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Sistema prisional do estado ganhou visibilidade com a chacina ocorrida em Alcaçuz no último fim de semana
Por Vinícius Castro, colaborador da
Nos últimos dias o Rio Grande do Norte ficou em evidência nacional e internacionalmente, quando seu principal presídio, Alcaçuz, vivenciou a maior e mais violenta rebelião da história do estado, que resultou em 26 assassinatos. Quase todos os mortos foram decapitados ou esquartejados.
A onda de rebeliões, orquestradas pelas grandes facções que dominam as penitenciárias brasileiras, já mataram juntas mais do que no massacre do Carandiru. Foram mais de 140 detentos mortos. Mais de 140 pessoas mortas e o que deveria causar comoção nacional é naturalizado.
O que ganha notoriedade é o discurso de ódio, como "era bandido, já foi tarde". O que não é falado com tanta veemência é que, por todo o país, os presídios estão lotados de réus primários, sem antecedentes criminais e sem envolvimento com facções criminosas.
Segundo pesquisa do Ministério da Justiça (Infopen), de 2006 para cá, boa parte do sistema carcerário é enquadrado na Lei de Drogas, que endurece penas para traficantes, mas retirou a punição de prisão para usuários. A principal arbitragem da lei é a falta de critérios objetivos para diferenciar o tráfico do uso pessoal, como a quantidade de drogas do flagrante, que colabora para o aumento na proporção de presos por esse tipo de delito.
Uma pesquisa do Núcleo de Violência da Universidade de São Paulo (USP), em 2012, apontou que em 62% dos casos de flagrante por tráfico de drogas no estado, a pessoa era presa com menos de 100 gramas de droga. E 80,6% dos detidos eram réus primários, sem antecedentes criminais e não possuíam envolvimento com nenhuma facção criminosa. A maior parte dos julgamentos acontecia 'palavra contra palavra': policial de um lado, acusado do outro, sem investigações prévias ou provas concretas.
O estudo do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) indica quadro semelhante no Rio de Janeiro: dos acusados de tráfico em 2013, 80% eram réus primários e 92,5% não portavam arma de fogo no momento do flagrante.
Segundo levantamento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, 2.901 dos 8.242 presos (35,2%) são provisórios, o que significa que são pessoas encarceradas, mas que ainda não foram julgadas pela Justiça do estado, não foram declaradas culpadas.
O maior presídio do estado, Alcaçuz, fica em Nísia Floresta, cidade da Grande Natal, possui capacidade para 620 detentos, mas abriga 1.150, segundo a Sejuc, órgão responsável pelo sistema prisional no RN.
A socióloga e ex-diretora do sistema penitenciário do Rio, Julia Lemgruber, do CESeC, disse em entrevista para o jornal Folha de São Paulo: “Ao colocarmos essas pessoas em presídios dominados por facções, estamos transformando infratores que não são perigosos em pessoas perigosas, Como a violência dos presídios vai para as ruas, o crescimento de sua população é um investimento em nossa própria insegurança”.
Entre os principais problemas do sistema carcerário, apontados no relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para o Supremo Tribunal Federal (STF), estão: superlotação, déficit de gestão, ausência de políticas de reintegração social (apenas 13% dos presos estudam e 20% trabalham) e a mortalidade dentro dos presídios, com surtos de tuberculose, sarna, HIV, sífilis e hepatite.
Apesar disso, a declaração do Secretário de Justiça do Rio Grande do Norte, Wallber Virgolino, para um jornal local é de que “presídio não é hotel e preso não é hospede. A gente tem que encarar preso como preso”. A frase foi dita em uma tentativa de justificar a retirada de ventiladores das celas. A temperatura média em Natal é de 30 graus no verão.
Em pesquisa sobre o perfil carcerário brasileiro publicada nesse mesmo jornal, 55% dos presos têm entre 18 e 29 anos; no Brasil essa faixa etária corresponde a 19% da população. Cerca de 62% do sistema prisional são compostos por pretos e pardos. E 74% das prisões por tráfico tinham como únicas testemunhas os policiais militares.
Foto: Agência Brasil