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Marcos Sacramento, um dos maiores cantores do Brasil, acaba de lançar 'Drago', o 16º álbum da carreira. A diferença para a maioria dos seus outros está no fato deste trazer totalmente canções de sua autoria com parceiros como Paulo Baiano, que acompanha o cantor há 40 anos, Zé Paulo Becker, Marcelo Caldi, Nina Wirtti, Luis Barcelos, Rafael Mallmith, Glauber Seixas e Itamar Assiere.
Sacramento é um cantor consagrado que, vez por outra, grava discos autorais e sempre acerta na mosca. Da sua discografia, "Drago" é o quarto só com composições próprias, junto com "Caracane", de 1998; "Fossa Nova", de 2007 e "Autorretrato", de 2014.
O álbum, realizado por meio de financiamento coletivo, foi gravado em dezembro de 2018 e conta com a participação de alguns dos maiores músicos brasileiros da nova geração, como Luís Flávio Alcofra, violão; Pedro Aune, contrabaixo; e Netinho Albuquerque, percussão.
[caption id="attachment_172869" align="alignleft" width="230"] Foto: Divulgação[/caption]
Sacramento, que é natural de Niterói, é um dos grandes expoentes da nova geração do samba surgida no bairro da Lapa, no Rio de Janeiro. Poucos cantam com a sua malemolência, verve, malandragem, suingue e afinação. É um craque testado e aprovado em seus diversos discos e shows. Conta com vários discos gravados, alguns solos e outros em parceria.
A quem conhece o cantor de longa data, mestre em interpretar sambas e canções brasileiras de várias épocas, a modernidade de ‘Drago’ talvez traga alguma espécie de estranhamento. Basta um mínimo de atenção para perceber, no entanto, que por mais contemporâneo que o álbum pareça a princípio, Sacramento mantém seu pé na tradição, tanto na maneira de cantar quanto na forma como elabora as suas canções.
O resultado é um disco repleto de belas imagens, sabor de coisa antiga, mas repleto de elementos novos. Logo de saída, ‘Baticum’ deixa clara a qualidade instrumental, a riqueza rítmica e harmônica do que vem pela frente. Já a canção título encanta com a bela e lânguida melodia e letra sensual.
Outra linda melodia, repleta de ressaca pós-carnaval, malandragem, drama e um certo humor, é “Bolero de Cinzas”, com o personagem acordando com o coração incinerado na quarta-feira de cinza.
Totalmente apoiado em magistrais interpretações e alto refinamento musical, as composições também são muito bem realizadas, daquelas que músicos adoram tocar, cheias de alterações de ritmo, construções melódicas inesperadas e virtuose instrumental. O samba ‘Mãe’ - composto em homenagem à sua mãe, Nilza, que tem 92 anos - ou a canção ‘Temporal’ são ótimos exemplos desta excelência na execução.
‘Mentiralada’, dele e do letrista Mauro Aguiar, é uma das grandes composições do álbum. Samba lento, a canções traz uma irônica letra que abre com o verso: “Ah, quem me dera esbarrar todo dia com a mentira”. ‘Bolero Impossível’ é outra canção de amor dramática, inquieta que também mistura elementos tradicionais a harmonias modernas.
Outra que traz bom humor e modernidade, em um desencadeamento incomum de acordes, é ‘La Louca’. “Um samba sem amor não tem lugar na minha voz, e se o silêncio for melhor fico calado”, exclama o autor no surpreendente e descritivo 'Samba sem Amor', onde a interpretação nos carrega em equilíbrio exato entre técnica e emoção.
Mais um pouco e outro bolero apaixonado nos leva disco afora. ‘Teus Olhos (Bolero de Cetim)’ é outra das composições aparentemente simples que traz surpresas. ‘Daqui’ é das mais inusitadas, estranhas e belas composições do álbum. Feita em parceria com Paulo Baiano, autor também da canção título, ela antevê o final, indo direto do mar do Rio para a linda e triste ‘Paris’, em comovente dueto com o pianista Marcelo Caldi: “a praça era do povo, a praça era Paris, o céu era da Glória, faltava eu ser feliz”.