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O cantor se superou em sua misoginia, em seu profundo mau gosto, se superou no lixo que produz
Por Julinho Bittencourt
O inacreditável Luan Santana lançou, na última sexta-feira (8), em parceria com Douglas César, a canção “Check-In”. Nela, o jovem cantor, baseado numa das mais famosas epígrafes do Genesis, da Bíblia, comete o seguinte verso: “Deus fez a mulher de uma costela de Adão, Mas quando foi fazer você fez do Filé Mignon”.
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Pausa. O leitor merece. Posto isto, há duas vertentes pouco afeitas aos estudos bíblicos que se digladiaram aí. A primeira delas empanturrou o tráfego para o clipe do cantor que, em poucos dias, estava quase chegando a 12 milhões de visualizações. A outra, se divertiu a cântaros com a extrema imbecilidade do verso e, sobretudo, o seu estranho e macabro machismo.
E a internet tem razão. Mil anos de interpretações da encantadora passagem bíblica, onde a mulher é criação a partir da criação, para ser, portanto, mais perfeita e bela. Deus teria criado Adão do barro e a mulher a partir da sua costela: “Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne”.
Uma vez juntos, nus e desavergonhados, foram expostos ao desejo através da metáfora da serpente, que lhes serviu a maçã e tudo o mais é história: “Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que não morrais”. E é claro que o comeram. E, pecadores, não morreram.
Na adaptação estapafúrdia de Luan, a mulher vira, sim, um pedaço de carne nobre a ser devorado. A despeito disto, e da canção ser mais do mesmo, ou seja, uma insossa programação pop, onde o sertanejo abandona um tanto as suas aventuras de agroboy para se embrenhar na drum machine, vale ressaltar a infeliz rima Adão/Mignon. Fora isso, o verso anterior, que batiza a canção, também é digno de nota: Eu dou Check-out desse mundo/E Check-In no seu colchão.
O clipe de “Check-In” também chama a atenção. Nele, logo após ter o seu cabelo raspado no mais alto e melhor “style”, se vê preso a uma câmara, com camisa de força, onde recebe a visita de uma linda enfermeira. Dalí em diante, supõe o espectador, teria que ser devorado o filé mignon, mesmo que o devorador esteja encarcerado e dominado.
De resto, ao fim e ao cabo, o que sobra da audição e de uma pequena e breve reflexão é que o artista em questão se superou.
Se superou em sua misoginia, em seu profundo mau gosto, se superou no lixo que produz.
E que, por alguma razão tão misteriosa quanto os desígnios de Deus, continua conduzindo milhões de fiéis no encalço de suas bobagens tamanha