O médico oftalmologista e deputado estadual, Albert Dickson (Pros-RN), promove o tratamento precoce contra a Covid-19 através de seu canal do YouTube em troca de ‘likes’. O médico ainda distribui receitas online sem falar com os pacientes. Para tal, é preciso apenas se inscrever no canal e, depois disso, enviar um print pelo seu WhatsApp.
"Como que vocês vão ter direito à consulta? Vocês vão se inscrever no nosso canal, ganhando uma etapa no atendimento. Vocês vão printar e mandar para o meu WhatsApp. Quando você mandar, você já vai começar a ter o acesso à consulta comigo", disse em um vídeo publicado no Facebook no dia 7 de março. “O segredo é mandar o print”, afirma o médico.
Dickson também disse ser "defensor do tratamento precoce desde o início da pandemia" e disse que continuará nesta defesa, afirmando haver "várias pesquisas já preconizadas e publicadas".
Com o método, Dickson multiplicou o número de inscritos em seu canal do YouTube. Quando o canal atingiu 100 mil inscritos, recebeu uma placa comemorativa da empresa. Agora, Dickson tem 201 mil seguidores na rede.
O YouTube informou que, de acordo com uma nova regra da plataforma, removeu 12 vídeos do canal por conteúdo que disseminava informações médicas incorretas, como afirmar que há uma cura garantida para a covid-19 ou recomendar o uso de ivermectina ou hidroxicloroquina. O canal segue no ar, entretanto, porque os vídeos removidos haviam sido publicados em um período anterior a essa nova regra, de 12 de abril.
As recomendações de Dickson também são vistas por seus 139 mil seguidores em dois perfis no Instagram. No Facebook, quase 50 mil pessoas o seguem, e há vídeos com mais de 200 mil visualizações.
Dickson diz em seu canal que "atende 500 pessoas por dia, de domingo a domingo, de 7h da manhã até 3h da manhã, todos os dias".
Já em uma reunião da Comissão Externa de Enfrentamento à Covid-19 na Câmara Federal em julho do ano passado em que participou como convidado, Dickson afirmou já ter atendido "31 mil pacientes do mundo inteiro" e ter acompanhado, por e-mail, 6.047 pacientes. Destes, segundo ele, dois morreram.
Questionado pela BBC News Brasil sobre o número de atendimentos, o deputado afirmou: "Me reservo ao direito de não informar por uma questão de foro interno."
Pacientes com quem a reportagem da BBC News Brasil conversou disseram que depois de informar dados pessoais e sintomas, recebem diretamente um receituário médico. Ou seja, não tiveram uma consulta médica propriamente dita.
A BBC News Brasil teve acesso a três receituários que teriam sido enviados por Dickson, e que, aparentemente, diferem um do outro apenas pelo nome do paciente e pela data.
Para uma suposta "profilaxia" da Covid-19, a receita inclui sete medicamentos, incluindo a ivermectina.
A BBC News Brasil perguntou a Dickson se o deputado considera como atendimento médico o envio de um receituário sem antes fazer uma consulta. Ele respondeu que "antes de enviar a receita com o nome e data direcionado ao paciente, o paciente nos passa os sintomas solicitados e após isso enviamos a receita".
Dickson, que ganhou as manchetes no ano passado com a proposta de criar o "Dia Estadual da Visibilidade Heterossexual", aparece sempre nos vídeos ao lado de sua esposa, a deputada federal Carla Dickson (Pros-RN), que assumiu a vaga após a ida de Fábio Faria para o ministério das Comunicações e agora compõe a bancada evangélica da casa.
Em maio do ano passado, Albert Dickson apresentou dois projetos de lei sobre o chamado "tratamento precoce" na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. Um deles determina a "disponibilização gratuita de kits de medicamentos com os remédios hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina" pelo SUS no Rio Grande do Norte.
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