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por René Dantas, especial para a Fórum
No mesmo momento em que, em Brasília, o presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro (PSL) era empossado nesta terça-feira (1º), milhares de pessoas, cidadãos vindos em caravanas de todas regiões do país, promoviam um abraço ao redor da sede da Polícia Federal, em Curitiba.
No ato de posse simbólica do ex-presidente Lula, os simpatizantes soltaram balões vermelhos enquanto desejavam “Lula Livre”. A ação, além de chamar a atenção para a condenação precoce de Lula, teve o intuito de reiterar que o ex-presidente ocupava o primeiro lugar nas intenções de voto na corrida eleitoral, como previam os principais institutos de pesquisa - DataFolha, IBOPE e Vox Populi -, quando os seus direitos políticos foram cassados pela justiça brasileira, contradizendo recomendação da ONU, o impedindo de ser candidato.
“Nós poderíamos estar em Brasília hoje, se você tivesse concorrido a presidência da república, na sua posse, porque você teria sido eleito, Lula. Nós sabemos o motivo de você estar aí. Você está aí para que não disputasse a eleição e não fosse o presidente dos brasileiros novamente. Por isso, estamos aqui!”, enfatizou, durante o ato, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT/PR), presidenta nacional do PT.
Ceia comunitária
A vigília promoveu uma ceia comunitária, no dia anterior, com a distribuição de mais de 4000 sanduíches de pernil, além de frutas, panetones e o famoso prato feito brasileiro (com arroz, feijão, farofa, couve e ovo cozido). Os alimentos foram recolhidos de doações de apoiadores e movimentos sociais, além da produção dos assentamentos do MST. O clima de solidariedade atingiu os arredores do bairro de Santa Cândida, com a distribuição das refeições aos moradores de rua e outros trabalhadores que passaram por ali, como os lixeiros em serviço durante a virada.
“A gente tem que promover toda a estrutura que é necessária para que as pessoas se sintam bem. Servimos de forma carinhosa, educada e solidária”, afirmou o professor Sérgio Ubiratan Alves de Freitas, nordestino e morador de Curitiba, membro da organização da vigília desde 7 de abril.
A vigília
A vigília sofreu transformações ao longo dos 271 dias de permanência. Nos primeiros 3 meses, cerca de 6000 pessoas acampavam ao redor da PF. Com o tempo, no entanto, houve considerável redução dos acampantes, principalmente depois de episódios com a justiça local, conflitos com moradores, ameaças, deslocamentos do acampamento e até ataques a tiros de autoria desconhecida.
Com a locação de um terreno particular em frente à sede da PF e o apoio de 5 casas na região, a organização conseguiu um rodízio de participação entre os apoiadores permanentes e uma estrutura para receber as caravanas dos estados, chefes de governo nacionais e internacionais, representantes de movimentos sociais, artistas e jornalistas.
É o caso de Nice Ometis, pela 6ª vez em caravana na vigília. ˜Eu tenho a missão de lutar por um mundo melhor, e Lula representa este mundo melhor por ser a esperança da democracia˜, explicou a professora mineira de 62 anos sobre o que a motiva a voltar ao acampamento. “Na história recente do Brasil, nós não tivemos um governo semelhante aos que foram os governos Lula. Houve uma mudança estrutural no país. A minha região, o Nordeste, é a prova disso. Por isso, a gente fala: existe o Brasil antes de 2002 e o Brasil depois de 2002, e isso é uma realidade. O Lula passou a ser a representação da possibilidade de um país diferente, menos desigual”, enfatizou Sérgio Ubiratan.
Apesar das festas de fim de ano, o clima da vigília é de apreensão sobre o futuro com a posse de Jair Bolsonaro. “Não sabemos o que eles podem fazer com a vigília a partir de 3 de janeiro”, diziam uns. “Não abandonaremos o presidente (Lula), custe o que custar”, gritavam outros. As dúvidas produzidas pelos discursos do novo Presidente da República, principalmente em relação ao cumprimento dos acordos democráticos e o respeito aos direitos humanos, assolam setores do país. Com a indicação do juiz responsável pela condenação do ex-presidente Lula, Sérgio Moro, como ministro da justiça e “chefe” da Polícia Federal, a vigília teme ser alvo de possíveis retaliações e perseguições políticas.