CPI Prevent Senior: “Eles estavam matando as pessoas”

À Fórum, o presidente da Comissão, o vereador Antônio Donato, declarou que a rede, por conta de custos de internação, atuava com uma “preparação para a morte das pessoas”

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A CPI da Prevent Senior, instalada na Câmara Municipal de São Paulo no último dia 7 de outubro, ouviu nesta quinta-feira (29) o depoimento de quatro parentes de vítimas da Covid que foram se tratar na rede hospitalar que é investigada.

Os depoimentos, além de chocantes, revelam um modus-operandi que se repetiu com muito dos pacientes. Também traz à tona a questão do Kit Covid que era dado aos pacientes que, mesmo com sintomas de Covid-19 não eram internados, mas sim mandados de volta para a casa.

As histórias relatadas por Tomas Monge, Tercio Felippe, Gilberto Nascimento e Andreia Rotta, sobre via crucis que os seus respectivos parentes enfrentaram para serem tratados de maneira adequada – o que não encontraram – nos hospitais da Prevent Senior, são aterrorizantes, mas reforçam a tese e as suspeitas que pairam sobre a rede, de que havia um experimento com o chamado Kit Covid.

À Fórum, o presidente da CPI da Prevent, o vereador Antônio Donato (PT), declarou que os depoimentos foram “estarrecedores. Toda lógica nesses casos foi de evitar custos de internação e sugerir o chamado ‘cuidados paliativos’, uma preparação para a morte das pessoas. Criminoso. A CPI vai até o fim para apurar responsabilidades.

Abaixo destacamos alguns trechos dos depoimentos.

Tomas Monge

“Eu vim aqui contar a história da minha avó, Joana Navarro, uma senhora de 94 para 95 anos. No final de maio, inicío de junho ela começou a apresentar alguns sintomas de Covid. Primeiro ela apresentou uma febre leve… é bom destacar que alguns familiares que moravam com ela no mesmo domicílio tinham testado positivo para Covid e por causa disso a família resolveu levá-la para o hospital, porque ficou com bastante medo.

Ela foi para o hospital da Prevent Senior pra passar por uma consulta, nessa consulta, no Pronto Socorro, decidiram não interná-la, simplesmente prescreveram alguns remédios, entre esses remédios, eu não sei citar todos, mas tinha corticoide, tinha azitromicina e ela voltou pra casa. Na prescrição médica dizia para ela tomar esses remédios durante cinco dias. Após o cinco ou seis dias ela apresentou uma piora muito grandr, no nível de sufocar. Mediante a essa situação nós a levamos para um hospital de emergência, pois a gente percebia que ela estava sufocando

Chegando no hospital (unidade Brigadeiro), ainda assim houve uma certa resistência na internação. No momento, os familiares que estavam com ela falaram ‘não tem condição ela voltar pra casa, não tem condição nem de tratar e ajudá-la se precisar de algum auxílio. Aí ela foi internada e ficou alguns dias nessa unidade, depois foi transferida para uma ala de covid.

Ficou internada até o 14 e recebeu alta. No documento do hospital eles afirmaram que ela apresentou uma melhora clínica e laboratorial significativa para a alta dela. Ela saiu no dia 14 e no dia 15 ela voltou a passar mal, da mesma maneira que ela passou no dia 8. Ela voltou a apresentar dificuldade de respiração num nível de quase perder a consciência. Havia sido agendado um atendimento de enfermeiros (em domicílio) e eles pediram para remarcar. Ela foi encaminhada às pressas para o hospital. Chegando lá recebemos a notificação de que se tratava de um quadro irreversível

É muito estranho: como um dia antes você recebe uma alta dizendo que ela apresenta uma melhora significativa e em 36 horas ela apresenta um quadro irreversível? Infelizmente a gente acreditou nas palavras do hospital e ela foi encaminhada para o tratamento paliativo. Não sei nem se é esse o nome que a gente deveria usar, mas ela foi encaminhada para essa conduta. A minha mãe foi visitar a minha avó e para sua surpresa, ela não estava inconsciente. Ela reconheceu o meu pai, ela falou o nome dele, e pouco tempo depois. Logo depois ela recebeu o tratamento de morfina, pararam de fazer medição dos sinais. E também a alimentaçao, ela ficou em jejum.

Eu sou leigo, mas me parece muito estranho que, a partir do momento que você está fazendo um tratamento paliativo, você não tem nem alimentação. O mais cruel é que: nada do que possa ser feito vai trazer a minha avó de volta, nada do que possa ser feito vai tirar a dúvida da cabeça: a gente nunca vai saber se a minha avó tinha condições de lutar.

Ela faleceu no dia 18, no dia em que ela completava 95 anos e no atestado de óbito não há menção a Covid, só diz que ela teve uma síndrome respiratória aguda. A partir do momento em que ela não isso no atestado de óbito, é uma subnotificação e ela pode ser enterrada com cortejo, será que não estava sendo exposto um risco? Hoje eu e minha família temos mais dúvidas do que certeza e isso tem sido algo muito cruel”.

Gilberto Nascimento


A história de Nascimento já havia sido publicizada nas redes e, em entrevista ao Fórum Onze e Meia ele deu detalhes de como foi o tratamento que a sua mãe recebeu na Prevent Senior.

Em depoimento à CPI, além de relatar o que aconteceu com a sua mãe, ele também falou sobre as semelhança das histórias.

“Agradeço por estar aqui para poder relatar o caso de internação e morte da minha mãe Teresinha de Jesus em uma das unidades (Paraíso) da Prevent Senior. Fica evidente que era uma maneira de operar, havia uma prática, uma sistemática e todos os relatos são praticamente iguais. Tem uma diferença aqui e ali, mas todas as pessoas idosas, ao que parece, que deram entrada na Prevent Senior: a maneira de agir, de abordar, os relatos… eram todas tratadas iguais.

Nós nos sentimos completamente enganados. Nós, eu e as minhas irmãs chegamos a ter alguns pequenos atritos porque, e elas viam diariamente lá dentro do hospital da Prevent Senior, não batia em nada com o que o boletim médico dizia, além de outras inverdades e outros procedimentos absurdos e inadequados tomados pelo hospital.
Nós não aceitamos o tratamento paliativo, mas uma médica chamada Francesca escreveu de maneira mentirosa que a família havia concordado, isso logo no quarto dia de internação da minha mãe quando eles já queriam submetê-la aos cuidados paliativos.

A princípio nos confiávamos nos médicos da Prevent Senior, hoje, ouvindo todos os relatos, fica claro que era uma maneira inadequada e criminosa”.

Tercio Felippe

“Se o Supremo Tribunal Federal (STF) não tivesse determinado a abertura a CPI no Senado, nem vacina a gente teria nesse país. Nós ainda estaríamos lutando pela vacina. Fica aqui o meu agradecimento e fica a minha solidariedade a todos os familiares das vítimas da Covid aqui presente.

Eu gostaria de estar falando com o meu pai, ele foi uma vítima desses 'cuidados' da Prevent Senior. O meu relato é um pouco diferente dos demais depoentes, porque ele é antecedente a tudo. O meu pai (Tercio Felippe) foi acometido pela Covid em maio de 2020, no começo de tudo, quando, pelo menos nós, as famílias e os pacientes não sabíamos de nada. Nós não tínhamos conhecimentos algum sobre o que nós estávamos enfrentando. O que nós tínhamos era o pânico.

Quando o meu pai, no dia 19 de maio começou a ter sintomas nós ficamos preocupados e o encaminhamos ao hospital da Prevent Senior, da Rua Tamarataca (Brigadeiro) e de pronto ele foi internado e encaminhado para UTI Covid, antes mesmo de se fazer o exame de Covid, antes mesmo de qualquer outra providência.

Ali ele ficou internado por 4 dias e já foi prescrita a hidroxicloroquina e azitromicina. Três dias depois ele teve alta. Ele me ligou de dentro da UTI, ele pediu o telefone de um médico, ele tinha essa mania de encher a paciência até conseguir o que queria: 'filho, estou indo para o quarto e você vem me buscar, porque eu estou de alta.
No caminho, indo buscar o meu pai, o hospital me liga e confirmam que ele estava de alta, e eu perguntei 'escuta, e o exame de Covid?', 'O exame de Covid não deu nada. O que nós fizemos foi por precaução'.

Quando fui buscá-lo eles me deram um kit de medicamentos, todos envoltos em sacos plásticos. Disseram que uma enfermeira, durante o tempo do tratamento, iria aplicar os medicamentos desse kit. O que tinha nesse Kit? Azitromicina e Tamiflu. Ele estava sendo medicado para H1N1, sem confirmação da gripe suína e sem confirmação da Covid. A tomografia deu positiva para Covid, mas eles disseram para mim que ele não tinha isso.

Chegou em casa, três, quatro dias depois a saúde dele começou a cair, mas, caiu vertiginosamente. Hoje, analisando, eu vejo que a infecção afetou o neurológico dele, porque ele começou a não conseguir mais digitar para com a gente, falava molhe e uma hora ele desabou.

A gente o levava no PS da Prevent da Itamarataca, eles faziam hemograma e diziam 'seu pai não tem nada, ele está preguiçoso, alimenta ele que ele melhora’. Ele se arrastando, mal conseguindo falar, a Prevent mandava de volta pra casa. Isso aconteceu quatro vezes.

Em uma dessas vezes o médico falou a mesma coisa, que ele estava preguiçoso e precisava comer. Eu comprei uma marmitex e dei de comer para o meu pai dentro a enfermaria. E mais uma vez ele foi se arrastando para casa como "preguiçoso", como quem "não se cuidava direito".

No dia seguinte eu o levei novamente e nós fomos atendidos pela doutora Larissa e eu exigi que fizesse tudo correto, que se fizesse exame, porque era Covid. Até que a doutora Larissa Takahashi mandou fazer uma tomografia que mostrou que o pulmão dele já estava mais de 50% comprometido pela pneumonia viral.

Nesse momento, a doutora Larisse prescreveu, como protocolo interno da Prevent Senior, a Hidroxicloroquina. Chegou a perguntar para mim se podia? Eu autorizei, eu não sabia. E a médica não estava de acordo, senão ela não teria colocado "conforme protocolo institucional". Mas eu não sabia disso.

No dia 1 de junho ele foi encaminhado para um hosiptal que não era da Prevent, para o Adventista, onde ele ficou até o dia 25 de junho quando ele veio a falecer.

A Prevent tirou de nós a possibilidade de tratamento, tiro de nós a possibilidade de cura quando, ciente de que ele tinha Covid mandou para casa e se recusou a receber, em três oportunidades, ele de volta. Ele faleceu no dia de aniversário de 14 anos da neta dele.

Alguns dias depois eu recebo o telefonema de alguém de Secretaria de Saúde de São Paulo que perguntou: 'como enviaram o seu pai pra casa com o exame de Covid positivo?', opa, como assim positivo? O hospital me disse que era negativo. E eles me falaram: 'Não, eu tenho em mãos um exame do Albert Einstein que era positivo e eles mandaram ele pra casa'.

Até hoje a Prevent não me apresentou o exame de Covid que ele fez na primeira passagem pelo hospital.

Andreia Rotta

“Eu espero que a Justiça nos dê o mínimo de alento, porque depois de tanto sofrimento nós merecemos. Não é fácil reviver tudo o que vivi com o meu esposo, não é fácil me expor. Mas é insuportável me calar. As coisas foram tão abusivas que chegam a parecer mentiras.

O meu esposo (Fabio Seinas) tinha 51 anos, tinha acabado de fazer, no dia 9 março, ele faleceu no dia 28 de março. Era cardíaco, tinha três stencis, tinha pressão alta, tinha síndrome do pânico e depressão.

Por alguns meses me fizeram acreditar que eu estava cega, louca por causa do luto… perder o meu esposo com apenas 51 anos, dentro da Prevent Senior por conta de um Kit foi dilacerador, abusivo, indigno e desumano. Quando comecei a ouvir os relatós da CPI, confesso: tudo aquio que gritava no meu peito era real. E hoje eu afirmo: eu não estava louca. Quem ignora o que sente, toma decisões equivocadas, e eu tomei. Me calei por seis meses. Ignorei tudo o que passei e o que vi e o que presenciei. A vida passou e eu não.

Os olhos da minha alma estavam apodrecido por aquilo que eu não desejava ver: é lamentável que a grande maioria das pessoas coloquem a culpa de seus familiares na conta de Deus. Eu creio nele e creio que temos o livre arbítriol, o mesmo que a Prevent Senior usou com toda a sua potência medicando erroneamente e ignorando os sintomas do meu esposo e de outras tantas vítimas.

Dia 4 de março de 2021, por volta das 9 da noite meu esposo começou a sentir sintomas gripais. No dia 6, pela manhã, fomos ao pronto atendimento da Santa Maggiore em Santana, rapidamente ele foi atendido, não fizeram tomografia.

Fizeram o PCR e disseram que ficaria pronto em 72h e que ele voltasse pra casa tomando o Kit Covid. A gente saiu de lá com uma sacola verde, as medicações todas já embalada com as quantidades corretas do dia. As medicações eram: Azitromicina, Hidroxicloroquina, Ivermectina, Vitma C e uma proteína.
No dia 10 de março voltamos ao pronto atendimento e o meu esposo não estava bem. Começou a ter febre, falta de ar e queda de pressão (ele era hipertenso, pressão baixa para ele é algo surreal).

Fomos atendidos pela Doutora Isabela Freitas Chaves. Péssimo atendimento, nós que tivemos que sugerir tomografia, eletro, exames de sangue. E ela respondia as nosas suposições 'ah, pode ser', 'ah, talvez'. Ao sair o resultado da tomografia, ela (a médica) disse que estava com 25% de acometimento no pulmão e que era pouco, que ele voltasse pra casa e continuasse a tomar o Kit, afinal, 'aquilo era um curso natural da doença'. A gente deveria ficar sossegado que o Kit iria solucionar aquele mal estar.

Meu esposo só foi piorando: agora ele tinha diarreia, tontura, mais falta de ar e febre havia aumentado. Diziam que o mal-estar dele era por causa de falta de potássio, ele não conseguia ficar de pé, hoje acredito que seja por falta de oxigênio. No dia seguinte voltamos ao pronto atendimento e, dessa vez, eu já estava desesperada e implorei para que salvassem o meu marido.

Resolveram interná-lo e que seria levado para um hospital parceiro, chamado Presidente, porque eles não tinham mais leito algum. Dei um rápido Google e vi que as avaliações do hospital eram horripilantes, era tido como hospital de carniceiros. Avisei que não liberaria a transferência do esposo para o hospital Presidente.

Eu avisei que ia filmar o descaso deles com os pacientes, ele chamou os seguranças que tomaram o meu celular, devolveram depois que o vídeo já tinha sido apagado. Tudo isso sempre muito discretamente, sempre me encurralando para que a gente não fizesse escândalo, para abafar, eu não sei.

Comecei a gritar falando que eles estavam matando as pessoas e ninguém fazia nada. Nesse ínterim, uma enfermeira passou do meu lado e disse 'não deixa levarem o seu marido para o presidente, as pessoas estão indo lá só para morrer'.

Passados 15 minutos, uma enfermeira veio me avisar que eles tinham conseguido uma vaga na Prevent Senior do Jardim Paulista. Eu, ingenuamente, acreditei que ele estaria bem, afinal era o hospital referência da Covid. Para a minha surpresa não era o hospital que eu estava esperando, era um hospital de diagnóstico que foi transformado para receber pacientes com a Covid”.

Para que o seu marido fosse internado, Andrea foi obrigada assinar um calhamaço de papeis que autorizava o hospital a fazer qualquer procedimento, "incluindo a hidroxicloroquina".

Fábio Seinas faleceu no dia 28 de março, duas semanas após ser internado.

https://www.youtube.com/watch?v=Nair_b9Y7oo