CRIME ORGANIZADO

O que é a Máfia dos Peixes, que seria responsável pelo sumiço de Dom e Bruno

Esquema ilegal atua na Terra Indígena Vale do Javari e indigenista brasileiro teria denunciado criminosos, que tiveram grande prejuízo financeiro, mostram investigações e documentos

Dom Philips e Bruno Pereira.Créditos: Redes sociais/Reprodução
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Uma reportagem da Associated Press (AP), agência de notícias dos EUA, veiculada no sábado (11), apontou que o desaparecimento do jornalista britânico Dom Philips e do indigenista Bruno Pereira, servidor licenciado da FUNAI, pode ter relação com a chamada Máfia dos Peixes, um esquema criminoso que opera em rios da região da Terra Indígena do Vale do Javari (AM).

A máfia teria caráter internacional, já que seus chefes estariam no Brasil, Peru e Colômbia, os três países que se tocam numa tríplice fronteira conturbada em decorrência do narcotráfico e de outras formas de crime organizado que operam naquela área amazônica. Os controladores do esquema ilegal fomentam a atividade pesqueira irregular nos rios e lagos da Terra Indígena do Vale do Javari, demarcada, protegida e que não pode ser visitada sem permissão das autoridades brasileiras, pelo menos na teoria.

Pescadores pobres das imediações são cooptados pelo bando, que paga uma ninharia por animais que depois são vendidos a preços muito mais vantajosos em mercados de cidades como Tabatinga e Atalaia do Norte, no Brasil, Letícia, na Colômbia, e Iquitos, no Peru, como o pirarucu, maior peixe de água doce do mundo, além de tracajás e tartarugas. A matéria da AP revela alguns casos de pescadores que foram presos, multados e que respondem a processos na Justiça por terem sido pegos na atividade ilegal dentro da Terra Indígena do Vale do Javari, que relatam ainda histórias horrendas de torturas, fome e intimidações por parte de policiais e agentes da FUNAI.

Quem primeiro levanta a hipótese do sumiço de Dom e Bruno estar relacionado à tal Máfia dos Peixes é o prefeito de Atalaia do Norte, Denis Paiva, que vaticinou a jornalistas, mesmo sem entrar em detalhes, que “o motivo do crime é uma briga pessoal pela fiscalização da pesca”. De fato, Bruno esteve envolvido em algumas ações policiais que prenderam pescadores da região dentro da Terra Indígena Vale do Javari, e suas informações, entregues às forças de segurança, impuseram à quadrilha grandes prejuízos econômicos, como a apreensão de cargas de pescado valiosas e de barcos e lanchas. Todas essas informações são oficiais e constam nos relatórios que compõem o inquérito que transcorre na Polícia Federal sobre a desaparição do jornalista e do indigenista.

O caso de um outro servidor da FUNAI, Maxciel Pereira dos Santos, que autuou e deteve pescadores do grupo mafioso, também é lembrado no texto. Ele foi assassinado a tiros na presença da mulher de uma nora, no centro de Atalaia do Norte, há três anos, e o caso, notoriamente relacionado à sua atividade profissional e ao combate à Máfia dos Peixes, segue sem solução até hoje.

Um historiador e professor da região, Manoel Felipe, disse à AP que não era segredo para ninguém que homens da Máfia dos Peixes no trecho colombiano estavam querendo acertar contas com o indigenista Bruno Pereira, que inclusive era ameaçado com frequência e tinha porte de arma para se proteger. “Em Letícia, todo mundo ficou com raiva do Bruno. Isso não é brincadeira, não. É possível que tenham enviado alguém para matá-lo”, disse Felipe.

Por fim, Paiva, o prefeito de Atalaia do Norte, ainda disse à reportagem da AP que não à toa os assassinatos de membros da FUNAI ocorreram no governo de Jair Bolsonaro, que, segundo ele, alimenta esse tipo de violência.

“Esse governo tornou as pessoas mais propensas à violência. Você fala com alguém hoje e ele diz que tem que pegar em armas. Antes não era assim”, afirmou.