Editorial: às ruas contra o partido da mídia

Ministro Paulo Bernardo dá entrevista às páginas amarelas de Veja e defende o seu "partido"

(Marcello Casal Jr/ABr)
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Ministro Paulo Bernardo dá entrevista às páginas amarelas de Veja e defende o seu "partido" O pronunciamento da presidenta Dilma Rousseff, ontem, apontou para muitas direções. Mas foi uma das raras vezes em que alguns temas essenciais para o país foram abordados em discursos oficiais da atual mandatária, como a reforma política e a necessidade de diálogo com os movimentos sociais. Estes que, até agora, tiveram um tratamento mais do que distante por parte do governo. [caption id="attachment_26089" align="alignleft" width="360"] (Marcello Casal Jr/ABr)[/caption] Pode ser o início de um ponto de virada no mandato da presidenta, mas tudo vai depender das ações concretas que serão tomadas daqui para a frente. Contudo, é impossível não notar uma lacuna no discurso de ontem. A democratização da comunicação, questão negligenciada em boa parte dos oito anos de Lula e que estagnou – ou regrediu – ainda mais na gestão Dilma. Para quem sentiu a ausência do assunto nas palavras da presidenta, a entrevista do ministro das Comunicações Paulo Bernardo à revista Veja foi mais do que um balde de água fria. É a certeza de que, se não houver uma mudança radical nessa área, a tendência é que o que já é ruim possa piorar. No abre da entrevista, Bernardo é apresentado como um “daqueles raros e bons petistas que abandonaram o radicalismo no discurso e na prática”. Na entrevista, talvez o principal trecho esteja no final, quando o repórter pergunta sobre por que razão “o seu partido insiste na defesa de medidas para controlar a mídia”. O ministro responde dizendo que “algumas pessoas acham que nós podemos fazer, por exemplo, regulação da mídia impressa”. Depois, segue: “Quando se fala nisso, é a militância que extrapola, e eu posso dizer que está errada, que está falando besteira. Se ela não gosta da capa da revista, da manchete de jornal, que que eu faça regulação. Isso não existe. Não vai ter regulação para isso”. Curiosamente, Bernardo cita o que a militância do seu partido “entende errado”, mas não faz questão nenhuma de falar sobre o que o seu partido e seus militantes “entendem certo”. São pontos como o monopólio dos meios de comunicação, a propriedade cruzada, o papel das teles, a luta pela diversidade informativa... Nada disso tem qualquer relação com “censura” da mídia impressa. Reduzir as demandas do PT, ou melhor, de boa parte da esquerda a isso é contribuir para a desinformação. Ou má-fé. Além disso, Bernardo faz questão de mostrar intimidade com a presidenta e, apesar de admitir ser cobrado por ela, cita um episódio trivial para ilustrar sua proximidade. Conta que Dilma o alertou para comprar um “presente bom” para o aniversário de sua esposa, a ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann. E diz ter comprado um colar de pérolas. Não é à toa que uma entrevista como essa tenha saído agora. A mídia tradicional não diz, mas a narrativa que ela conta sobre os protestos não a inclui como personagem. Foi ela, mídia tradicional, em várias manifestações pelo Brasil, hostilizada por grande parte das pessoas que foram às ruas. Em São Paulo, Veja foi xingada, a Globo também. Tanto que os repórteres da emissora saem para a cobertura sem seus cubos ou prismas nos microfones, ou então veem à distância os fatos por helicópteros. Os veículos tradicionais fingem que não, mas são alvo. E, quem diria, Paulo Bernardo faz as vezes de protetor. É preciso que se inclua, de forma urgente, a democratização da comunicação na pauta dos protestos, nas ruas e em todas as redes. Que se discuta, de forma saudável, como garantir a pluralidade de meios e de canais no Brasil. Sem pressão social, é certo que nada sairá dos gabinetes de Brasília nesse sentido. Caso o cenário não se modifique, nossa democracia continuará sem pernas. E sem voz(es).