Figura conhecida das redes sociais pelo seu ativismo em prol de um cristianismo que acolha as pessoas, Zé Barbosa Jr é membro da Aliança das Igrejas Batistas do Brasil e atualmente está em Campina Grande, na Paraíba. Ele é o terceiro entrevistado da série especial “Evangélicos Contra Bolsonaro”, produzida com exclusividade pela Revista Fórum.
Para falar do controverso alinhamento entre grupos ditos cristãos e a corrente política extremista do atual presidente da República, começo questionando Barbosa sobre o estigma que recaiu sobre todos os evangélicos por conta dessa união de alguns.
"Isso é desgastante. E a esquerda deveria abandonar de vez essa assimilação. O mundo evangélico é amplo e diverso, como a sociedade brasileira. Esse estigma só impede o avanço das forças progressistas entre evangélicos que, se fossem coerentes, abraçariam as causas urgentes e necessárias que defendemos. Há pouca coisa mais progressista que o Evangelho e é sempre bom frisar que Malafaia, Macedo, Santiago e outros há muito tempo abandonaram a fé. São empresários religiosos, bandidos que se apropriaram do discurso religioso com vistas apenas aos seus projetos pessoais de poder", diz.
Barbosa diz que, pessoalmente, sente-se incomodado por sempre ter que se justificar ao se apresentar como cristão e pastor, já que associar a imagem dos evangélicos a Bolsonaro e pastores suspeitos de enriquecer com o dinheiro dos fiéis é algo quase automático para a maioria das pessoas.
"Causa incômodo e, como disse anteriormente, é desgastante. Porque antes de falar qualquer proposição, primeiramente tenho que perder tempo explicando por que não sou reacionário e ultraconservador, que Malafaias e Macedos não representam a totalidade dos evangélicos, que Bolsonaro é uma espécie de anticristo, entre outras coisas... Mas entendo quem pensa assim, por incrível que pareça. Se tivesse acesso aos evangélicos apenas pelo que se vê na mídia, provavelmente pensaria o mesmo", reclama.
Já que para o pastor há uma incoerência óbvia entre o cristianismo e as posições defendidas pelo atual presidente, peço então para que Zé explique mais claramente quais seriam essas contradições.
"Eu poderia enumerar várias contradições, mas vou falar de apenas uma que considero a principal. Bolsonaro (e o bolsonarismo) é movido pelo ódio, pelo sentimento de destruição e morte, enquanto a fé cristã tem como sua base principal o amor, que resulta em vida e luta por justiça social."
Menciono a opinião de alguns políticos, lideranças cristãs e acadêmicos que afirmam que Bolsonaro se aproveita do segmento evangélico, por meio de pastores e bispos, para cooptar o grupo. Zé Barbosa diz que concorda com essa visão e fala um pouco sobre a relação entre os dois lados.
"Com certeza concordo! Bolsonaro é um aproveitador barato. Se faz de evangélico para os evangélicos, de católico para os católicos e brinca com a fé cristã. E assim como há dolo por parte do presidente, há também por parte dos líderes que “se deixam” cooptar por ele. Ninguém é inocente nessa história. Tanto um como os outros querem o poder pelo poder e têm como motivação de vida a ganância e a 'destruição do inimigo', digamos assim", explica.
Jair Bolsonaro é conhecido há mais de 30 anos por suas posições abertamente favoráveis à violação dos direitos humanos e mesmo depois de chegar à chefia do Estado permaneceu com um comportamento inapropriado para um político que lidera uma nação. Seu discurso quase sempre descamba para opiniões favoráveis a assassinatos, torturas e à violência. Zé Barbosa se indigna com as lideranças evangélicas que endossam essas insanidades.
"Na verdade, as lideranças ditas evangélicas que apoiam e servem de suporte e palanque para Bolsonaro e suas ideias não têm nenhum compromisso com o Evangelho de Cristo. São pastores de si mesmos, usando uma figura bíblica do apóstolo São Paulo: 'Porquanto, como já vos adverti repetidas vezes, e agora repito com lágrimas nos olhos, que há muitos que vivem como inimigos da cruz de Cristo. O fim dessas pessoas é a perdição; o deus deles é o estômago; e o orgulho que eles ostentam fundamenta-se no que é vergonhoso; eles se preocupam apenas com o que é terreno'...", compara o pastor.
Suas críticas também são direcionadas à bancada evangélica, um forte grupo parlamentar que majoritariamente dá suporte políticos e serve de base para Bolsonaro no Congresso.
"Essa bancada é uma representação de parte dos evangélicos, mas não do Evangelho. Ninguém que tenha lido uma página apenas das palavras atribuídas a Jesus seria capaz de defender o que essa bancada defende. Esses homens zombam da fé cristã, são usurpadores do nome de Cristo, inimigos da Palavra de Deus, escarnecedores, são os verdadeiros ímpios (aqueles que negam a piedade que dizem ter). É uma representação vergonhosa e pusilânime, covarde, mentirosa. Representam aquele que a bíblia chama de 'Pai da Mentira': o diabo", se exalta.
Zé Barbosa Jr acredita que só há um caminho para reverter essa tendência de apoio à política de morte de Bolsonaro por parte da maioria dos evangélicos e isso passa pela vertente progressista do grupo. Ele também acha que se a esquerda parasse de atacar quem professa essa fé, já ajudaria bastante, e até cita a melhora neste cenário segundo a última pesquisa Datafolha.
"Há essa possibilidade, sim, e é o que vários movimentos cristãos têm lutado para conseguir. Há muitos evangélicos progressistas e muitas organizações e movimentos na luta por essa disputa de narrativa. Parte da esquerda (os mais radicais) ajudaria muito se não atrapalhasse com alguns discursos pré-moldados e, na verdade, preconceituosos. A fé simples do povo não pode ser confundida com a manipulação deslavada e criminosa de lideranças podres como Valadões, Valandros e Malafaias. Há muita possibilidade de mudança e isso fica nítido na última pesquisa Datafolha que mostra Lula já está empatado com Bolsonaro entre evangélicos", considera.
A consideração final de Barbosa, quando perguntado sobre Bolsonaro ser, ou não, evangélico, é bem direta e não deixa margem para interpretações.
"Bolsonaro pode ser tudo, menos cristão... É um anticristo, com certeza!", encerra.
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Para ler a matéria de abertura da série, clique aqui.
Para ler a entrevista do pastor Henrique Vieira, clique aqui.
Para ler a entrevista da pastora Eliad Dias, clique aqui.