Escrito en
COLUNISTAS
el
Durante os eventos da Parada LGBT (à época GLBT, pois ainda não tinha acontecido a I Conferência Nacional LGBT que alterou a sigla), em 2008, tive a oportunidade de entrevistar Nikolai Alexeyev, então líder do movimento LGBT da Rússia, que há dez anos já denunciava a perseguição por parte dos poderes legislativo e judiciário russos.
O assuntou voltou à pauta pois, recentemente, o Ministério das Relações Exteriores brasileiro divulgou um comunicado onde alertava aos turistas LGBT para não demonstrarem afetos nos espaços públicos no país sede da Copa do Mundo 2018. O comunicado está certo: o país, que foi palco da revolução mais importante do século XX – a Soviética – hoje é um dos muitos países que possui lei que proíbe a homossexualidade, e ela vale para cidadãos russos e estrangeiros.
Mas, as perseguições contra a comunidade LGBT russa não são de hoje.
Naquele tempo, 2008, a Parada LGBT da Rússia, que acontecia em Moscou, sofria perseguição por parte do judiciário que sempre, na véspera do evento, o proibia e alegava motivos de segurança aos participantes. Para realizar o ato e despistar as autoridades, os ativistas combinavam o local horas antes da Parada. Ela acontecia, mas durava algumas horas. Pois, a polícia rapidamente era acionada e reprimia com muita violência o ato.
Em 2013, veio o golpe final: o parlamento russo aprovou uma lei, com o apoio unânime e apenas uma abstenção, que proibiu qualquer manifestação LGBT nos espaços públicos, bem como materiais de informação. À época, os políticos russos declararam que a lei fazia parte da promulgação dos valores tradicionais e contra o "liberalismo ocidental". Para a Igreja Ortodoxa, que ganhou poderes a partir da gestão Putin, os valores ocidentais "corrompem a juventude". A lei prevê multas e prisões para aqueles que praticarem qualquer tipo de afeto homossexual e ato público em prol das LGBT.
Quando conversei com Nikolai Alexeyev, em 2008 - eu era repórter da revista A Capa, portal voltado para questões LGBT – o líder do movimento LGBT à época declarou que o principal objetivo do movimento era liberar a parada e conquistar o apoio da população. Infelizmente nenhuma das duas coisas aconteceu e hoje a Rússia é um lugar perigoso para as LGBT (assim como o Brasil, que não possui leis anti-LGBT, mas é o país que mais mata lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no mundo).
A seguir, confira a entrevista realizada em 2008 e publicada originalmente no portal A Capa:
Marcelo Hailer - Nós aqui no Brasil sabemos que vocês enfrentam muita repressão na Rússia por conta da religião ortodoxa e dos políticos. Gostaria que você falasse um pouco sobre a situação.
Nikolai Alexeyev - A parada de Moscou enfrenta vários problemas: 1º o prefeito de Moscou está lá a dezesseis anos e ele é extremamente homofóbico, ele odeia a parada gay e tem tentado barrar os direitos constitucionais e a manifestação de livre expressão. A parada de Moscou teve de entrar na Suprema Corte da Europa para poder se expressar no primeiro ano. Agora será a terceira na semana que vem, então, na primeira parada enfrentamos muitos protestos da população e dos políticos, já na segunda enfrentamos menos e na terceira esperamos que tenha um pouco menos. As pessoas vão se acostumando. Porém, a oposição da prefeitura é forte, e da igreja, que é ortodoxa, também é muito forte, eles consideram a homossexualidade um pecado, por isso tem pregado que os homossexuais são um bando de pecaminosos. Outros são grupos neonazistas que estão se formando pela Rússia.
Marcelo Hailer - Você ou outras pessoas envolvidas na luta já sofreram ameaças de morte, ou agressão física?
Nikolai Alexeyev - O que nós sofremos mais não são ameaças individuais, mas sim contra o evento, contra a manifestação e contra os direitos GLBT. As pessoas têm uma ojeriza por isso, então não há ação contra o indivíduo e sim contra as atividades.
Marcelo Hailer - Como acontecem os encontros entre os homossexuais pela Rússia?
Nikolai Alexeyev - Moscou e São Petersburgo são grandes cidades, então lá tem vida noturna, clubes e saunas voltadas para o público gay, claro que não tanto como São Paulo ou Nova Iorque. Agora, nas outras cidades da Rússia é mais difícil, nos poucos locais que existem para convivência há aquela história da polícia invadir o lugar, prender as pessoas... Por conta disso eles fazem muitos encontros pela internet.
Marcelo Hailer - Com tal realidade, como é para você saber que existe uma parada como a de São Paulo onde 3,5 milhões de pessoas são esperadas?
Nikolai Alexeyev - Para ser honesto eu não consigo imaginar, estou esperando por amanhã para ver como é. Eu tento imaginar, mas creio que será uma manifestação muito colorida e cheia de gente feliz. Eu acredito também que não é apenas o carnaval, mas é também uma manifestação política, uma luta pelo seu direito de existir, amar e ser. Mas, eu espero também que as pessoas lembrem que, enquanto aqui eles conseguem fazer isso, em muitos lugares do mundo não é permitido e as pessoas não têm o direito de se manifestarem livremente pelas ruas.
Marcelo Hailer - Você é otimista quanto ao futuro político e social da comunidade Russa?
Nikolai Alexeyev - Nós estamos no início do processo, a nossa caminhada tem apenas três anos. O primeiro passo que buscamos é que tenhamos o direito reconhecido de podermos existir como pessoas. A partir do momento em que conseguirmos o nosso respeito e que ganhemos na constituição o direito de nos manifestarmos, as outras mensagens serão transmitidas. Mas, o nosso primeiro passo é conquistar o direito de se expressar.
Comunicar erro
Encontrou um erro na matéria? Ajude-nos a melhorar