A Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Paraná (OAB-PR) divulgou, nesta terça-feira (11), uma nota, na qual criticou e classificou como “inaceitável” a conduta da dupla de advogados de defesa, que atuou no julgamento de Luis Felipe Manvailer, em Guarapuava (PR). O réu foi condenado a 31 anos, 9 meses e 18 dias de prisão por assassinar a ex-esposa, Tatiane Spizner.
No entanto, além do resultado, uma cena chamou a atenção de internautas. A defesa de Manvailer, para sustentar sua tese de que ele havia apenas agredido Tatiane, e não a matado, simulou uma agressão dentro do tribunal do júri.
Em vídeo que circula nas redes sociais, o advogado Cláudio Dalledone Júnior aparece segurando a advogada Maria Eduarda Lacerda com força pelo pescoço e a empurra, a ponto de ela quase cair no chão.
Segundo a OAB-PR, “o processo e as estruturas do Sistema de Justiça, incluindo a atuação da advocacia, não podem ser usados, sob nenhum pretexto, para propagar a violência que deveriam enfrentar e combater, sendo inaceitável a utilização do corpo feminino para a reprodução de atos de violência. Recomenda-se, assim, a reflexão sobre os limites da atuação em plenário, para que não ocorram exageros que comprometam a dignidade profissional e a própria essencialidade do Tribunal do Júri, como forma de participação popular no julgamento dos crimes contra a vida”, diz trecho da nota, de acordo com reportagem de Guilherme Bittar, no Revérbero.
Conforme a OAB, caberá ao setor ético disciplinar da instituição analisar as condutas verificadas e adotar as providências que se mostrem cabíveis.
Depois da cena, Dalledone mostrou o pescoço da advogada aos jurados, com marcas de vermelhidão. “Olha o pescoço dela como ficou, claro que vai ter hemorragia. Vocês acham que esse colar não teria arrebentado [se a vítima tivesse sido asfixiada]? No entanto, foi encontrado com ela no chão”, disse.
A cena causou polêmica na internet. O procurador Vladmir Aras foi um dos que compartilharam a gravação que viralizou nas redes sociais e ironizou: “Quase um vale-tudo”.
Após a repercussão negativa nas redes sociais, Dalledone divulgou um vídeo na tentativa de explicar a cena. Segundo ele, tratou-se de uma dinâmica previamente combinada e a advogada não sofreu nenhuma lesão. Maria Eduarda aparece ao lado de Dalledone e diz que foi uma honra participar do que chamou de simulação. “Não me senti subjugada”.
Maria Eduarda responsabilizou a viralização do vídeo pela polêmica e não o ato em si: “Se trata de uma situação corriqueira e normal no Tribunal do Júri. Tratava-se de uma situação treinada, previamente acordada com Cláudio Dalledone Junior, uma forma de apresentar a prova ao conselho de sentença”, comentou ela.
Conforme disse, a viralização do vídeo prejudica não só a ela, mas todos os advogados. “Prejudica a minha imagem, a dos meus colegas e a de todos os advogados e advogadas que militam no Tribunal do Júri e que podem se sentir acuados ao realizar atividades como essa pelo simples fato de os vídeos viralizarem”.
Maria Eduarda reforçou que a “simulação” foi combinada e que ela se ofereceu para isso.
“Não me denegriu, não me deixou marcas. Eu me ofereci para participar. E se trata de algo corriqueiro para todos aqueles que sabem e atuam no Tribunal do Júri”.
Veja a íntegra da nota da OAB-PR:
A Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Paraná, por sua diretoria, vem a público manifestar-se sobre o Júri da morte da advogada Tatiane Spitzner, destacando que a decisão do plenário reconhecendo a prática de feminicídio deve servir de reflexão a toda a sociedade, sobre a necessidade de combater e eliminar toda e qualquer violência de gênero, especialmente a violência contra as mulheres, cabendo aos órgãos públicos, aos poderes constituídos e às instituições a promoção de ações educativas, preventivas e repressivas desses atos, porquanto a vida em sociedade deve ocorrer dentro os padrões da igualdade, do respeito e da dignidade.
A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná reitera que no Tribunal do Júri a ampla defesa deve ser assegurada, e que o papel dos advogados não se confunde com a figura do acusado, impondo-se à advocacia a atuação consentânea à sua honra, à nobreza e à dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade, observando nas suas relações com os colegas de profissão, agentes políticos, autoridades, servidores públicos e terceiros em geral, o dever de urbanidade, tratando a todos com respeito e consideração, ao mesmo tempo em que preservará seus direitos e prerrogativas, empregando sempre a boa técnica jurídica.
O processo e as estruturas do Sistema de Justiça, incluindo a atuação da advocacia, não podem ser usados, sob nenhum pretexto, para propagar a violência que deveriam enfrentar e combater, sendo inaceitável a utilização do corpo feminino para a reprodução de atos de violência. Recomenda-se, assim, a reflexão sobre os limites da atuação em plenário, para que não ocorram exageros que comprometam a dignidade profissional e a própria essencialidade do Tribunal do Júri, como forma de participação popular no julgamento dos crimes contra a vida. Caberá ao setor ético disciplinar da instituição analisar as condutas verificadas, e após exercitada a ampla defesa, adotar as providências que se mostrem cabíveis.
Por fim, a OAB-PR reitera que no Júri ocorrido na comarca de Guarapuava, atuou por seu setor de prerrogativas, desde o início até seu final, acompanhando no plenário todos os atos, preservando o livre e pleno exercício da advocacia, tanto pela defesa como pela assistência de acusação, porquanto a indispensabilidade dos advogados na promoção da Justiça deve ser efetivada com o amplo respeito de suas prerrogativas profissionais.