O Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ deu início no último dia 19 a um curso que tem como objetivo discutir o fenômeno migratório mundial à luz da teoria crítica dos direitos humanos com especial enfoque na perspectiva de gênero. O curso, iniciativa de extensão da UFRJ, teve altíssima procura tanto de brasileiros quanto de imigrantes.
A professora e jurista Vanessa Berner, que coordena a iniciativa, disse à Fórum que o curso conta com brasileiros e estrangeiros (de Colômbia, Venezuela, Equador, Estados Unidos e França) inscritos na turma.
"Nem todos os estrangeiros inscritos são imigrantes, pois como o curso é online, alguns estão em seus países de origem. Porém, temos também imigrantes que estão no Brasil. A maior parte deles trabalha com temáticas relacionadas à imigração, outros simplesmente querem conhecer o sistema, saber como funciona a questão migratória no Brasil, quais são seus direitos, como é a legislação", explicou.
Segundo a professora, "muitas pessoas trabalham em ONGs, em regiões de fronteira, como as do sul ou do norte, e alguns imigrantes relatam dificuldades que encontram para se adaptar".
Madison Garcia é uma das migrantes que participam do curso e atua diretamente com a temática. Garcia é venezuelana e pesquisa questões migratórias. A pesquisadora fez mestrado na UFPR sobre a integração de pessoas venezuelanas em Curitiba e agora cursa doutorado na UFRJ sobre migração e gênero.
A pesquisadora chegou ao curso através das redes de estudos migratórios construídas por pesquisadores.
Garcia aponta que o debate é fundamental, tendo em vista que o Brasil é um país que historicamente está aberto a migrantes. "Brasil é historicamente constituído como um país receptor de grupos migratórios. Se a gente pensa na região sul do Brasil, Sudeste tem grande proporção de migrantes da segunda guerra mundial, migrantes econômicas que chegaram no século XX para cafeicultura, entre outras coisas", disse. "Hoje, o Brasil tem sido receptor de diversos grupos migratórios, haitianos, sírios e agora venezuelanos", completou.
Ela lamenta apenas o fato de as aulas no formato remoto o ensino remoto serem mais restritiva para a comunicação entre os pares, apesar de ponderar que esse modelo permite que mais gente participe.
Migração no Brasil
"É importante dizer que os processos migratórios, o movimento de capitais e de pessoas, fazem parte da nossa sociedade. As pessoas continuam em movimento mesmo com o fechamento das fronteiras, as pessoas continuam migrando e se movimentando através dos territórios. Então, a migração vem sendo um direito humano e vem sendo uma qualidade da humanidade", afirmou Garcia.
Berner também comentou sobre ainda a relevância do debate no Brasil. "Por diversos motivos, seja porque estamos vendo o aumento do fluxo de imigrantes aumentar por aqui a partir da primeira década do século XXI, seja porque as diversas crises contemporâneas estão mudando a configuração desses fluxos nos últimos tempos", disse.
A jurista comentou ainda sobre a situação tensa que vive o Afeganistão e a busca por refúgio. A professora acredita que é improvável que migrantes cheguem ao Brasil. "Na América Latina, México, Chile e Costa Rica se manifestaram favoravelmente à recepção de afegãos. O Brasil não descartou a possibilidade de recebê-los, mas insistiu que devem seguir o processo de refugio, como os venezuelanos", afirmou.
Recorte de gênero
A professora explicou à Fórum que o curso se relaciona com a pesquisa que o grupo "Fluxos Migratórios no Mundo Contemporâneo" realiza sobre a temática da feminização da migração internacional. As aulas são comandadas por Berner e outras integrantes do grupo de pesquisa.
"Recentemente nos unimos a uma rede internacional de pesquisadores que analisam a relação entre a questão de gênero e o fenômeno migratório", afirmou. Em artigo publicado recentemente, a professora destaca que fluxos migratórios passaram por uma profunda modificação entre o século XX e o XXI, o que inclui um novos perfis de classe, raça e gênero.