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Tom Jobim, o maior compositor popular brasileiro de todos os tempos, faria hoje 90 anos. Pouco ou quase nada resta do país que Tom sonhou e cantou, mas a sua obra, algumas dezenas de canções maravilhosas e inesquecíveis, continuam imprescindíveis para a compreensão do Brasil contemporâneo.
De Julinho Bittencourt
Tom Jobim, o maior compositor popular brasileiro de todos os tempos, faria hoje 90 anos. Pouco ou quase nada resta do país que Tom sonhou e cantou, mas a sua obra, algumas dezenas de canções maravilhosas e inesquecíveis, continuam imprescindíveis para a compreensão do Brasil contemporâneo.
Tom foi o primeiro grande produto musical brasileiro a ganhar o mundo sem fantasias exóticas. Tudo na sua obra é, desde sempre, sóbrio, moderno, rico e repleto de informações. Ao lado de outras manifestações que colocam o país num outro patamar como a arquitetura de Niemeyer, o Cinema Novo, Guimaraes Rosa e Villa-Lobos, ele inventou o Brasil que dá certo, desde que bem alimentado e educado.
Logo após a explosão da Bossa Nova, que começou em 59 com a gravação antológica do disco “Chega de Saudade”, de João Gilberto, que Tom considera como dele, o compositor foi aos EUA e, de lá, gravou alguns dos maiores álbuns do planeta. Estava, de fato, com o mundo do show business aos seus pés, o que lhe permitiu desfrutar do bom e do melhor, ou seja, o melhor som, os melhores músicos (desde que o baterista fosse brasileiro), a melhor distribuição e, no final das contas, o melhor público.
Como compositor, é bem verdade, Jobim foi interpretado por gente dos quatro cantos do planeta. “Garota de Ipanema”, dele e de Vinícius de Moraes, por exemplo, é a canção brasileira mais regravada de todos os tempos. No entanto, o que o autor nos deixou mesmo de maior foram estes álbuns autorais gravados nos EUA, onde as suas canções, muitas vezes banalizadas e diluídas, receberam o máximo respeito que sempre mereceram.
Um grande exemplo disso é a versão que fez ao lado de Elis Regina para “Águas de Março”. A canção, um dos clássicos de Tom, é tratada com certo humor, risinhos e brincadeiras no álbum “Elis & Tom” (pelos dois, justiça seja feita) que não existem na versão que o autor faz no seu álbum “Matita Perê”, de 1972. Nesta, com orquestrações de Claus Ogerman, o que pulsa de fato para acima dos intérpretes é a obra, a letra, a lama e a chuva, o drama e a distensão, enfim, a grandeza da canção.
Claus Ogerman, diga-se de passagem, estava lá com Tom na maior parte destes discos americanos. Fez com ele, além de “Matita Perê”, o disco solo de estréia de Tom “The Composer of Desafinado Plays”, o lindo “Urubu”, de 1976, e também “Wave” (1967), um dos grandes sucessos da carreira de Tom. Suas orquestrações são completamente diferentes de tudo o que se produzia em canção popular na época. Os dois, apaixonados por música erudita, ficaram amigos e compartilharam a paixão pelas texturas orquestrais de maior fôlego nestas gravações.
Outros discos do período americano merecem menção, sobretudo “Francis Albert Sinatra & Antônio Carlos Jobim” (1967), também com arranjos de Ogerman. Este foi o segundo disco mais vendido na América naquele ano, perdendo apenas para o “Sgt Peppers Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles, o que rendeu uma das inesquecíveis piadas de Tom: “É, mas eles são quatro e eu um só”.
Vale ainda lembrar “The Wonderful World of Antônio Carlos Jobim” (1965), com arranjos de Nelson Riddle, um orquestrador mais afeito ao som das big bands do que as orquestras de música erudita.
Não há, no entanto, um disco, ou, sem medo de exagerar, uma nota de Tom que não mereça ser ouvida, repetida e aprendida para o todo e sempre. Haverá sempre algo a ser acrescentado e lembrado nesta rica e profusa obra maior. Por todas as efemérides que se seguirem daqui pra frente, Tom Jobim sempre estará nos ensinando algo.