Assentados sofrem ameaça de despejo e esperam que a presidenta Dilma Roussef desaproprie a área por interesse social
Por Felipe Rousselet, do SPressoSP
Na madrugada desta quarta-feira (23), 110 moradores do assentamento Milton Santos, localizado em Americana, interior de São Paulo, ocuparam o prédio do Instituto Lula, no Ipiranga. O objetivo dos assentados é a assinatura do decreto de desapropriação por interesse social pela presidenta Dilma Rousseff.
“Faz seis meses que sofremos uma ordem de despejo. Faz seis dias que a Justiça deu liminar para tirar as famílias de lá. Nós estamos assentados há sete anos, com construção, plantação e produção, estamos apelando para Deus e o mundo. Achamos que a Dilma não está ouvindo nossos apelos. Então, estamos tentando através do Instituto Lula, como tem parceria com ele, que ela venha ouvir nossos apelos, pelo desespero das famílias”, afirmou Roseana dos Santos, membro do assentamento Milton Santos.
O assentamento Milton Santos foi criado pelo Incra em 2005, a partir de um decreto de desapropriação por improdutividade. Porém, em maio de 2012, a família Abdala e a Usina Ester, antigos proprietários da área, recuperaram a posse na Justiça. As famílias que vivem e produzem no assentamento tem até o dia 30 de janeiro para desocupar voluntariamente a área.
[caption id="attachment_20992" align="alignright" width="300"] Famílias pedem que Lula intervenha junto ao governo federal para a manutenção do assentamento Milton Santos (Foto: Coletivo de Comunicação - Assentamento Milton Santos)[/caption]“É uma situação bem peculiar. Em 2005, o Incra chama essas famílias para essa gleba. Elas estavam acampadas em outro local, cadastradas, e o Incra as chama para a gleba em Americana com a promessa da área ser transformada em assentamento. A promessa era a seguinte: essa gleba pertence ao INSS e o INSS iria transferir a propriedade ao Incra, que transformaria a área em assentamento”, explica Vandré Paladini Ferreira, advogado das famílias do assentamento Milton Santos.
De acordo com Ferreira, o governo federal não desapropriar a área gera prejuízos aos cofres públicos, uma vez que a União investiu mais dinheiro no assentamento do que o valor de mercado do local. “O governo alega que não tem dinheiro para fazer uma desapropriação por interesse social lá. O valor de mercado foi avaliado em R$ 1,8 milhão, menos do que foi investido pelo governo no próprio assentamento. Deixar que o assentamento seja destruído é uma prática política contra o próprio erário público. O governo investiu dinheiro em um lugar que ele vai deixar ser destruído”, afirma.
Para Ferreira, a única solução viável para a manutenção do assentamento é a presidenta Dilma Rousseff assinar o decreto de desapropriação por interesse social, uma vez que se esgotaram todos os recursos judiciais para reverter a decisão de reintegração de posse.
O maior temor dos assentados é que, terminado o prazo de 30 de janeiro, ocorra uma desocupação com o uso da força policial, como foi o caso da reintegração de posse da ocupação do Pinheirinho, em São José dos Campos.
“A gente ainda está com aquelas imagens do Pinheirinho, não sai da cabeça dos trabalhadores. O que a gente viu no Pinheirinho foi um massacre, e lá também tiveram promessas verbais para solucionar a questão. Nós não queremos promessas verbais, queremos atitude. Atitude é assinar o decreto de desapropriação e a gente poder ficar em paz no assentamento”, declarou Paulo Albuquerque, integrante da coordenação do assentamento Milton Santos. [caption id="attachment_20996" align="alignleft" width="300"] Assentados não estabeleceram um prazo para deixar o Instituto Lula (Foto: Coletivo de Comunicação - Ocupação Milton Santos)[/caption]
Albuquerque afirmou ainda que a ameaça de despejo está prejudicando a produção do assentamento, que fornece alimentos para toda a rede municipal de ensino de Americana. “O assentamento entrega alimentos para doze mil famílias e para a merenda escolar. Por causa desses seis meses que estamos em luta, estamos com dificuldades para honrar estes compromissos. E agora é a hora de plantar. Se não resolver isso logo, a gente vai perder o tempo de plantar”, disse.
As famílias do assentamento Milton Santos esperam que o ex-presidente Lula interceda publicamente junto à presidenta Dilma Rousseff para que ela assine o decreto de desapropriação por interesse social.
“Ele [Lula] é uma liderança popular, elegeu a Dilma, fez o assentamento e o partido dele governa o país. Ele tem que marcar uma audiência com a Dilma e pedir para ela imediatamente assinar esse decreto. Estamos fazendo um apelo para o ex-presidente Lula para que ele intervenha na situação, mas intervenha publicamente, que faça as pessoas ficarem sabendo”, declarou Albuquerque. “O relógio já está contando, nós não confiamos na polícia, não confiamos no governo de São Paulo. O que aconteceu no Pinheirinho todo mundo sabe”, completou.
Segundo o advogado do assentamento Milton Santos, não existe uma previsão para as famílias deixarem o prédio do Instituto Lula. “Dura até a gente conseguir o que a gente quer [assinatura do decreto de desapropriação por interesse social]. Estamos dispostos a ficar aqui até quando for preciso”, frisou Ferreira.
A assessoria de imprensa do MST esclareceu que não participa da ocupação na sede do Instituto Lula. De acordo com nota divulgada para a imprensa, os protestos realizados pelo MST "têm como orientação geral denunciar os verdadeiros inimigos da reforma agrária, como o agronegócio, o latifúndio, o Poder Judiciário e a imprensa burguesa e pressionar os órgãos de Estado para que façam a Reforma Agrária". O MST ainda esclarece que "o Movimento tem pressionado o governo federal e acompanhado o trabalho do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e da Advocacia Geral da União (AGU) para comprovar a posse da área e impedir o despejo". Segundo a nota, o presidente do Incra, Carlos Guedes, fará uma audiência com o MST nesta quinta-feira (24), às 17h, para informar as iniciativas do órgão para resolver a situação das famílias.
De acordo com o assessor de imprensa do Instituto Lula, José Crispiniano, o instituto acompanha com muita tranquilidade a ocupação e busca uma solução junto aos assentados. Crispiniano enfatizou que não houve nenhum ato de depredação no prédio.