Mandato cidadanista II – Uma gestão compartilhada e participativa

Em seu segundo artigo sobre o tema, Célio Turino afirma que um Mandato Cidadanista tem que atuar em sentido oposto à acomodação e ao modus operandi do Sistema Político

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[caption id="attachment_134420" align="alignnone" width="567"] Foto: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil[/caption] Colocar a atividade política a serviço do Bem Comum pressupõe um conjunto de propostas que precisam ser transformadas em leis. Não será fácil, isso porque a maioria delas, se não a totalidade, batem de frente com os interesses do status quo da Política, em alguns casos com potencial para implodir o mecanismo de perpetuação no Poder. Exatamente por isso tais propostas sofrem e sofrerão resistência do Sistema Político dominante.  A saída é a combinação entre ação parlamentar e educação e mobilização social. Há que ter um ‘pé dentro e um pé fora’ do parlamento, apresentando propostas que façam aflorar as contradições do Sistema, tendo nisso, um sentido pedagógico a alimentar processos de consciência, organização e ação cidadã. Um Mandato Cidadanista, portanto, tem que atuar em sentido oposto à acomodação e ao modus operandi do Sistema Político. Não agindo assim, um Mandato Cidadanista não faz sentido, reduzindo-se ao habitual conformismo parlamentar, ora denunciando desmandos, ora buscando pequenas reformas, sem, contudo, atingir o Sistema em seu cerne. Não é tarefa fácil, pois não basta vontade para mudar, há que ter capacidade, experiência e coragem. E um profundo compromisso ético com outros mundos, formas de vida e mediação social. O Modo Bom de Governar, do Zapatismo, praticado nas montanhas de Chiapas, no sul do México, aponta relevantes princípios para uma Gestão Compartilhada e Participativa em torno de um Mandato Cidadanista pautado nos princípios do Bem Viver:
  • Obedecer e não mandar (ou: Mandar Obedecendo);
  • Representar e não suplantar;
  • Ir às bases e não às cúpulas (ou: Baixar e não Subir);
  • Servir e não servir-se;
  • Convencer e não vencer;
  • Construir e não destruir;
  • Propor e não impor.
  Reinventar a política no Brasil passa pela escrupulosa adoção desses princípios, pois só assim será possível, algum dia, quem sabe, escrever na frente de cada repartição pública, na frente de cada câmara legislativa: “Aqui o povo manda, o governo obedece!”. Historicamente, o Parlamento é um lugar onde se ‘parla’, onde se fala. Em lugares em que todos falam, ninguém se escuta; e os que que ‘parlam’ não escutam a sociedade. Um Mandato Cidadanista necessariamente tem que vir acompanhado por processos de escuta sensível (escutatórias), através de círculos escuta e decisão, sejam temáticos ou territoriais, perenes ou em funcionamento temporal pré-determinado, com propostas e posicionamentos debatidos em encontros periódicos (incluindo transmissões ao vivo pela internet, em diálogo direto com o parlamentar), e processos de consulta e enquetes quanto a votações e posicionamentos relevantes, sempre observados princípios prévios do Mandato. Com os Círculos de Escutatória será possível adotar o método de consulta, via Micropolítica, com grupos de opinião/representação, que se debruçariam sobre temas de forma mais profunda, com objetivo de apresentar parecer para orientação às consultas públicas. Ao lado dos Círculos de Escuta, há que funcionar uma equipe de gestão do mandato que seja, ao mesmo tempo, comprometida com os princípios de construção coletiva e propostas de transformação, com capacitação técnica e operacional, e que seja dinâmica e eficiente. Junto a estes, que terão função técnica e profissional, as Codeputadas e Codeputados. A ideia dos Codeputados é uma proposta política, em que o mandato se apresenta como chapa, havendo a pessoa que, em função do histórico de vida, compromissos e representatividade, leva o nome na cédula eleitoral e assume formalmente a responsabilidade. Mas junto dela, de forma voluntária, e em compromisso político, são apresentados Codeputados, na função de Tuxauas (entre os diversos povos indígenas no Brasil, o tuxaua tem a função de representar as aldeias, sem distinção hierárquica e em constante rodízio), fazendo a ligação do mandato em sua área de atuação, sugerindo propostas, analisando pautas de votação, etc. Havendo, ao menos uma vez por ano, a realização de um Conselho de Visão, com Codeputadas e Codeputados, além de pessoas de referência, no Brasil e no exterior, em temas prioritários para o Mandato e a conjuntura do país, e colhendo a opinião geral dos círculos de escuta. Emendas individuais de parlamentares. Por princípio um Mandato Cidadanista deve ser contra emendas individuais de parlamentares, pois elas distorcem e corrompem a construção de políticas públicas, tornando direitos em dádivas, gerando clientelismo e meios para negociações não republicanas. Papel do Parlamento é aprimorar o orçamento público com emendas coletivas e de acesso público, não clientelista. Todavia, enquanto houver esse mecanismo de emenda parlamentar individual, e obrigatória (em 2017 foi de R$ 15,3 milhões por deputado federal), o compromisso do Mandato deve ser a distribuição destes recursos por edital público, a partir de temas prioritários para o Mandato, em que os projetos devem ser avaliados através de critérios transparentes e por uma comissão independente. Por fim. “Uma andorinha só não faz verão”, assim como a manhã não é anunciada por um galo só. Um Mandato Cidadanista só pode existir se fruto de um movimento e engajamento coletivo, não cabendo candidaturas de ‘si mesmo’. Em 2018 as eleições serão para o Congresso Nacional, assim como Assembleias Legislativas, e vão acontecer sob o signo de um Brasil vivendo um contexto de Golpe de Estado e regressão democrática, com desmonte de políticas e direitos sociais, manipulação política e instigação ao ódio e à violência. O ambiente é de um país dividido entre a Civilização e a Barbárie, entre a defesa dos interesses nacionais e populares e o ‘entreguismo’, com submissão aos interesses das grandes corporações transnacionais. É um tempo de resistência, que exige indignação, coragem e esperança. A partir da presente mobilização eleitoral, o objetivo é aglutinar forças para novos processos de revolução política e social, e para que tenham efetividade é preciso que eles aconteçam de baixo para cima. O melhor caminho será formar referências nos municípios, pois é no território que as pessoas vivem e compartilham suas relações. Combinando a luta de fora para dentro, de abaixo até acima, com ética e clareza de princípios, haveremos de fazer brotar um país como nunca se viu, em que o povo haverá de mandar, e os governantes haverão de obedecer. Este deve ser o principal objetivo para um Mandato Cidadanista no momento atual, abrindo caminho para a Revolução Brasileira, em processos municipalistas de tomada de poder, com sentido libertário, de busca do Bem Comum, com generosidade, respeito e coragem. No próximo artigo: propostas para uma Reforma Política a serviço do povo brasileiro.