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Assim diz o Relatório da Comissão Nacional da Verdade, CNV:
“Nesse mesmo ano, em 28 de março, no Rio de Janeiro, o secundarista Edson Luiz Lima Souto, de 18 anos, foi baleado no peito à queima-roupa quando participava de manifestação por melhorias nas condições do restaurante Calabouço, frequentado pelos estudantes do Instituto Cooperativo de Ensino, onde estudava. Teve morte instantânea. O caso ganhou repercussão pública, pois seus colegas impediram que seu corpo fosse levado ao IML, e o conduziram até a Assembleia Legislativa, onde foi feita a autópsia e ocorreu o velório. Em seguida o corpo de Edson seguiu em cortejo, acompanhado por milhares de estudantes, até o cemitério de São João Batista, conforme narra o livro-relatório Direito à memória e à verdade” (Vol. 1., pg. 478).
O responsável?
Continuemos a leitura do Relatório:
“[...] um grupo de 25 homens armados da PM, sob comando do tenente Raposo, foi deslocado ao local para reprimir a manifestação. Os estudantes, que portavam apenas paus e pedras, reagiram, ao que os policiais avançaram violentamente, sob ordens do general Niemayer, autorizados a atirar para matar” (Vol. 1., pg. 478).
Extemporânea e sujeita a muitas críticas, a CNV fez o seu papel. Oportuno, importante e, é claro, incompleto. Disse a jornalista Cristiana Lôbo, do Portal G1, que ainda existem militares do alto oficialato que temem uma nova CNV – embora o país tenha decretado “amnésia institucional” em 1979 com a “autoanistia dos militares”, tenha experimentado um “anticlímax político” das “Diretas Já!” com a eleição de Trancredo e tenha visto apenas dois presidentes da República terminarem em estado de normalidade os seus mandatos no período dito de redemocratização. Já disse Florestan Fernandes que a transição foi muito negociada. Segundo o sociólogo, foi uma “transição transada”. Inadmissível, portanto.
O que a morte de Edson Luiz tem a ver com a de Marielle Franco?
Ora, de um jeito ou de outro, as duas mortes foram provocadas por razões políticas e o assassinato de Marielle Franco permanece com a autoria desconhecida. Ambas provocaram comoção nacional e serviram de despertamento para a situação política do país em diferentes momentos: uma sob as agruras da ditadura militar à época da Guerra Fria que polarizava o mundo e a outra sob o manto hipócrita de intervenção militar no Rio de Janeiro regida por um Estado de Exceção que se consolidou quando do golpe político-parlamentar sofrido por Dilma Rousseff. Mas, note: Marielle Franco era, entre outras coisas, mulher, negra, da Maré, vereadora, combativa no campo dos direitos humanos e eleita com mais de 46 mil votos. Somente a trajetória de Marielle Franco, a sua vida política e a atuação de seu mandato contra a violência policial e casos graves de arbítrio já fazem de seu assassinato um crime político.
Ontem as mulheres negras e as demais, além de homens cientes de seu papel histórico e cidadão, foram às ruas defender a democracia. O movimento de ontem não pode parar.
Mesmo que as autoridades elucidem o caso, de alguma forma, relacionando-o com episódios específicos de um crime e mesmo que a grande mídia – que tem de ser regulamentada –, queira a todo momento (na contramão dos organismos internacionais e da mídia estrangeira) dizer que a Marielle Franco foi morta sob suspeita de execução, sim, mas em razão da criminalidade do Rio de Janeiro como querendo reforçar a venda da intervenção militar do governo golpista, nós, sociedade civil, não aceitaremos barganhar a categoria de crime político.
Edson Luiz foi morto em decorrência de um crime político.
Marielle Franco, com as circunstâncias, parte dos fatos, a autoria e o mando por serem elucidados, de alguma forma – de quaisquer formas – foi executada em decorrência de crime político; quer seja por um aviso malogrado, quer seja por um exemplo dantesco, as condolências e comoções hipócritas que despontam sob fortes holofotes midiáticos não demoverão das mentes e do coração do povo brasileiro esse crime ocorrido em clima pré-eleitoral pós-golpe: a resposta tem de vir das/nas ruas, com atitudes firmes, e, sobretudo, na formação de consciência cidadã e voltada para os direitos humanos no país. Que o sangue de Marielle Franco, derramado em decorrência de crime político, não seja, e não será, despolitizado pela mídia que tenta, em geral, defender as ações políticas indefensáveis, impopulares. Ao invés de calar a Marielle, agora ela falará nos corações, nas mentes e nas bocas, por polifonia declarada, de milhões de brasileiras e brasileiros.
Edson Luiz vive! O reverendo Martin Luther King Jr., vive! Marielle Franco vive! Sem esquecer do motorista Adriano Pedro Gomes!
Intervenção não!
O Estado é de Exceção...
A Grande Mídia... é bem regrada!
2018 não acabará em AI-5 como ocorreu em 1968.
#MariellePresente!