A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) é alvo de uma campanha promovida pela direita brasileira junto às big techs para beneficiar a Starlink, empresa do bilionário de extrema direita Elon Musk, que oferece internet via satélite.
Há mais de um ano, a empresa aguarda uma decisão da Anatel sobre um pedido para expandir seus serviços no Brasil e nesse contexto, uma campanha de lobby busca contaminar o debate, dando a entender que a Anatel estaria agindo contra a Starlink em resposta às provocações de Musk às autoridades do Brasil.
Um deles é o bolsonarista Marcel van Hattem (Novo-RS). “A demora da Anatel para autorizar a expansão da Starlink no Brasil não é mera burocracia, há indícios claros de interferência política”, acusou o deputado, que é um dos cinco membros do Novo que protocolaram em fevereiro um requerimento contra o governo Lula.
Em outubro do ano passado, a Anatel precisou desmentir informações falsas que circulavam, alegando que a agência havia decidido interromper os contratos com a Starlink. No entanto, o atual presidente da Anatel, Carlos Baigorri, foi nomeado para o cargo em 2021 pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL), e seu mandato segue até o ano que vem.
A teoria conspiratória de que a Anatel está demorando para aprovar por motivações políticas também havia sido feita antes por um colunista da Timeline, veículo ligado ao blogueiro foragido Allan dos Santos.
Santos, que tem mandado de prisão expedido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Brasil, é investigado por sua suposta atuação em milícias digitais. Atualmente, ele vive nos Estados Unidos e é um dos pontos de conexão entre a extrema direita brasileira e americana.
O bolsonarista desempenhou papel central tanto no conflito entre Musk e Alexandre de Moraes no ano passado, que culminou na suspensão do X, além da recente investida da rede social Rumble contra o ministro do STF na Justiça dos Estados Unidos.
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Dependência da Starlink em regiões remotas preocupa
Em setembro de 2024, a Starlink se recusou a seguir uma ordem judicial que exigia a remoção do X, o que gerou desconfiança sobre os riscos que a empresa representa à soberania nacional. Especialistas também levantaram preocupações sobre a dependência das regiões mais isoladas do Brasil em relação aos serviços oferecidos pela empresa de Elon Musk.
Com 4.408 satélites atualmente autorizados a operar, a Starlink enfrenta sobrecarga em algumas regiões, motivo pelo qual apresentou, em dezembro de 2023, uma solicitação à Anatel para aumentar sua frota em 7,5 mil satélites de segunda geração.
Um artigo publicado pela organização pelo direito digital, Coalizão Direitos na Rede, intitulado “Starlink nos rios e céus da Amazônia Brasileira” levanta a preocupação com a expansão da empresa de Musk em áreas remotas da Amazônia.
De acordo com as pesquisadoras, “os dados preocupam quem investiga a relação de desigualdades e tecnologias de comunicações e informação, pois percebe-se que o interesse público de garantia do exercício pleno do acesso à informação e de conectividade significativa cai em armadilhas de promessas de rápida resolução que comprometem a soberania do país e aumentam a desigualdade de conexão entre as diferentes regiões”, afirmam.
“A Amazônia é, mais uma vez, uma enorme oportunidade de mercado porque são também gigantescas as precariedades em vários territórios da região. Fica para um outro momento, mas em municípios onde a mineração e as empresas de monocultivo estão sediadas, existem infraestruturas de primeiro mundo (exclusivo para uso interno)”
O relatório sobre o pedido de expansão da Starlink, elaborado pelo relator Alexandre Freire, foi publicado em dezembro pela Anatel, e agora aguarda julgamento pelo conselho diretor da agência. A próxima reunião está prevista para o dia 13 de março, mas a pauta ainda não foi anunciada.
Como apontou o site Teletime, além das questões políticas em jogo, a ampliação da rede de satélites da Starlink gerou um debate técnico, com as operadoras brasileiras de telefonia móvel expressando preocupações sobre os efeitos da medida nas redes móveis locais.
“Ao conceder o Direito de Exploração de Satélites nesta faixa de frequência à empresa de satélite Starlink, apresenta-se um cenário que requer cautela, devido aos riscos de interferência intersistêmicas, o que pode impactar não somente tecnicamente, mas também financeiramente, considerando que esta faixa viabiliza grande volume de tráfego demandado pelo 5G", disse a operadora Claro. "Atualmente, temos enlaces de micro-ondas na Banda E com presença em cerca de 50% do território nacional".
"É prematuro a decisão de utilizar a Banda E sobre o satélite, assim recomenda-se que a Anatel aguarde o resultado de estudos para evoluir a utilização sem impactar as redes existentes. Como exemplo, a Comissão Federal de Comunicações (FCC) adiou qualquer ação sobre os planos de uso de frequências de Banda E para satélite, pois há a necessidade de estabelecer condições para o uso", disse a Vivo.
A Fórum mostrou em uma reportagem como as big techs praticam hoje o “colonialismo digital” em países subdesenvolvidos. Um dossiê elaborado por três organizações e o projeto “Mapa dos Territórios da Internet”, desenolvido pela Coding Rights, uma organização que traz um olhar feminista interseccional para defender os direitos humanos no uso das tecnologias - em parceria com a Rede Transfeminista de Cuidados Digitais e com o apoio da Fundação Heinrich-Böll Brasil - mostram a tática oligopolista das empresas de tecnologia no mundo.
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