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Gramsci dizia que todo ser humano é um intelectual em potencial, embora nem todos ajam como tal. Contudo, é também da natureza humano ser estúpido. O personagem do romance existencialista de Martin Page1, Antoine, acredita que a estupidez não está na coisa em si. Achar que alguém é estúpido dessa maneira seria um mero juízo de valor, um preconceito. A estupidez está na maneira de fazer as coisas ou de considerá-las.
É uma estupidez a maneira pela qual se trata a mulher, a interrompendo na maioria das vezes que fala. É uma estupidez considerar que Bolsonaro é o político ideal para guiar um país só por não se ter prova de corrupção.
Precisamos diferenciar a evidência da prova. Há evidências de que Bolsonaro recebeu propina, os 200 mil da JBS. Que seu nome estava na lista de Furnas. Que deve explicações sobre seu patrimônio e auxílio moradia. Mas não se tem a prova.
Pode ser provável que ele não esteja envolvido em nada disso. Que estão dizendo tudo isso para difamá-lo, para impedi-lo de vencer as eleições. O real, para Aristóteles, é o fato de todos estarem convencidos de algo. Não precisa ter evidência, basta ser provável, lógico e fazer sentido. Mas nem sempre o que é lógico é verdadeiro.
A imprensa e o seu poder manipulador, o fato de Lula ter sido presidente, o discurso jurídico, dentre outras questões, contribuíram para construir a imagem de um Lula corrupto. Agora a imprensa e os outros poderes estão fazendo o mesmo com Bolsonaro.
Contudo, a eloquência estúpida serviu para prender Lula e para fortalecer Bolsonaro. O personagem Antoine estava convencido de que ser estúpido o traria mais felicidade que a inteligência. Antes deixava de comprar roupas e alimentos de empresas que exploram crianças. Mas para atingir seu propósito de se tornar um estúpido, largou, além desse hábito, o xadrez e passou a jogar Banco Imobiliário, pois acreditava que o jogo o ajudaria a se tornar um capitalista egoísta, mesmo sem posses.
É muito mais fácil não se importar. Saber é trabalhoso. Por isso o discurso estúpido ganha espaço. A forma mais eficiente de combater a esquerda é com a estupidez. Ela é atrativa, convincente.
Ser socialista demanda trabalho. É preciso ler, conhecer intelectuais. É impossível ser de esquerda sem conhecer uma obra de Karl Marx. Já ser capitalista (não o investidor evidentemente) não demanda muito esforço. Basta ver o mundo pelos olhos da TV ou das redes sociais.
Ouvir Graciliano Ramos, Albert Einsten, Istvan Mezaros, Chomsky, é muito mais complicado que ouvir Danilo Gentili, Alexandre Frota ou Olavo de Carvalho. Os elementos que compõem a retórica da estupidez são muito mais instigantes que o que compõem um discurso inteligente. A inteligência é repulsiva.
Bolsonaro não é estúpido, muito menos aqueles que caem na sua lábia. Estúpida é forma como fala das coisas. E é exatamente o que o torna presidenciável. Foi ao falar estupidez que Trump venceu nos EUA, que Marine Le Pen chegou ao segundo turno na França, que faz a direita ganhar cada vez mais espaço na Itália etc..
O discurso estúpido (preconceituoso, racista, xenófobo etc.) consegue dar um sentido polêmico à evidência. E todos gostam de polêmica. A imprensa por saber desse gosto popular pela polêmica, adora rechear as páginas dos jornais com ela. Até mesmo intelectuais foram seduzidos pelo encanto das querelas infrutíferas. No início do século XX, Sílvio Romero, Araripe, José Veríssimo, entre outros, preenchiam a imprensa da época com diversas polêmicas. Mas depois perceberam que tudo era ridículo. Preferiram, no fim, fazer como o grande Machado de Assis, que se negava a responder qualquer ofensa a sua pessoa. Ele tinha “tédio à controvérsia”.
Hoje Bolsonaro possui o monopólio do discurso estúpido no Brasil. O fato de se descrever como o “messias” é o ápice da estupidez. Repito, ninguém é estúpido, apenas a maneira de fazer as coisas ou de considerá-las. O discurso estúpido na política acaba por ser estratégia inteligente (embora covarde) para atingir o fim da política: atrair o maior número de eleitor.
O discurso estúpido é irracional, como o ódio. Consegue provar algo adverso do que a evidência apresenta. Tampa os olhos de muitos que movidos pela fé acreditam na mudança.
1"Como me tornei estúpido", de Martin Page