em 1969, disse em rara entrevista a Guilherme Samora, no jornal O Globo deste domingo (26), que se pudesse usaria da magia para transformar o Brasil da Jair Bolsonaro (Sem partido).
“Se pudesse fazer um ‘plim’, com uma varinha de condão, seria para ajudar o Brasil, ajudar os nossos bichos, ajudar a natureza… mandaria muita gente poderosa para a Idade Média. É assustador ver gente no comando com mente tão ultrapassada. Era para a gente estar nos Jetsons e estamos voltando para os Flintstones", disse ela, citando um "carma estranho" que parece rondar o país.
"O Brasil parece ter um carma estranho… acho que isso começou com o genocídio indígena. Ontem, estava vendo na TV uma velha indígena, do (povo) Krenakore. Ela falava: ‘Nós tínhamos um rio. Eu tinha todo tipo de cura na natureza’. E tiraram o rio dela! É desrespeito atrás de desrespeito com indígenas, com bichos — que são tratados como coisas. Se a gente não parte disso, como é que vamos mudar alguma coisa para melhor?”, indaga.
Na vanguarda do movimentos, Rita Lee critica a falta de respeito que persiste no mundo.
“Me enche o saco quando ouço pessoas preconceituosas reproduzindo papos de que ‘a mulher é inferior ao homem’, ou dizendo que ser gay é errado… O que é errado? O diferente de você é errado? Eu quero é o diferente. Quero viver num mundo colorido, com todo tipo de etnia, pele, cabelo, gente, bicho, planta e de ETs — mesmo que disfarçados — andando por aí. Eu sou do arco-íris, gosto da luz. Me enche o saco o racismo, a misoginia, a homofobia. Não tenho paciência para isso! Eu ‘tô’ velha! Eu queria chegar em 2021 e perceber mais respeito no mundo. E não ter que continuar falando sobre isso. Mas só se muda com educação. Respeito, educação e liberdade. As pessoas têm de ser livres para serem felizes como elas são".
Sobre o câncer, ela encara como consequência do tabagismo, por ter fumado desde os 22 anos.
"Sabia que iria acontecer algo. Quantas vezes não disse que teria de pagar algum pedágio da vida? Era um sopro atrás do outro: ‘Pare de fumar. Você fuma desde os 22 anos, pare agora’. Era como uma luz que acendia no fundo da mente. Fora as coisas que me eram esfregadas na cara. Ia ler jornal, e estava lá uma personalidade dizendo que havia parado de fumar. Estava na estrada, parava atrás de um caminhão e estava escrito: ‘Pare de fumar’. Com a pandemia, aquele baixo-astral no mundo, não tem como não ser afetado: passei a fumar o triplo de antes. Tenho essa coisa de católico, de culpa, e continuei a me desrespeitar. E quando o médico falou: ‘Você está com câncer no pulmão’, fechei os olhos e pensei: ‘Danadinhos, sarcásticos’. Os ‘seres de luz’ têm humor! Olha que humor muito louco. Era como se pudesse ouvi-los me falando: ‘Cara, a gente te avisou. Agora, vai parar de fumar na marra’. Eu, no fim, até agradeci. Não é fácil, mas consegui parar de fumar, finalmente".