Mandato cidadanista III – Propostas para uma reforma política a serviço do povo brasileiro

Célio Turino finaliza sua série de artigos e diz que tanto os “políticos”, quanto a mídia e o Sistema dominante, quando falam de reforma política, a reduzem a uma simples reforma eleitoral

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[caption id="attachment_134552" align="alignnone" width="1024"] Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado[/caption] Identificados os problemas e apontado o padrão ético para a sua superação, cabe, de maneira clara e precisa, organizar as propostas de superação. Não se trata apenas da superação de indivíduos ou grupos que exercem o poder político, mas da superação de um bem engendrado Sistema de controle social, político, econômico e cultural. Nisso as classes dominantes no Brasil são realmente competentes, exercendo o mando desde os tempos das Capitanias Hereditárias. Salvo algumas famílias que exercem o poder diretamente, a maioria dos políticos, inclusive, não passam de reles empregados das grandes empresas e castas a ‘cupinzarem’ o Brasil. Tanto os “políticos”, quanto a mídia e o Sistema dominante, quando falam de reforma política, a reduzem a uma simples reforma eleitoral (e sempre com regras que os beneficiem, registre-se), ora tratando da forma de representação (se voto aberto, como é hoje, se distrital majoritário ou distrital misto, ou lista fechada, em que a ordem dos parlamentares é estabelecida pelos partidos), ora, nem isso. No fundo tudo não passa de ‘distrações’ a manter tudo como dantes. Para uma reforma política profunda e estrutural há que adotar as seguintes medidas:
  • Redução na quantidade de parlamentares, para 380 Deputados e 54 Senadores.
O Congresso brasileiro é, ao mesmo tempo, ineficiente, caro, não representativo e não responsivo (capacidade de responder às demandas e necessidades da sociedade). É um Congresso numeroso, mas que, ao mesmo tempo, não representa a sociedade, ou melhor, representa apenas aos seus patrões, às castas econômicas e políticas, essas sim, super-representadas por um Congresso que vive de costas para o Brasil. Neste momento, melhorar a qualidade da representação política pressupõe diminuir a quantidade da representação, permitindo um maior controle social sobre a atividade parlamentar e eficiência no trabalho. Para Deputados. Seriam distribuídos na seguinte proporção: para o primeiro milhão de eleitores: 4 deputados (mesmo quando a unidade da federação tiver menos que um milhão de eleitores); depois, para cada 500 mil eleitores, acrescenta-se uma nova vaga. Em 2018 são aproximadamente 147 milhões de eleitores no país, distribuídos em 27 unidades da federação (para o primeiro milhão de eleitores, ou menos, nas 27 unidades da federação x 4 vagas = 108 deputados; para os seguintes 120 milhões, a cada 500.000 x 2 = 240; mais um máximo de 27 para números quebrados), o que totalizaria um máximo de 375. Deputados escolhidos pelos povos indígenas. O Brasil tem uma população originária de aproximadamente um milhão de pessoas, distribuídas por todas as unidades da federação. Com isso essa população não consegue alcançar um coeficiente mínimo de representação em nenhum estado (o último deputado assumidamente indígena, foi o cacique Juruna, eleito em 1982, pelo estado do Rio de Janeiro, mais com um voto de adesão e proposto político que propriamente de representação indígena, até porque ele era Xavante, natural do estado do Mato Grosso). Não se trata de um privilégio, mas de alteração na forma de votação para escolha de deputados indígenas, que, para escolha de deputados, teriam um colégio eleitoral nacional (o que resultaria em 4 vagas, como nas unidades da federação com menos de um milhão de eleitores). Para Senadores. Redução de Vagas para Senador de 3 para 2 por unidade da federação. A terceira vaga de senador é resquício do “Pacote de Abril”, da Ditadura Militar, que instituiu o Senador Biônico. A adoção dessas medidas também tem o efeito de tornar a representação no Congresso mais proporcional, reduzindo a distorção hoje existente. Atualmente a diferença de peso do voto entre um eleitor paulista que vota em Roraima – 324 mil eleitores – e um roraimense que vota em São Paulo – 32.715.000 eleitores - é de 11 vezes (uma vaga a cada 40.000 eleitores em Roraima e uma vaga para cada 467 mil eleitores em SP). Não se trata de uma questão regional, que é uniformizada pela representação igualitária no Senado, mas de uma questão democrática, reduzindo desigualdades na representação política. Com a nova forma de proporção, a diferença seria reduzida para 5,7, ainda assim uma diferença, mas ao menos mais próxima do princípio “um cidadão, um voto!”. Os EUA, com uma população de 322 milhões de habitantes, têm 435 deputados e 100 senadores, para 50 estados, assim como a França está promovendo sua reforma política para redução em 1/3 no tamanho de seu Congresso; é inescapável que o Brasil, com toda sua crise na representação política, trate deste assunto na próxima legislatura e que ele seja encaminhado para consulta e deliberação popular, via Plebiscito.  
  • Redução em 50% no Custo da Atividade Parlamentar no Brasil. O custo médio por parlamentar no Brasil é de US$ 4.415 milhões/ano, o segundo maior do mundo, atrás apenas dos EUA; em países como Alemanha, França, Argentina ou México é de, respectivamente, US$ 1.191 milhão, 1.079 milhão, 1,917 milhão, 1,777 milhão. Junto ao Plebiscito para redução da quantidade de parlamentares, deve ser aberta consulta popular para a redução dos orçamentos para o Congresso, Assembleias legislativas e Câmaras de Vereadores. A meta deveria ser recolocar o custo parlamentar no Brasil em equivalência com o custo mundial, o que significa uma redução de 50% no custo total do Congresso Nacional, que deveria ser estabelecido em lei. Com isso o custo máximo ficaria em US$ 2 milhões/ano por parlamentar. No projeto de lei para a Consulta plebiscitária será apresentada a seguinte questão: Congelamento nominal no orçamento do Congresso, com redução de 10% ao ano até alcançar o custo médio mundial. Em 2022 esta medida resultaria em uma economia anual de R$ 7 bilhões. Para Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores se adotaria e mesma consulta, no mesmo processo plebiscitário, acrescentando o veto a que legislativos estaduais e municipais utilizem recursos de transferências de impostos para o financiamento de suas atividades, que devem ser custeados exclusivamente com a arrecadação de Impostos local. Isso resultaria em uma economia de aproximadamente R$ 5 bilhões em Assembleias legislativas e de 7,6 bilhões em Câmaras de Vereadores. Antes que alguém diga que esta redução de custos desvaloriza a democracia, ao contrário, ela a valoriza; primeiro, por tornar a representação mais próxima da realidade do povo, segundo, por estabelecer um padrão parlamentar com menos excesso e desperdício, e com isso mais eficiente, terceiro, por aproximar o custo parlamentar do Brasil ao custo dos demais países civilizados, e ainda assim a um valor superior a esta média, mas menos absurdo que atualmente.
  • Fim do Fundo Público Eleitoral (no valor de R$ 1,7 bilhão em 2018), com manutenção da proibição do impedimento de contribuições de pessoa jurídica, teto para despesas eleitorais e teto nominal para doações de pessoas físicas para campanhas eleitorais, incluindo candidatos. O Fundo Partidário já tem valores elevados para a atividade político-partidária (R$ 800 milhões em 2018) e o Fundo Eleitoral, criado em 2017, distorce por completo a vontade do eleitor em renovar o parlamento, isso porque os recursos são concentrados nos grandes partidos, exatamente os maiores responsáveis pela degradação da política no Brasil. Na situação atual os brasileiros são obrigados a financiar exatamente aqueles partidos que o povo mais rejeita; além de o Fundo eleitoral estimular o mercado de compra e venda de deputados, como se assiste a olhos vistos. Política ao alcance da cidadania é política de baixo custo, por isso participativa e colaborativa. Segue estudo que publiquei a respeito:(https://revistaforum.com.br/por-uma-reforma-politica-justa-democratica-e-cidada/ ).
  • Fortalecimento de Observatórios da Cidadania para acompanhamento cidadão sobre licitações, contratações e medições de serviços públicos. O povo manda e o governo obedece, esse tem que ser o princípio, mas isso jamais ocorrerá sem mecanismos de controle cidadão. A proposta é dar passos adiante nos processos de transparência, tornado obrigatório o repasse de dados para Observatórios Sociais, criando um Índice de Custos para contratação de Serviços Públicos (há dados mais que suficientes para se obter indicadores de custo em todos os serviços e compras públicas, a exemplo o Índice de Custos da Construção Civil, tornando mais fácil o acompanhamento e comparação de custos de contratos públicos).
  • Limite para reeleições sucessivas em mesmo cargo parlamentar. Política não é profissão, é inconcebível que tenhamos parlamentares com 30, 40 anos de mandatos sucessivos. Claro que há exceções, em que alguns (poucos) parlamentares com sucessivos mandatos o exercem com ética e compromisso público, mas a regra em mandatos longevos é o corrompimento e a acomodação. A proposta é estabelecer um limite para duas reeleições no mesmo cargo.
  • Revogatória para Mandatos. Este é um princípio básico da democracia: o povo é soberano é dele que emana o poder. Isso está inscrito em nossa Constituição, mas em nossa democracia sequestrada tal princípio não é aplicado. Há o mecanismo do impeachment (impedimento), mas que é seguro nas mãos de quem controla o parlamento, tornando-se fonte de crises e arbitrariedades. Vários países democráticos adotam o mecanismo da Revogatória, tanto para cargos executivos como parlamentares. A revogatória seria chamada quando o eleito descumpre com o programa submetido a eleição (que deveria ser registrado previamente), ou em caso de desvios no exercício do cargo. Caberia ao legislativo, ou a uma quantidade de assinaturas da população (ao menos a mesma quantidade de assinaturas que os votos do eleito, para evitar abusos) convocar Plebiscitos Revogatórios quando se cumprissem determinados requisitos. Tendo o Brasil adotado o presidencialismo (e não o parlamentarismo) como modo de governo, este é o mais eficiente procedimento para a resolução democrática de impasses políticos, evitando intermináveis crises (como a que o Brasil vive no presente) e com solução democrática.
  • Prévias Cidadãs e governança democrática em Partidos Políticos. Como escrito em artigo anterior, os partidos políticos são imprescindíveis para a democracia, porém, quando os partidos são sequestrados por castas, tornando-se meio para negócios e negociatas de pequenos grupos, eles se transformam em obstáculo para a democracia real. Há duas medidas legais que precisam ser incorporadas à Lei Orgânica dos Partidos: a) adoção de prévias para escolha de candidaturas ao executivo e ao legislativo; b) um partido político só poderá lançar candidatos nas esferas se tiver diretório eleito, não provisório (atualmente há vários partidos que só funcionam com diretórios provisórios, de modo que o presidente nacional ou estadual pode trocar direções partidárias por ato de ofício, sem qualquer consulta às bases). Essa são medidas comuns na maioria dos partidos democráticos e imprescindíveis para criar um freio à “Partidocracia”. Junto a isso, o fim do Fundo Eleitoral para financiamento de campanhas, pois o financiamento de campanhas também é uma forma de diálogo e compromisso com a cidadania, e deve acontecer de forma democrática e pulverizada, a partir daqueles que apoiam determinada ideia.
  • Lista Cidadã, com possibilidade de candidaturas independentes. Novamente, uma medida comum a toda democracia que se pretenda sólida. Pela legislação brasileira há um monopólio dos Partidos Políticos em relação ao exercício institucional da política, é isso que torna tão difíceis processos de mudança política no Brasil. Garantindo em lei a possibilidade de formação de Lista Cidadã, ou candidaturas independentes, estaríamos criando um saudável contrapeso aos partidos políticos que, ou se abririam à sociedade, transbordando suas estruturas, ou estariam condenados ao definhamento.  
  O principal objetivo com essas medidas é tornar a política ao alcance da cidadania, mas há também o efeito da redução no custo público na atividade política, que não pode ser negligenciado. Como demonstrei nessa série de artigos, o orçamento público brasileiro despende um valor considerável para a manutenção da vida política. Isso é necessário, pois democracia custa, e não ter democracia custa ainda mais caro para a sociedade, mas quando este custo atinge custos absurdos, ele também é uma ameaça grave à democracia. Democracia pressupõe uma vida política sem excessos, com profundidade na análise dos problemas, ética na condução de suas ações e coragem e consistência na apresentação de soluções, e isso não está vinculado a dinheiro e sim a compromisso cidadão; ao contrário, o dinheiro, quando muito, está associado à distorção do que deveria ser um compromisso cidadão. Apenas como resumo em relação aos custos (pois pretendo retoma-lo em artigo futuro). Em 2018 o Brasil comprometerá R$ 35,5 bilhão com a atividade política parlamentar e partidária (R$ 33 biem custo legislativo nas 3 esferas da federação, mais R$ 1,7 bi em Financiamento Público de Campanha, mais R$ 800 milhões em Fundo Partidário) -além do custo com a Justiça Eleitoral, que é de R$ 8 bi-. Com o conjunto de medidas aqui apresentadas, este custo total seria reduzido para entre R$ 16/18 bilhões, liberando valor equivalente para investimentos diretos em saúde, educação e cultura, segurança e o que mais o povo considere relevante para sua qualidade de vida. E apontar isso é sim função de um Mandato Cidadanista, que coloca o povo em primeiro lugar. No próximo artigo vou tratar sobre reforma do Estado e de como torna-lo mais eficiente para servir ao povo e jamais servir-se do povo.