Massacre em Varginha: Muitas perguntas e nenhuma resposta

A Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas quer saber por que não foi possível evitar tantas mortes, visto que a PM acompanhava os passos da quadrilha

Especialista afirma que a ação da PM em Varginha (MG) tem semelhança com Jacarezinho/ Foto: divulgação
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No último domingo (31) as polícias Militar e Rodoviária Federal, do estado de Minas Gerais, realizaram uma operação em Varginha que deixou 26 mortos.

Após a operação, a PM-MG divulgou em suas redes sociais um grande aparato que foi apreendido na operação.

A ação foi dividida em dois momentos: na primeira abordagem foram mortas 18 pessoas e apreendidos dez fuzis, munições, granadas e dez veículos roubados.

Por sua vez, a segunda operação ocorreu em uma chácara onde, segundo a PM de Minas Gerais, “houve intensa troca de tiros” e sete pessoas foram mortas.

De acordo com informações da Polícia Militar de Minas Gerais, os 26 suspeitos mortos em Varginha planejavam um grande assalto com a mesma estratégia utilizada em Araçatuba (SP), quando um grupo invadiu a cidade com armas de alto calibre, explosivos e drones.

Durante coletiva de imprensa, o comandante do Bope (Batalhão de Operações Especiais) de Minas Gerais, Rodolfo Fernandes, afirmou que as características da ação que estava sendo planejada em Minas Gerais tinham pontos em comum com os assaltos de Araçatuba (SP), Criciúma (SC) e Uberaba (MG).

"O criminoso muitas vezes deixa uma assinatura, seja no modo de agir, no planejamento. Nos explosivos que foram apreendidos num dos sítios, o esquadrão antibombas conseguiu identificar uma assinatura, a forma com que eles foram feitos indica que são de uma mesma quadrilha", disse Fernandes.

Ainda segundo informações da PM, a ação que estava sendo planejada era semelhante ao da cidade do interior de São Paulo, estratégia chamada de "domínio de cidades".

Porém, se a Polícia Militar de Minas possuía tantas informações do grupo e o monitorava, matá-los era o único caminho possível?

"Estamos em busca da verdade"

A deputada Andreia de Jesus (PSOL), que preside a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Mingas Gerais (ALMG), anunciou em suas redes que a Comissão vai acompanhar a investigação sobre o massacre de Varginha e afirmou que, entre os vários questionamentos, o principal é: por que não foi possível evitar as mortes?

“A Comissão de Direitos Humanos vai acompanhar o desfecho. Mas, os questionamentos que nós estamos fazendo são os mesmos que a Polícia Militar (de Minas Gerais) já está fazendo, há um processo de investigação do Ministério Público, na Defensoria”, explica a deputada.

“O questionamento parte do número de mortes que gerou essa operação. Nós temos uma polícia com técnica, inteligência para atuar em qualquer situação preservando, principalmente, as vidas. Esse número de mortos precisa sim ter uma fiscalização e nós fomos acionados pelas famílias que estão buscando ajuda para enterrar seus entes. Nós estamos falando de famílias muito vulneráveis”, revela Andrea.

Em seguida, a deputada afirma que o trabalho da Comissão de Direitos Humanos é estabelecer a verdade em torno da operação em Varginha. “Fizemos um requerimento pela Comissão de Direitos Humanos para que possamos ter acesso ao relatório que será produzido com a presença da polícia civil. É importante a inteligência da Polícia Civil, para além da atuação da PM e do Ministério Público. Nós estamos em busca da verdade”.

Em seguida, a deputada levanta uma série de questões sobre a operação. “O que me move nesse momento é que justamente a polícia e as autoridades possam responder: por que não foi possível evitar as mortes? Por que não foi possível garantir o devido processo legal? Que as pessoas passassem pela Justiça e que respondessem pelos crimes no Judiciário? Esse é o grande questionamento. Por que a morte foi a única resposta nessa operação?”, questiona Andreia de Jesus.

Celeridade na investigação



A deputada Leninha Alves (PT), que também integra a Comissão de Direitos Humanos da ALMG, também chamou a atenção para o grande número de perguntas sem respostas em torno da ação e afirmou que é preciso celeridade nos trabalhos para que dúvidas sejam sanadas.

“Faltam-nos informações detalhadas da operação, dos elementos que a polícia já dispunha, uma vez que monitorava e investigava o grupo. Acredito que essas e outras questões deverão ser contempladas no processo de investigação. São muitas perguntas que precisam ser respondidas o que é necessário é celeridade, seriedade e compromisso para que o processo seja o mais transparente possível, contemplando todas as instâncias e os envolvidos no episódio”, questiona.

Por sua vez, a deputada Andreia afirma que o episódio deve trazer à discussão o atual modelo de segurança pública, pois, este “não está trazendo paz” e faz novos questionamentos sobre a operação.

"É possível afirmar que não haverá mais tráfico de armas a partir dessas mortes? É possível identificar de onde veio as armas? Quem é que lucrou com a venda e distribuição dessas armas? São perguntas que eu aguardo e por isso vou acompanhar o trabalho do Ministério Público e dos outros órgãos responsáveis para chegar nesse desfecho", questiona Andreia de Jesus.

Uso politico da operação



Perguntamos para a deputada Leninha se é possível identificar motivação política na ação em Varginha.

"É preciso admitir que passamos, em nível nacional, por episódios recentes, no mínimo estranhos, de políticos frequentando cenas de operações policiais – buscando evidenciar força e legitimação da barbárie humana, o que na minha avaliação é um desserviço às forças de segurança e a própria segurança prestada à população, experiência que esperamos não ter de vivenciar em Minas Gerais", criticou.

https://twitter.com/RomeuZema/status/1454856655498272773

Um dia depois de conversar com a reportagem da Fórum, a deputada Andreia de Jesus foi ameaçada de morte por levantar questionamentos sobre o massacre de Varginha.

https://twitter.com/andreiadejesuus/status/1456028215978479617?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E1456028215978479617%7Ctwgr%5E%7Ctwcon%5Es1_&ref_url=https%3A%2F%2Frevistaforum.com.br%2Fbrasil%2Fdeputada-mg-ameacada-morte-massacre%2F

Segredo de Justiça

À Fórum, o Ministério Público de Minas afirmou que vai abrir "um Procedimento Investigatório Criminal (PIC) para acompanhar os desdobramentos da operação policial realizada pela Polícia Militar de Minas Gerais e Polícia Rodoviária Federal em Varginha, na madrugada do último domingo, 31 de outubro. O PIC deve correr em segredo de justiça".

O acompanhamento da investigação ficará a cargo a cargo da promotora de Justiça de Varginha, Eliane Claro; do procurador André Ubaldino; da promotora Paula Ayres Lima, coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) Central; do promotor Francisco Ângelo Silva Assis, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos e Apoio Comunitário (CAODH) e do promotor Igor Serrano Silva, coordenador do Gaeco Regional de Varginha.

Sem resposta


A reportagem encaminhou os questionamentos que abrem esta matéria e aqueles apontados pelas deputadas à Polícia Militar de Minas Gerais, mas, até o fechamento desta matéria, não obtivemos retorno.

Também foram encaminhadas perguntas à Polícia Federal de Minas Gerais, que anunciou a abertura de um inquérito para investigar a operação de Varginha. Mas, também não respondeu aos nossos questionamentos até o encerramento dessa reportagem.

Única resposta

Entre as muitas perguntas que permeiam a operação de Varginha, uma tem resposta e diz respeito ao nome das vítimas.

Dos 26 mortos, 25 foram identificados e os seus corpos estão no Instituto Médico Legal de Belo Horizonte e podem ser requeridos pelos familiares.

São eles:

Artur Fernando Ferreira Rodrigues, 27 anos; Daniel Antonios de Freitas Oliveira 35; Darlan Luiz dos Santos Brelaz, 41;

Dirceu Martins Netto, 24 anos; Eduardo Pereira Alves, 42 anos; Evando José Pimenta Junior, 37; Francinaldo Araújo da Silva, 44;

Gerônimo da Silva Sousa Filho, 28; Gilberto de Jesus Dias, 29; Giiliano Silva Lopes, 32; Gleisson Fernando da Silva Morais, 36;

Isaque Xavier Ribeiro, 37; Itallo Dias Alves, 25; José Filho de Jesus Silva Nepomuceno, 37; José Rodrigo Dama Alves, 33; Julio Cesar de Lira, 36; Luiz Andrpe Felisbino, 44;

Nunis Azevedo Nascimento, 33; Pietro Henrique Silva da Fonseca, 20; Raphael Gonzaga Silva, 27; Ricardo Gomes de Freitas, 34;

Romero Araujo Martins, 35; Thalles Augusto Silva, 32; Welington dos Santos Silva, 31; Zaqueu Xavier Ribeiro, 40.