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A expressão é repetida à exaustão, inclusive por alguns artistas, quando perguntados qual o estilo que executam: “MPB de qualidade”, respondem sem medir a arrogância exagerada da frase. Há, de fato, um certo estilo de música brasileira que vem se expandindo e se reconhece nisto, à medida em que proliferam escolas e cursos.
Trata-se de uma canção popular onde tudo está correto, no seu devido lugar. Os músicos tocam excessivamente bem, repetindo frases e clichês em semicolcheias saltitantes, cantores quase canoros com vozes bem empostadas.
No centro de tudo, as canções, bem estruturadas, com letras certinhas e melodias sinuosas cobertas de todos os acordes e inversões que foi possível colocar.
No final das contas, algo difícil de explicar falta, apesar dos suspiros de fãs e amigos: a alma. Anos de estudo e aplicação não bastam para se tornar em um grande compositor popular. Parece óbvio, mas diante do quadro repetitivo de artistas que se encaixam no perfil, não é.
O diabo da “MPB de qualidade” está em toda parte. Compositores certinhos, nascidos com síndrome de Edu Lobo e Dori Caymmi, mas que não chegam e nem nunca chegarão à sola do sapato de seus mestres, estão por toda parte.
Edu, por exemplo, considerado um dos grandes gênios da nossa canção, faz coisas cerebrais, muitas delas de digestão difícil, mas repletas de genialidade. Muitos dizem que ele perdeu a espontaneidade depois que estudou nos EUA, durante a década de 70. Dizem que o Edu de “Arrastão” é melhor que o de “Beatriz”. Tudo bem, cada um tem a sua opinião. No caso, acho os dois geniais e os anos de aplicação só fizeram bem ao compositor.
Falo, no entanto, de gente que não vai nem com estudo e nem sem. Anos de aplicação em música, muitas vezes, pode transformar alguém em um bom instrumentista, mas nunca num grande compositor.
Cartola, tenho a impressão, não seria Cartola se o tivessem enfiado em uma Berklee College of Music. Poderia até ter virado um Stravinsky, mas nunca seria o Cartola.
E aí é que está a chave de tudo. Canção popular, como o próprio nome pressupõe, se faz e se aprende nas ruas. Irresistível citar Noel: “Batuque é um privilégio, ninguém aprende samba no colégio”. A elitização do ensino, e consequentemente das escolas de música tem gerado um certo tipo de cantautor cada vez mais comum. Aquele que estudou muito, faz tudo certinho, mas não tem – como se diz por aí, garrafas pra vender.
Tudo estaria certo não fosse o fato desse tipo ocupar espaço, arrancar suspiros e soluços e, o que é pior, afirmar, em contraponto ao funk e outros gêneros produzidos nas favelas, que ele sim, faz a tal da “MPB de qualidade”.
Como antídoto contra ela, indico ouvir repetidas vezes qualquer disco da Anitta ou do Cartola, entre outros. Há neles algo de luminoso que escola nenhuma do mundo ensina. E, aos incautos que acham que podem comprar tudo, resta ouvirem admirados. Ou espernearem de inveja.