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Quando o mais fraco resolve não mais pagar a conta
Por Luiz Henrique Dias*
A semana começa com 600 escolas ocupadas no Paraná.
Exatamente o mesmo estado que, em 2015, viu seu Governador, o tucano Beto Richa, dar ordens para a Polícia Militar promover um verdadeiro massacre contra professores grevistas. Tudo com cobertura da imprensa nacional. Tudo às claras. Na porta do Palácio Iguaçu.
Os estudantes secundaristas paranaenses, assim como os de todo o país, protestam com pauta clara: contra golpe e seu programa, derrotado eleitoralmente, de desmonte do Estado Brasileiro, contra a PEC do ônus ao povo (e do benefício à minoria rentista), contra a entrega do petróleo brasileiro às tão conhecidas multinacionais de energia e, principalmente, contra à reforma “de cima pra baixo” do Ensino Médio.
Esta, imposta pelo Governo Temer de forma unilateral, por medida provisória, afronta diretamente o Plano Nacional de Educação (PNE), uma vez que retira deste seu caráter plural, fundamentado no diálogo entre os setores transversais que o compuseram, e pode levar o sistema educacional brasileiro a graves retrocessos, depois de anos de, ainda insuficientes, mas importantes avanços.
O que este governo ilegítimo denota, em todas as suas ações relacionadas à educação, é um projeto político que pretende, em curtíssimo prazo, retirar desta importante área qualquer caráter inclusivo ou perspectiva emancipatória.
Ainda, o enfraquecimento da ações de alfabetização de jovens e adultos, as mudanças em programas como Prouni, Pronatec, Fies e Universidade Sem Fronteiras, além dos dos cortes imediatos nas bolsas do CNPQ, evidenciam um ataque direto à tentativa de inclusão, no sistema educacional, dos muitos brasileiros que ainda se encontravam à margem dele.
E a exclusão do sistema educacional, sabemos todos, é a antessala de uma inserção débil, marginalizada, na vida social de um país onde a renda média dos que possuem ensino superior é, em média, 150% maior do que a dos que possuem somente ensino médio.
Além disso, a proposta de congelamento dos gastos primários da União (a PEC do Fim do Mundo) vai retirar, segundo especialistas em contas públicas, até R$ 400 bilhões da educação nos próximos anos.
Tais ataques ao Estado e aos pouquíssimos direitos, conquistados pelas classes trabalhadoras e pela maioria dos brasileiros nos últimos anos, estão servindo como um uma arma na mão do povo e um tiro no próprio ?é do Governo. É o caldo perfeito para o crescimento das ocupações e do sentimento de ilegitimidade do programa derrotado nas eleições de 2014.
Mas é preciso ir além.
Os secundaristas das escolas públicas, nascidos num ambiente propício à liberdade de expressão e filhos daqueles que melhoraram de vida durante as tentativas progressistas de Governo, precisam tomar as rédeas do futuro que lhes diz respeito.
Além de ocupar, devem - e estão fazendo - lutar pela melhoria da gestão escolar, pela autonomia de decisão nas unidades educacionais, pela ampliação do direito ao pensamento e não somente ao tecnicismo e pela garantia de um constante debate sobre questões como emprego, renda, economia e soberania.
Devem se posicionar contra o anacronismo do tal “Escola sem Partido”.
Devem, também, mostrar o quanto não deve ser o mais fraco o maior pagador da conta no país. O dinheiro não pode sair da educação para pagar juros da dívida, para gerar superávit, para alimentar os famintos rentistas. Precisam ser um estopim para esclarecer, informar, o povo brasileiro.
Este, por hora, permanece distante da luta, por estar consumido pela rotina, preso ao trabalho exaustivo e mal remunerado, e afundado no medo do desemprego e nas incertezas quando à assistência e à seguridade social. Ele não percebe, ainda, o quanto vivemos um momento crítico, onde as elites reivindicam novamente o controle do Estado.
Cabe dizer: sempre o tiveram. Mas como, por um momento, julgaram estar perdendo, querem agora marcar como definitiva sua posição hierárquica e vão utilizar, para tal, todo seu aparato repressivo e de comunicação de massa.
Os estudantes brasileiros, e isto é posto, parecem ser os primeiros a compreender ese jogo e sabem o quanto o golpe não foi somente político, mas também social. Tratamos aqui de luta de classes. Uma elite, a minoria, não pode se beneficiar do sacrifício e do futuro de toda uma nação.
*Luiz Henrique Dias é professor, escritor, gestor público e coordenador do Projeto A São Paulo que Queremos