Já pensou conversar com pessoas que já morreram? Uma Inteligência Artificial foi desenvolvida por uma empresa de tecnologia nos Estados Unidos e promete criar uma versão digital de uma pessoa a partir de suas memórias, voz e personalidade.
Em forma de aplicativo, ele visa preservar as histórias e os conselhos de pessoas que já faleceram, permitindo que familiares e amigos possam ouvir e interagir com elas através de um chat virtual. Para isso, são usadas ferramentas de reconhecimento de voz e de aprendizado de máquina para analisar as gravações de áudio, as fotos e os documentos da pessoa e gerar uma réplica digital que pode responder a perguntas e contar histórias.
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Quem criou? Como surgiu?
Um artigo publicado na MIT Technology Review, revista do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (EUA) explica como foi pensada a criação do bot. O aplicativo se chama HereAfter AI e a ideia surgiu com James Vlahos, o fundador e CEO da empresa HereAfter AI.
Ele teve sua inspiração quando seu pai foi diagnosticado com câncer terminal em 2016, assim ele decidiu gravar suas conversas com ele. Criou um chatbot chamado Dadbot, que podia falar com a voz do seu pai e contar histórias sobre sua vida. Vlahos disse que essa experiência o ajudou a lidar com o luto e a manter uma conexão com seu pai.
Ainda em fase de testes e sem disponibilidade para o público em geral, o aplicativo será lançado em breve, segundo a empresa de tecnologia, e já há uma lista de espera de pessoas interessadas em criar suas versões digitais ou de seus familiares. O custo do serviço ainda não foi divulgado.
E a superação do luto?
Embora a tecnologia disponível nos dias atuais ainda não faça réplicas completamente idênticas, a voz fica um pouco distinta, assim como o jeito de falar da pessoa. Há uma questão ética do uso da voz, pois a pessoa pode estar viva ou morta, e o risco de serviços como estes prejudicarem o processo de luto.
A pessoa que fizer o uso do aplicativo pode realmente acreditar que está conversando com alguém que já morreu ou rememorar constantemente que perdeu algum ente querido, e o artigo faz essa crítica.
Nazaré Jacobucci, em seu livro "Legado Digital: Conhecimento, Decisão e Significado - Viver, Morrer e Enlutar na Era Digital", esclarece que o uso desses aplicativos poderia prejudicar a assimilação da perda definitiva, pois inviabilizam a vivência da morte. Estudiosa do assunto, afirma que o grande receio em torno da utilização da inteligência artificial tem a ver com as propostas não reais e difundidas de se desenvolver um ser "imortal".
A psicóloga especializada em luto pela PUC-SP, Gabriela Casellato, também compara os aplicativos a drogas anestésicas falsas e viciantes. "Um app usado livremente pelo enlutado estaria a serviço de suas angústias e desespero diante da saudade, impedindo o desenvolvimento de recursos pessoais de enfrentamento”, afirma.
O perigo é sair da realidade por estar fragilizado emocionalmente: mexer nos objetos que lembram aquela é diferente de conversar com uma versão digital daquela pessoa, que é irreal, adverte um estudioso do campo e formado em psiquiatria pela Unifesp, Eduardo Perin.
Um lado positivo é destacado por ele: "sem intervenção de profissionais de saúde mental, [os aplicativos] não são indicados para tratar e superar os processos de luto. Mas caso propusessem reflexões, como programas de suporte claramente dispostos a ajudar, talvez tivessem um lado positivo”. No entanto, ainda é cedo para confirmar se a tecnologia será de um todo negativa ou positiva para a sociedade, a depender muito dos próximos desdobramentos da inteligência artificial.
Com informações do VivaBem, da UOL