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Na última terça-feira (7) a Câmara Municipal de São Paulo aprovou a inclusão do “Dia de Combate a Cristofobia” no calendário oficial do município. O projeto agora seguirá para sanção do prefeito Fernando Haddad. A Fórum conversou com o autor do projeto, o pastor evangélico e vereador Eduardo Tuma (PSDB) e também com o vereador e militante católico Toninho Vespoli (PSOL) que, apesar de cristãos, expuseram duas visões completamente diferentes sobre o assunto. Confira
Por Victor Labaki
A Câmara Municipal de São Paulo aprovou na última terça-feira (7) a inclusão do “Dia de Combate a Cristofobia” no calendário oficial do município. O projeto (PL. 306/2015) de autoria do pastor evangélico e vereador Eduardo Tuma (PSDB) segue agora para sanção do prefeito Fernando Haddad.
A justificativa usada por Tuma é de que os evangélicos sofrem preconceito na sociedade. “O evangélico é perseguido e algumas vezes privado de direitos que são constitucionalmente garantidos: como a liberdade de pensamento, de expressão", afirma.
A falta de “liberdade de expressão”, segundo Tuma, se deve ao fato da bancada evangélica ser criticada ao condenar a população LGBT. O exemplo usado por Tuma para elaborar o projeto de lei foi a performance da atriz transexual Viviany Beleboni durante a parada LGBT de São Paulo em 2015.
“Na Marcha LGBT do ano passado um indivíduo agiu de forma desrespeitosa e afrontosa com o cristianismo, incitando inclusive o ódio contra o cristianismo fazendo uma encenação da crucificação e com objetos religiosos. Esse ano de igual forma, foram vestidos de forma inadequada com a bíblia. Ou seja, esse tipo de atitude pode, mas quando o cristão fala qualquer coisa em relação a prática da homossexualidade ele é condenado.”
Viviany desfilou crucificada para alertar sobre as agressões sofridas pela população LGBT e fazer críticas ao grupo de evangélicos que ocupam cargos políticos e formam uma frente parlamentar que barra qualquer projeto que visa diminuir a homofobia na sociedade brasileira. Como foi o caso do Plano Municipal de Educação (PME), em que os mesmos vereadores que aprovaram o "Dia de Combate a Cristofobia" rejeitaram o projeto original da Prefeitura de São Paulo que previa a discussão sobre discriminação por gênero no ambiente escolar e também a inclusão de aulas de educação e diversidade sexual na grade de disciplinas.
“Vou falar de religião quantas vezes forem necessárias”, disse Viviany
Durante a entrevista, Tuma falou que foi um dos vereadores que encabeçou a rejeição. “Eu fui um dos que, junto da frente que criei, a Frente Parlamentar Cristã em Defesa da Família, defendeu a extinção do termo gênero e a inclusão do termo sexo. No dia que eu fiz isso publicamente, recebi mais de 7 mil e-mails falando que eu era homofóbico, que eu não podia fazer isso. Tinha manifestação na porta da Câmara contra a minha atuação. (…) É uma tentativa de tentar calar a minha atuação.”
O que se passou com Tuma não foi nem perto do que Viviany sofreu depois de ter feito sua performance. Em um vídeo publicado nas redes sociais, a atriz conta que no dia 8 de agosto do ano passado estava voltando para casa quando dois rapazes a abordaram e começaram a falar insultos do tipo “Você está f...., isso não se faz” e “Você é um demônio, tem de morrer. Esses pastores estão certos”, relatou a atriz em uma entrevista para um portal de notícias. Na sequência os dois homens tentaram ferir Viviany com uma gilete. Ela conseguiu se desvencilhar dos agressores, mas acabou ficando com hematomas e cortes no rosto, no braço e na barriga.
Um relatório elaborado pelo governo federal mostra que em 2012 mais de 3 mil pessoas foram agredidas por motivações homofóbicas. Só no estado de São Paulo foram registrados 817 casos de violência contra a população LGBT. Dados divulgados pela Secretaria de Direitos Humanos do então Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos mostrou que em 2015 foram denunciados 252 casos de intolerância religiosa. Embora o relatório não mostre quais foram as religiões que fizeram as queixas, acredita-se que a maior parte das denúncias partiram de pessoas cujas religiões são de matrizes africanas.
Retrocesso para sociedade paulistana, diz vereador cristão
No entanto, o projeto de instituir um dia de combate a chamada “Cristofobia” é questionado mesmo por vereadores cristãos. Toninho Vespoli (PSOL), ligado a Teologia da Libertação, da Igreja Católica, criticou o projeto por acreditar que “Cristofobia” é algo que não existe na sociedade brasileira e classificou a iniciativa de Tuma como um “retrocesso para a cidade de São Paulo”.
“Só ver o nosso Congresso no dia de abertura de impeachment da Dilma e ver como os evangélicos se expressaram. Eu não vejo que as pessoas estão deixando de ter seus direitos na medida que você consegue implementar que igrejas não paguem impostos, você consegue implementar na Virada Cultural um palco que só toque música gospel ou que você tenha os evangélicos na Câmara dos Deputados fazendo seus cultos dentro de uma instituição que deveria ser laica", criticou.
Toninho também comentou a performance de Viviany usada por Tuma como justificativa para o projeto. O vereador do PSOL disse que as pessoas “precisam interpretar o que estava sendo falado ali”.
“Ela não quis fazer um desrespeito, ela quis mostrar que da mesma maneira que Cristo passou por aquele sofrimento, hoje quem está passando por isso são essas pessoas. E eu como cristão não tenho dúvida que se Cristo estivesse aqui, estaria do lado dessas pessoas que estão sofrendo na nossa sociedade, assim como ele andava com as pessoas que mais sofriam na época dele”, afirmou Toninho.
O professor Edin Abumanssur, do departamento de teologia da PUC-SP, disse que há, de fato, uma “reação ao comportamento da bancada evangélica”, mas que o projeto em si é uma “besteira”.
“Isso é uma besteira, imagina. Com 90% da população cristã, cristofobia de quem? Quem é o cristofóbico nesta história? É uma bobagem, mas dá para entender do ponto de vista político. Eles estão jogando para plateia deles.”
Abumanssur disse que diferenças entre a população cristã é algo extremamente comum: "Isso é um reflexo do próprio conjunto dos cristãos, existe muito antagonismo e muita diferença entre eles. Mesmo a bancada evangélica não é uma coisa homogênea, cada cabeça lá pensa de um jeito e responde a um tipo de público".
O projeto agora seguirá para a sanção do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad. Ele ainda não se manifestou se vai vetar ou confirmar a votação.