PM DO RIO DE JANEIRO

Embaixatriz do Gabão: "como que aponta armas para a cabeça de meninos de 13 anos?”

A PM do Rio abordou de maneira truculenta e com armas quatro meninos com idades entre 13 e 14 anos, três deles negros

Abordagem violenta e racista da PM do Rio pode virar problema diplomático.Créditos: Reprodução/X
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Julie-Pascale Moudouté, embaixatriz do Gabão e mãe de um dos meninos negros que foram abordados de maneira violenta por policiais militares em Ipanema, na Zona Sul do Rio, nesta quarta-feira (3), reagiu indignada à ação truculenta dos soldados.

"Como que você vai apontar armas para a cabeça de meninos de 13 anos, como que é isso? Mesmos nós adultos, você me aborda, você me pergunta primeiro. E depois você me diz porque você está me abordando", afirma ela.

"Mas você não sai com uma arma e me manda colocar a mão na parede. A gente confia na Justiça brasileira e a gente quer justiça, só isso", encerra a diplomata.

Relembre o caso

Soldados da PM do Rio de Janeiro abordaram quatro adolescentes – 3 negros e 1 branco – em Ipanema, na zona sul da capital fluminense, na última quarta-feira (3), com armas e de maneira truculenta.

Eram oito horas da noite e seis minutos, de acordo com a câmera de segurança do condomínio que filmou a abordagem, quando 5 adolescentes chegam ao portão e um deles adentra o local. Na cena seguinte, passa um ônibus, e, logo atrás dele, uma viatura da PM de tipo veraneio, com o camburão estendido, estaciona de sopetão.

Os PMs desceram já apontando a arma aos quatro adolescentes, como costumam fazer no Rio de Janeiro quando veem três jovens negros andando nas ruas. Os quatro foram colocados com as mãos nas paredes, vasculhados e interrogados.

Um dos garotos, o de pele branca e apenas 13 anos, é brasileiro e sobrinho do jornalista Guga Noblat. Os outros 3, negros de 13 e 14 anos, são filhos de diplomatas do Canadá, Gabão e Burkina Faso. Noblat contou a história nas suas redes sociais, onde compartilhou as imagens das câmeras de segurança e um relato de Rhaiana Rondon, sua cunhada e mãe do menino abordado.

“Uma viagem de férias, planejada há meses entre quatro amigos. Com destino ao Rio, quatro adolescentes de 13 e 14 anos, acompanhados dos avós de um deles, experienciaram nas primeiras horas a pior forma de violência. Voltando para casa em Ipanema, foram deixar um amigo na porta de casa, na Rua Prudente de Moraes, foram abruptamente abordados por policiais militares, armados com fuzis e pistolas, e sem perguntar nada, encostaram os meninos (menores de idade) no muro do condomínio. Com arma na cabeça e sem entender nada, foram violentados. Foram obrigados a tirar casacos, e ‘levantar o saco’. Após a abordagem desproporcional, testemunhada pelo porteiro do prédio, é que foram questionados de onde eram, e o que faziam ali. Os três negros não entenderam a pergunta, porque são estrangeiros, filhos de diplomatas, e portanto não conseguiram responder. Caetano, o menino branco e meu filho, disse que eram de Brasília e que estavam a ‘turismo’. Após ‘perceberem’ o erro, liberaram os meninos, mas antes alertaram as crianças que não andassem na rua, pois seriam abordados novamente! As imagens, os testemunhos e o relato das crianças são claros! Não há dúvida! A abordagem foi racial e criminosa”, diz o relato da mãe.

Ela ainda conta em seu relato que frequenta o Rio faz muitos anos e que nunca presenciou nada parecido no “quadradinho de Ipanema”. Também disse que acionou o Itamaraty e que os consulados dos respectivos países de origem dos adolescentes já tomam as providências cabíveis.

“É um lugar aparentemente seguro, mas depende pra quem! Antes da viagem, fiz inúmeras recomendações, alertas e conselhos de mãe preocupada: ‘não ande com o celular na mão, cuidado com a mochila, não fiquem de bobeira sozinhos’. Pensei em diversas situações, mas jamais que a polícia seria a maior das ameaças. É traumático, triste, é doloroso. Estão assustados e machucados, com marcas que nem o tempo apagará. O Itamaraty já foi informado e os consulados no Rio já estão em ação. Sabemos que isso acontece todos os dias, mas não vamos nos calar! Essa luta é nossa”, finalizou.

Outro lado

A Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro enviou à reportagem, por e-mail, o seu posicionamento acerca do episódio. Leia a seguir na íntegra.

"Os policiais envolvidos na ação portavam câmeras corporais e as imagens serão analisadas para constatar se houve algum excesso por parte dos agentes. Em todos os cursos de formação, a Secretaria de Estado de Polícia Militar insere nas grades curriculares como prioridade absoluta disciplinas como Direitos Humanos, Ética, Direito Constitucional e Leis Especiais para as praças e oficiais que integram o efetivo da Corporação.

Reforçamos que a Ouvidoria da SEPM está à disposição dos cidadãos que se sentirem ofendidos para a formalização de denúncias através do telefone (21) 2334-6045 ou e-mail ouvidoria_controladoria@pmerj.rj.gov.br.

 A Corregedoria Geral da SEPM também pode ser contactada através do telefone (21) 2725-9098 ou ainda pelo site https://www.cintpm.rj.gov.br/. O anonimato é garantido".

Assista ao vídeo: