Nos primeiros sete meses de 2024, 25 milhões de brasileiros e brasileiras começaram a apostar em plataformas eletrônicas de esportes, as chamadas bets, com uma taxa de adesão média de 3,5 milhões de novos apostadores por mês. Este crescimento supera a velocidade de disseminação inicial do coronavírus no país, que levou 11 meses para atingir o mesmo número de pessoas infectadas.
Esses dados são do estudo 'A Epidemia das Bets', realizado pelo Instituto Locomotiva entre os dias 3 e 7 de agosto, que destacou que o número total de apostadores brasileiros já alcançou 52 milhões em cinco anos, com 48% desse total iniciando suas apostas nos últimos meses.
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O perfil dos apostadores mostra uma predominância masculina de 53%, enquanto 47% são mulheres. A faixa etária mais ativa está entre 18 e 29 anos, e uma significativa porcentagem dos apostadores pertence às classes econômicas mais baixas.
O presidente do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles, comentou à Agência Brasil a facilidade de acesso pelo celular e a intensa publicidade das casas de apostas como fatores chave para este crescimento.
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"Os jogos são dinâmicos e muitas vezes prometem pequenas vitórias que incentivam a continuidade das apostas", comenta Meirelles.
Contudo, o estudo também ressalta um lado preocupante desta tendência: 86% dos apostadores possuem dívidas e 64% estão negativados. A maior motivação para apostar continua sendo a esperança de ganhar dinheiro, muito acima do entretenimento ou da emoção, sugerindo uma busca desesperada por soluções financeiras rápidas através das apostas.
Os impactos psicológicos são também alarmantes, com muitos apostadores reportando aumento da ansiedade e do estresse. "Este fenômeno das apostas esportivas pode ser visto como uma pandemia com efeitos severos na saúde mental", adverte Meirelles.
Esta tendência ascendente das apostas foi impulsionada pela sanção da Lei 14.790/2023, que regulamentou essa atividade no Brasil. Atualmente, o Ministério da Fazenda está analisando centenas de pedidos de regulamentação para novas plataformas, sinalizando que o mercado de apostas esportivas online está longe de atingir seu ápice.
Leia aqui o estudo na íntegra.
Regulamentação das apostas on-line
A publicação da Medida Provisória nº 1.182 em julho do ano passado estabeleceu novas diretrizes para a exploração de apostas esportivas de quota fixa no Brasil. A medida alterou a Lei nº 13.756 de 2018 para ampliar o mercado de apostas, conhecido popularmente como "mercado de bets", eliminando o termo "exclusivo" previamente atribuído à União.
Com essa regulamentação, o governo espera gerar uma receita anual significativa, estimada entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões. A disposição legal busca modernizar e expandir o setor de apostas esportivas, alinhando-o com práticas internacionais e potencializando a arrecadação sem comprometer a regulamentação rigorosa do setor.
No último dia 26 de agosto entrou em vigor da nova legislação brasileira que regulamenta das apostas online. O governo recebeu mais de 100 pedidos de autorização para operação de casas de apostas virtuais. Seguindo a legislação iniciada em 2018 sob a gestão de Michel Temer, a falta de autorização agora renderá às atividades não regulamentadas o status de ilegalidade, com respectivas sanções aplicáveis.
Contudo, especialistas apontam que a implementação dessas regulamentações pode já estar atrasada e ser insuficiente frente aos crescentes impactos econômicos e sociais.
Segundo um estudo do Banco Itaú, os brasileiros perderam quase R$ 24 bilhões em apostas online no último ano, e o diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, sugere que o aumento da renda no Brasil não se refletiu como esperado no consumo ou poupança das famílias, possivelmente devido ao dinheiro gasto em jogos.
Ione Amorim, consultora do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), destacou em entrevista ao Brasil de Fato os prejuízos da demora na regulamentação.
"O ambiente atrativo das apostas, reforçado por influenciadores digitais, se propagou rapidamente, desviando não só recursos financeiros mas também afetando o comportamento de consumo das famílias brasileiras," disse.
O impacto se estende ao sistema de saúde, com o Hospital das Clínicas em São Paulo relatando capacidade esgotada para tratar problemas associados ao vício em jogos ainda este ano, ilustrando a gravidade do problema como uma crise de saúde pública.
Além disso, a consultoria Strategy& revela que as apostas já consumem 76% das despesas com "lazer e cultura" nas classes D e E, e representam 1,38% do orçamento familiar nas camadas de menor poder aquisitivo.
O relatório "Hopes and Fears 2024" também mostra que 43% dos brasileiros não sentem segurança financeira, uma situação potencialmente exacerbada pela prevalência das apostas.
A análise do Instituto Locomotiva corrobora essa preocupação, indicando que somente 36% dos lucros das apostas são redirecionados para outros gastos, e que um quinto da população de baixa renda joga ao menos uma vez por mês.
Diante deste cenário, Amorim ressalta a urgência de ações efetivas.
"É crucial reforçar a educação financeira e alertar sobre os riscos do endividamento. Estamos diante de uma situação onde a população mais vulnerável, já frequentemente endividada, enfrenta ainda mais perigos, inclusive a exposição a práticas de agiotagem," conclui.
O que é BET
'BET' é um termo que geralmente se refere a apostas, especialmente no contexto de apostas esportivas. Em inglês, "bet" significa literalmente "aposta". Nos últimos anos, a expressão tem sido amplamente utilizada para descrever plataformas e atividades de apostas online, onde usuários podem apostar em diversos eventos esportivos como futebol, basquete, tênis, entre outros.
Estas plataformas, muitas vezes chamadas de "sportsbooks" ou casas de apostas, permitem que os usuários coloquem suas apostas em resultados específicos de eventos esportivos, performance de jogadores, resultados de partidas e mais, com a possibilidade de ganhar dinheiro com base no desfecho desses eventos. A popularidade dessas plataformas cresceu significativamente com o avanço da internet e tecnologia móvel, proporcionando acesso fácil e rápido para os apostadores de qualquer lugar.
Cuidado para não cair nas armadilhas das BETs
As apostas esportivas, ou "bets", têm ganhado popularidade no Brasil, especialmente após a regulamentação da atividade. Apesar das oportunidades de entretenimento e ganhos financeiros que oferecem, as apostas esportivas também apresentam vários riscos que podem afetar os apostadores e a sociedade de maneira mais ampla.
Vício em Jogos de Azar: O acesso fácil e a constante promoção das apostas podem levar ao vício, especialmente em plataformas online que estão disponíveis 24 horas por dia. O vício em jogos de azar pode resultar em perdas financeiras significativas, problemas de saúde mental e deterioração das relações pessoais.
Problemas Financeiros: Apostar pode levar a perdas financeiras substanciais, especialmente para aqueles que não têm controle sobre suas atividades de jogo. Isso pode resultar em endividamento, dificuldades financeiras e até inadimplência.
Fraudes e Golpes: Como o setor de apostas atrai grandes somas de dinheiro, ele pode também atrair operadores fraudulentos. Apostadores podem ser suscetíveis a golpes ou usar plataformas de apostas que não garantem segurança nas transações ou proteção dos dados do usuário.
Manipulação de Resultados: As apostas esportivas aumentam o risco de manipulação de resultados, onde atletas, treinadores ou árbitros são influenciados para alterar o resultado de um evento esportivo. Isso compromete a integridade dos esportes.
Problemas Legais e Regulatórios: Apesar da regulamentação das apostas esportivas no Brasil, ainda existem áreas cinzentas na lei que podem causar confusão. Além disso, a aplicação inconsistente da regulamentação pode permitir práticas ilegais ou antiéticas.
Impacto Social: O vício em jogos pode ter um impacto negativo não só para o indivíduo, mas também para suas famílias e a comunidade em geral. Isso inclui aumento de casos de depressão, ansiedade e outros problemas de saúde mental.
Exploração de Populações Vulneráveis: As empresas de apostas frequentemente miram em populações vulneráveis com publicidade agressiva, o que pode levar esses grupos a riscos financeiros e psicológicos desproporcionais.
Para mitigar esses riscos, é crucial que os apostadores pratiquem o jogo responsável, estabelecendo limites claros para suas apostas e buscando ajuda se identificarem sinais de vício. Além disso, é importante que haja uma regulamentação e fiscalização rigorosa por parte das autoridades para garantir um ambiente de jogo justo e seguro.
Riscos para a saúde mental
As "bets" podem ter vários efeitos adversos na saúde mental dos indivíduos. Talvez o risco mais significativo seja o potencial de desenvolver um vício em jogos de azar. Este vício, conhecido como ludomania, pode consumir a vida de uma pessoa, levando-a a apostar de forma compulsiva, independentemente das consequências negativas. Mas há outros riscos em potencial:
Ansiedade e Estresse: A natureza incerta das apostas e a pressão para ganhar podem causar níveis significativos de ansiedade e estresse. Os apostadores podem se sentir constantemente preocupados ou nervosos sobre os resultados das apostas.
Depressão: As perdas financeiras e a sensação de culpa ou fracasso após apostas mal sucedidas podem levar à depressão. Em casos graves, isso pode resultar em pensamentos suicidas, especialmente se a pessoa sentir que perdeu controle sobre sua vida.
Problemas de Autoestima e Autoimagem: Perdas frequentes podem afetar a maneira como uma pessoa se vê, diminuindo sua autoestima. Isso pode levar a sentimentos de inutilidade ou incompetência.
Problemas de Sono: O estresse e a ansiedade relacionados às apostas podem interferir nos padrões de sono, resultando em insônia ou qualidade de sono reduzida, o que, por sua vez, pode exacerbar outros problemas de saúde mental.
Impacto nos Relacionamentos: O vício em apostas pode levar a conflitos com amigos e familiares, isolamento social e perda de relacionamentos importantes, o que pode aumentar os sentimentos de solidão e depressão.
Mudanças de Humor: As apostas podem causar oscilações extremas de humor, de excitação e euforia quando se ganha a desespero e tristeza quando se perde.
Desenvolvimento de Outros Comportamentos Compulsivos: Em alguns casos, o vício em apostas pode levar ao desenvolvimento de outros comportamentos compulsivos ou transtornos, como o abuso de substâncias.
É crucial que os indivíduos estejam cientes desses riscos e busquem estratégias de jogo responsável, como definir limites de tempo e dinheiro, e procurar apoio profissional se sentirem que suas atividades de apostas estão afetando negativamente sua saúde mental ou sua vida em geral.