Com 927 mortes por Covid-19 entre indígenas, governo Bolsonaro limita vacinação prioritária a “aldeados”

Conselho Indigenista Missionário repudia medida, que classifica como “contrassenso político e humanitário”; país tem quase 900 mil indígenas e aldeados representam 410.348

Vanda Ortega, primeira vacinada no estado do Amazonas (Foto: Mário Adolfo Filho)
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Desde o início da pandemia do novo coronavírus, 46.190 indígenas no Brasil já foram contaminados de 161 povos, com 927 mortos. Os dados foram compilados pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). Com esse cenário, o Ministério da Saúde do governo Jair Bolsonaro (sem partido), liderado pelo general da ativa Eduardo Pazuello, restringiu a aplicação das vacinas contra a Covid-19 na primeira fase da campanha a povos indígenas aledados.

O censo populacional de 2010 indica que o país tem quase 900 mil indígenas. Os considerados “aldeados” são 410.348. Ou seja, mais de 480 mil pessoas que deveriam ter prioridade foram excluídas com a determinação. Essa população é mais vulnerável do ponto de vista sanitário e, por isso, sempre é tratada como público prioritário em qualquer campanha de vacinação.

A medida causou revolta entre as organizações que lutam pelos direitos e proteção dessa população.

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) lançou, nesta terça-feira (19), uma nota repudiando a determinação do Plano Nacional de Vacinação. Na visão da entidade, ao reduzir a vacinação prioritária apenas ao que definiu arbitrariamente como “indígenas aldeados”, o governo federal exclui grande parte da população indígena do acesso à saúde pública.

O coordenador do Cimi, Roberto Liebgott, disse que “o governo de Bolsonaro, desde a sua posse, visa excluir das suas obrigações estatais os povos e comunidades que lutam pela demarcação de terras”.

Além disso, afirma Liegbott, o governo federal “não reconhece a existência daqueles que vivem fora de seus territórios originários por razões diversas, mas especialmente pela omissão e negligência do estado em assegurar políticas públicas dignas ou porque foram expulsos das terras pelo processo violento da colonização”.


Dessa forma, continua o coordenador do Cimi, o governo exclui de suas responsabilidades mais da metade da população indígena.

“Essa lógica de governança sinaliza que a perspectiva é a da inviabilização dos indígenas e a consolidação de uma perspectiva integracionista, ou seja, que os povos devem estar inseridos na sociedade envolvente e com isso, retiram-se deles os direitos as diferenças étnicas, culturais e territoriais”, afirmou.

Em todo o país, já houve indígenas vacinados, inclusive fora do grupo de aldeados. Mas, nesse caso, eram profissionais da saúde.

Uma delas foi a técnica de enfermagem Vanda Ortega, primeira vacinada no estado do Amazonas. Ao tomar a dose, ela afirmou: “Este momento representa muito para os 63 povos indígenas do estado do Amazonas. Este estado, que tem a maior população indígena do Brasil, precisa ser cuidado”.

Nota do Cimi

Na nota pública em que repudiou a medida, o Cimi lembrou que Pazuello referiu-se apenas a “indígenas aldeados” entre os grupos prioritários para a vacinação, quando anunciou o início do plano de imunização contra a Covid-19. “O termo usado pelo ministro, ‘indígenas aldeados’, nos remete ao período da ditadura militar e representa uma discriminação, onde o governo pretende definir, de forma arbitrária, quem é e quem não é índio, estabelecendo assim um conflito com a Constituição Federal, com os marcos legais nacionais e internacionais e com o movimento indígena”, escreveu a entidade.

No documento, o Cimi ainda disse que, “nessa situação grave de pandemia sanitária, excluir grupos indígenas do acesso à política de saúde pública é um contrassenso político e humanitário”. A entidade ainda salientou que vários grupos indígenas que estão nos centros urbanos foram expulsos de seus territórios por invasores. “Portanto, um ato de violência, que não justifica sua exclusão. O fato de o indígena estar fora da aldeia não faz com que ele deixe de ser indígena”, disse a entidade.

Leia a nota na íntegra aqui.