Alguns estados do Brasil estão na iminência de reabrir as escolas, como parte do plano de “retorno à normalidade” pós-pandemia, mas deveriam conhecer os exemplos mundiais que essa medida pode ter, e suas consequências. Curiosamente, o caso mais eloquente a esse respeito é o de um dos países mais amados pelos bolsonaristas.
Uma reportagem recente do diário The New York Times relata o que aconteceu em Israel, que reabriu suas escolas em meados de maio, incentivado por uma queda na média diária de novos contágios de coronavírus no país – o que já marca uma diferença com o Brasil, onde essa reabertura está sendo programada agora, em um momento em que os índices ainda se mantêm nos níveis mais altos tanto em número de contágios quanto de óbitos diários por covid-19.
A reabertura israelense foi “um grande fracasso”, e esta constatação não é tão subjetiva quanto parece, já que foi admitida pelas próprias autoridades do país, e reforçada pelos números apontados na reportagem do diário estadunidense, que mostram como várias escolas registraram surtos de covid-19 entre estudantes, familiares de estudantes, professores e servidores, semanas após a reabertura, o que ajudou a adiantar uma segunda onda do vírus no país, em pleno verão do hemisfério norte – quando se supunha que o calor poderia conter a propagação do vírus.
Dois meses depois de efetivada a medida, o país já tem 240 estabelecimentos fechados, e 22 mil pessoas em quarentena, entre professores, estudantes e servidores das escolas.
Tal situação levou a um contraste curioso, já que antes de tomar essa decisão, Israel era considerado um dos países que estava lidando bem com a pandemia: sem ser um exemplo de sucesso como Nova Zelândia, Vietnã ou Cuba, mas bem longe de ser um desastre como os de Estados Unidos, Brasil, Itália e outros.
Prova disso foi o depoimento de Danniel Leibovitch, diretor do colégio Gymnasia Ha´ivrit, de Jerusalém, um dos que enfrentou surto de coronavírus após a reabertura. Ele disse à reportagem do The New York Times “havia uma euforia geral na sociedade, o sentimento de que tínhamos superado o vírus de forma definitiva, algo que, como vimos depois, não era verdade”.
Quando anunciou a reabertura das escolas, o Ministério da Educação de Israel emitiu instruções sobre as medidas de segurança, incluindo o uso de uma máscara para estudantes da quarta série em diante, manutenção das janelas sempre abertas, lavagem frequente das mãos e distanciamento mínimo entre os estudantes.
No entanto, em muitas escolas esse distanciamento era impossível de ser aplicado, e s autoridades locais preferiram fazer vistas grossas a essa situação. Além disso, durante uma recente onda de calor no país, algumas escolas também decidiram ignorar a obrigatoriedade do uso de máscaras e permitir que se fechassem as janelas para usar o ar-condicionado.
Após conhecer os casos de surtos em diferentes colégios do país, especialmente nas cidades de Haifa, Tel-Aviv e Jerusalém, o Ministério da Educação decidiu que qualquer escola com pelo menos um caso de covid-19 deverá retornar ao sistema anterior, com aulas remotas e estudantes em casa.
A reabertura também foi o principal fator que desencadeou a segunda onda da pandemia no país, que inclusive foi muito mais forte que a primeira: a média diária de novos infectados em maio foi de 130, em junho foi de 800, e em julho saltou a cerca de 2 mil.
O professor Eli Waxman, do Instituto de Ciências de Tel-Aviv e chefe do Conselho de Segurança Nacional de Israel, foi a autoridade encarregada de admitir que a decisão de reabrir as escolas “foi um grande fracasso”.
“Definitivamente, foi um erro, que cometemos em função do baixo número de contágios naquele então, que nos levou à ilusão de que a doença estava controlada. Recomendamos aos demais países que não façam o que nós fizemos”, afirmou o acadêmico israelense.