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Com uma seleção imprescindível e inusitada do gênero, a cantora lança um disco que prima pela excelência, sensibilidade e beleza.
Por Julinho Bittencourt
O novo disco de Mônica Salmaso é, assim como o imaginário do universo do título, aparentemente simples. “Caipira”, aos incautos, pode parecer coisinha à toa, canções de três acordes. Não é nem na origem nem na revivência construída pela cantora, uma das nossas maiores e, sobretudo, com mais acuidade.
Trata-se, sim, de um apanhado de canções maravilhosas, com arranjos enxutos, divinos e, é claro, cantados pela sua voz única, também tão linda e poderosa quanto todo o resto. Elogiar Mônica Salmaso é um pouco chover no molhado. Mas um chover um tanto necessário sobre as sementes que gera.
A história de “Caipira”, segundo conta a própria autora, é fruto de uma pesquisa que começou lá atrás, em 2003, quando preparou um espetáculo para o SESC com canções tradicionais brasileiras. Teve a ajuda luxuosa e imprescindível do violeiro e amigo de tantas jornadas Paulo Freire.
O resultado, conforme já dito acima, é divino, pra dizer o mínimo. “Caipira” é um daqueles discos que a gente ouve, ouve e ouve e cada vez que repete adora e adora.
O trabalho começa com a produção impecável de Teco Cardoso, os arranjos de Neymar Dias, na viola caipira e no baixo acústico e o pequeno e extremamente eficiente grupo de músicos: Nailor Proveta, no clarinete e sax tenor; e Toninho Ferragutti, no acordeon; Robertinho Silva, na percussão e André Mehmari, no piano.
Posto isto, o repertório é um apanhado de canções que, para quem não é familiarizado com o gênero pode parecer homogêneo, no entanto, conta com obras de diversas épocas, matizes, lugares e tendências, o que só embelezou ainda mais o disco.
Tem desde a longínqua e comovente “Leilão”, de Henkel Tavares e Joracy Camargo, de 1933, uma linda história de amor entre dois escravos que são separados na hora da venda da mulher; passa pelo clássico “Bom Dia”, de Gilberto Gil e Nana Caymmi, bela toada que levou uma vaia homérica num festival da canção, mas foi imortalizada por várias gravações seguintes; e chega até os dias atuais, com canções contemporâneas, como “Água da Minha Sede”, de Dudu Nobre e Roque Ferreira, já gravada por Zeca Pagodinho e reinventada por Mônica; até a inédita “Baile Perfumado”, também de Roque Ferreira.
“Caipira” traz várias outras surpresas e uma extrema excelência na sua realização, coisa que é habitual em tudo o que Mônica Salmaso grava, seja dela ou em participações de outros artistas.
Quando vai chegado no seu finalzinho, e a gente já pensa em começar tudo de novo, o disco traz um último presente encantador. A linda toada “Sonora Garoa”, do compositor Passoca é um clássico da canção caipira nascida, surpreendentemente, da chamada vanguarda paulistana. Nesta versão, para finalizar com chave de ouro, Mônica Salmaso e o pianista André Mehmari dão um banho de bom gosto, sensibilidade e beleza.
Um lindo final para um disco maravilhoso.