VIOLÊNCIA POLÍTICA

Bar identificado com a esquerda é alvo de tiros em Brasília

Entrevistado pela Fórum, sócio do estabelecimento definiu ataque como “tentativa infame de silenciar vozes e plantar o medo entre os frequentadores do bar, uma tática autoritária, disruptiva e bárbara”

Casa Mimosbar, em Brasília, durante uma noite sem atentados..Bar identificado com a esquerda é alvo de tiros em BrasíliaCréditos: Arquivo Pessoal/ Sandro Biondo
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Um bar localizado na Asa Norte, em Brasília, foi alvo de um ataque a tiros na madrugada do último domingo (27), entre as 2 e as 3 horas da manhã. Os tiros acertaram alguns barris laterais, localizados na entrada do estabelecimento. De acordo com os donos, o alvo seria um mural, próximo aos barris, que contém mensagens políticas. O bar estava fechado na hora do ataque e não houve feridos. No dia seguinte, os sócios e funcionários encontraram os buracos nos barris e os restos de munição calibre 38 pelo chão.

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A Casa Mimobar é conhecida na região como um reduto da esquerda brasiliense, especialmente alinhado à causas LGBTQIAP+, antirracista e de direitos humanos. A Revista Fórum conversou com Sandro Biondo, jornalista, cenógrafo, sócio e idealizador do bar, para que contasse sobre o ocorrido.

“Assim que terminou a eleição, circulou uma lista apócrifa com nomes de estabelecimentos de esquerda que deviam ser evitados pelas pessoas que apoiam a extrema-direita. Até aí tudo bem, porque esse público não faz a menor falta e, na verdade, é até indesejável. Ocorre que começaram também a aparecer comentários negativos em nossas redes num fluxo muito maior do que antes das eleições, o que dá uma clara noção de movimento orquestrado. Já tínhamos registrado tal fato e já estávamos em alerta, pois fizemos apuração dos dois turnos das eleições, e uma festa no dia da eleição de Lula, reunindo público por toda a rua em que estamos localizados”, contou.

Biondo é o idealizador do projeto e responsável pela sua identidade estética. Além dele, há mais dois sócios, um que fica responsável pelo marketing e planejamento e uma sócia que responde pelo administrativo. Ele também explicou que a relação do bar com a vizinhança é ótima e descarta que o ataque tenha sido fruto de reclamações de barulho. Até porque, reclamações de barulho geralmente chegam acompanhadas da polícia, não de tiros anônimos na madrugada, em hora que o estabelecimento se encontra fechado.

“Mesmo neste estado protofascista de liberação de armas e valorização da violência, é impensável que qualquer de nossos vizinhos fizesse isso. Somos precursores na ocupação de uma quadra conhecida como Babilônia Norte, que antes estava abandonada e agora têm muitos negócios relacionados a economia criativa como novos bares, estúdio de tatuagem, ateliers de artistas e escritórios de arquitetura. Não há a mínima chance de o ataque ter partido de um de nossos vizinhos, até porque esta parte de Brasília é conhecida como um reduto de resistência e de reunião de pessoas da esquerda. Não há como se pensar em fogo amigo”, revelou.

Biondo ainda explica que registrou um boletim de ocorrência assim que foi constatado o fato, além de ter publicado nota na imprensa com o duplo objetivo de chamar a atenção para a gravidade do incidente, e também marcar posição quanto ao que considera uma “tentativa infame de silenciar vozes e plantar o medo entre os frequentadores do bar. É uma tática autoritária, disruptiva e bárbara”, declarou.

A Polícia Civil do Distrito Federal agora investiga o caso. Perguntado sobre o que espera do desfecho, Biondo é direto: quer trabalhar em paz e construir uma sociedade onde esse tipo de ataque não mais aconteça.

“Só queremos trabalhar e continuar sendo a referência que somos em Brasília para o público progressista. Construímos um ambiente de acolhimento, de conforto e de diversidade. Somos conhecidos faz muitos anos como reduto de esquerda, assumimos esta face e batemos no peito para dizer isso. Me parece óbvio que o mentor, não só no nosso caso, como em todos os eventos distópicos que estamos presenciando, é o próprio ectoplasma que vaga e conspira desde o Palácio da Alvorada. Assim como disse um auxiliar do governo militar na época da ditadura, o perigo não é o que o presidente faz, mas o que autoriza seu seguidores a fazerem. Ou seja, o perigo é a figura do ‘guarda na esquina’. E hoje o risco vai muito além dos militares e dos guardinhas. Os tentáculos estão espalhados para muito além das esquinas”, refletiu.