A Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo, do Ministério do Trabalho, anunciou nesta sexta-feira (17) a terceira maior operação de resgate de trabalhadores dos últimos cinco anos. Ao todo, 139 vítimas, que trabalhavam em condições análogas à escravidão, foram resgatadas de fazenda de cana-de-açúcar no município de Acreúna, em Goiás.
A investigação apurou que a Agropecuária Nova Gália, empresa responsável pela Usina Nova Gália, de onde os trabalhadores foram resgatados, terceirizou a contratação de mão de obra para os chamados “gatos”. Na prática, ao invés de um setor de Recursos Humanos regulamentado, a usina passou a contratar trabalhadores por intermédio de quatro empresas “sem idoneidade e capacidade financeira”, o que que economizaria custos trabalhistas para a empresa contratante.
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Segundo Roberto Mendes, coordenador da ação, as vítimas deixavam suas famílias para trás com a esperança de conseguir enviar algum dinheiro para casa. No entanto, ao chegarem à fazenda, se davam conta da fraude ao receberem o primeiro pagamento, repleto de descontos indevidos, sobretudo em relação a transporte e alimentação.
As condições dos trabalhadores
Contratados para trabalhar no plantio da cana, muitos trabalhadores eram imediatamente transferidos para o setor de limpeza, que paga menos. Além disso, os descontos no pagamento que buscam quitar dívidas de transporte até a localidade são ilegais, a lei trabalhista exige que nesses casos o custo seja arcado pelo empregador.
Os trabalhadores afirmaram que após os descontos, praticamente ficavam sem nada e acabavam encontrando-se presos ao suposto emprego, sem condições de voltarem para casa. Outros teriam dívidas com comércios locais, e essas pendências eram acompanhadas de perto pelos “gatos”.
As vítimas se encontravam alojadas em abrigos no município, vivendo em condições precárias. Entre outras coisas, sem acesso a gás, alguns grupos cozinhavam com lenha. Tampouco havia locais seguros e higiênicos para que os alimentos fossem guardados. Eram comum que na hora da refeição os trabalhadores encontrassem a comida azeda.
Além disso, os ônibus que transportavam as vítimas dos abrigos na pequena cidade para a fazenda, os mesmos utilizados no emprego da dívida, apresentavam condições também precárias. Um acidente em decorrência da falta de manutenção em um dos veículos teria deixado algumas das vítimas feridas.
Números da operação
À coluna de Leonardo Sakamoto, no Uol, o procurador do Trabalho, Tiago Cabral, que participou da operação, explica que a prática de intermediar mão de obra dessa forma é ilegal e que a empresa sabe proceder da forma correta. No entanto, só o faz quando a fiscalização está funcionando. Durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), com o desmonte de órgãos de fiscalização, a prática se espalhou. “Estão achando que podem fazer qualquer coisa”, explica o procurador.
Somando todos os casos, os trabalhadores já receberam R$ 877 mil em rescisões e direitos trabalhistas. A Defensoria Pública da União anunciou que negociou mais R$ 283 mil em danos morais individuais. Já o Ministério Público do Trabalho conseguiu uma indenização de R$ 315 mil por danos morais coletivos, a ser revertida para instituições sociais de Acreúna e região.
Este é o terceiro maior resgate de trabalhadores registrado pelo Ministério do Trabalho nos últimos 5 cinco. Os outros dois ocorreram em Minas Gerais. No maior resgate foram resgatadas 433 vítimas e, no segundo maior, 273.
A Usina Nova Gália declara em seu site que tem capacidade para produzir, anualmente, 3,5 milhões de toneladas de cana com os quais entrega 128 milhões de litros de etanol hidratado, além de anidro e açúcar. A empresa assumiu a responsabilidade pelas irregularidades encontradas pela fiscalização.
Também participaram da operação equipes do Ministério Público do Trabalho, do Ministério Público Federal, da Defensoria Pública da União e da Polícia Federal.
Além dos 139 da Usina Nova Gália, outros 13 trabalhadores também foram resgatados na mesma operação. Dessa vez de uma fábrica de ração para animais. O local onde dormiam foi descrito pela operação como “impróprio até para a criação de animais”. Também foi resgatado um caseiro de 67 anos no município de Quirinópolis (GO).
*Com informações da coluna do Leonardo Sakamoto, no Uol.