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A derrota da seleção brasileira de 1982, na Copa do Mundo da Espanha, representou o fim de uma Era e a inauguração de um período em que vencer a qualquer custo passou a ser o mais importante.
Por Lucas Vasques
Nem sempre as grandes vitórias são exaltadas ao longo da história do futebol. No entanto, derrotas imponderáveis e inesquecíveis povoam o imaginário dos torcedores, muitas vezes mais do que os triunfos. Pois bem. Nesta quarta-feira (5), faz 35 anos da chamada "Tragédia de Sarriá", quando a seleção brasileira foi eliminada da Copa do Mundo de 1982, na Espanha, ao perder para a Itália por 3 a 2. Poderia ser uma desclassificação normal, como muitas. No entanto, além de a equipe ser uma das melhores de todos os tempos, contando com craques do nível de Sócrates, Zico, Falcão, Júnior, Leandro, Éder, Cerezo, entre outros, representou a morte de uma Era, a chamada de futebol-arte. Como consequência, inaugurou-se um período de trevas em nosso esporte mais popular: o futebol de resultados, o pragmatismo ou, indo mais além, o futebol neoliberal, no qual vencer a qualquer custo é o que importa, priorizando esquemas defensivos em detrimento ao talento dos jogadores, que sempre foi a marca do nosso futebol.
A forma pela qual a seleção perdeu para a Itália representa bem esse cenário. Para avançar na competição, o Brasil precisava apenas empatar com a "Squadra Azurra", time bem inferior ao nosso, mas que contou com o iluminado atacante Paolo Rossi, em tarde mais do que inspirada. Ele se portou como verdadeiro verdugo e marcou os três gols do nosso rival. Aliás, foi ele quem inaugurou o placar. O Doutor Sócrates empatou, mas os italianos pularam novamente no marcador. E, assim, terminou o primeiro tempo, o que parecia antecipar a "tragédia". Depois de muita luta, Falcão, aos 22 minutos da etapa final, conseguiu o tão sonhado empate, o que nos daria a classificação.
Nesse momento entra em cena um dos personagens mais emblemáticos e responsáveis pela, até então, manutenção do futebol-arte: o técnico Telê Santana. Muitos críticos o responsabilizam pelo revés, argumentando que o empate já daria a vaga à seleção. Entretanto, Telê, convicto de sua filosofia de jogar de forma ofensiva, sempre em busca do gol, não recuou. Manteve o time à frente, com o objetivo de vencer. Parecia que ganhar não era o mais importante, mas, sim, preservar a tradição do futebol nacional. Resultado: em uma jogada isolada, de bola parada, novamente Rossi marcou e decretou o fim do título e do sonho de milhões de brasileiros.
Telê ainda permaneceria no cargo até a Copa de 1986, no México. Mas, já com um time mais envelhecido e sob a desconfiança de muitos críticos, a seleção também foi eliminada. As discussões que pautavam os programas esportivos à época giravam em torno da seguinte questão: vale a pena jogar bonito e ser derrotado ou o mais importante é ganhar a qualquer custo, mesmo utilizando um esquema tático pobre e covarde.
Para os cartolas que comandavam o futebol nacional, parece que prevaleceu a segunda teoria. O que se viu dali para frete foi um "show" de pragmatismo. A Copa de 1990, sob o comando do técnico Sebastião Lazaroni, teve na figura de Dunga, e o futebol brucutu, seu principal ícone: eliminados pelos pés mágicos de Maradona. Aliás, muitos consideram o Mundial seguinte, o de 1994, nos Estados Unidos, a redenção de Dunga e da seleção, que, enfim, conquistou o título. Mas, me desculpem os que pensam assim. Não vejo dessa forma. O técnico Parreira rezava na mesma cartilha de Lazaroni e de muitos treinadores, que passaram a dominar o cenário futebolístico nacional. Não havia mais prazer em assistir aos jogos do Brasil. A seleção de Parreira foi campeã, é fato. Encontrou a velha e conhecida Itália na final. E não é que ganhamos por 0 a 0 (nos pênaltis), a cara do Parreira e de seus seguidores.
Daí para frente, o que se vimos uma sucessão de erros e alguns poucos acertos. Contudo, o que ficou marcado mesmo é que nosso futebol nunca mais foi o mesmo desde 1982. Perderam-se os craques e evidenciaram-se esquemas táticos defensivos, feios e pragmáticos. Mas, apesar disso, felizmente, ainda há focos de resistência. A prova é que se colocarmos frente a frente as equipes de 1982 e de 1994, e fizermos uma enquete sobre qual foi a melhor seleção, a que deixou mais saudade, a inesquecível, enfim, a que representa mais o futebol nacional, não tenho dúvidas: a reunião de craques comandada por Telê Santana ganharia de goleada, assim como fazia na maioria das vezes em que entrava em campo.
Foto: Commons