Estive em Lima na semana passada para um evento paralelo à COP 20 e celebro a assinatura de um acordo porque qualquer acordo é melhor que acordo nenhum.
Sim, existem problemas com o acordo de Lima, mas deixar cada país escolher suas próprias metas não é o maior problema. Trata-se na verdade de um avanço, porque permite que cada nação se empenhe para diminuir as emissões de carbono dentro dos seus limites socio-político-econômicos, sabendo que existe a pressão para reduzir cada vez mais. Esta pressão não vai diminuir e o acordo dos EUA com a China veio em boa hora.
Acontece que o discurso precisa ser seguido pela prática. Quando a China promete que vai reduzir emissões de carbono, quem acredita? Quando os EUA prometem reduzir emissões, com este congresso atual (bancado em alto grau pelo lobby do petróleo) fazendo tudo para cortar o financiamento de energia limpa, quem acredita? A pressão virá quando começarmos a ver resultados práticos efetivos.
Também foi um avanço inserir no acordo uma cláusula que deixa claras as responsabilidades diferentes. Países desenvolvidos chegaram ao nível atual queimando muito carbono e devem carregar esta responsabilidade, o que foi colocado pela primeira vez no texto final de um acordo climático.
Nesta questão a liderança brasileira tem sido fundamental. O embaixador José Antônio Marcondes, negociador chefe da missão brasileira, fez uma excelente apresentação na sessão sobre mudanças climáticas e direitos humanos, da qual eu participei. No discurso do diplomata brasileiro ficou claro o foco na redução das desigualdades e na proteção às comunidades mais vulneráveis ao aquecimento do planeta. Quando o atual governo brasileiro fala de redução de desigualdade e proteção aos mais pobres, o mundo todo (e principalmente a América Latina) escuta. Mas quando o Brasil fala de desenvolvimento sustentável soa como os EUA falando em diminuir a dependência do petróleo ou a China prometendo queimar menos carvão. Discursos completamente descolados da prática.
Interessa aqui perceber que temos no presente uma oportunidade única. A revelação de irregularidades quase que permanentes nos contratos da Petrobrás vai certamente forçar os três poderes a propor algo que funcione melhor. O governo Dilma, até aqui absolutamente identificado com o desenvolvimentismo e sua implementação pelas empreiteiras, poderia usar a crise atual a seu favor e mudar não só os meios mas os fins das grandes obras públicas no Brasil.
Temos tecnologia e conhecimento para fazer obras que gerem empregos, energia, renda e que ao mesmo tempo regenerem o meio ambiente. Com a transposição do São Francisco, por exemplo, se usarmos a água não apenas para monoculturas, mas também para regenerar ecossistemas danificados, podemos capturar milhões de toneladas de carbono. E os próximos aeroportos a serem ampliados, se usarem pavimentação permeável nos estacionamentos e bacias de retenção de água entre as pistas, podem ajudar a devolver ao subsolo milhões de litros de água. Quanto custa colocar captação de água de chuva e painéis foto-voltáicos no Minha Casa Minha Vida? Energia solar e captação de água não deveriam ser prioridades no país, e, portanto, terem crédito subsidiado do BNDES?
Nas palavras do ministro Antõnio Herman Benjamin do STJ, catalizador desta sessão de que perticipei em Lima, precisamos “climatizar” as políticas públicas brasileiras, ou seja, colocar a variável "clima" em cada decisão a ser tomada. Temos todos os instrumentos para isto, do Itamaraty ao Ministério Público, passando por milhares de pesquisadores e de empreendedores prontos para criar um pais mais sustentável.
O país que mostrou ao mundo como reduzir desigualdades pode também mostrar ao mundo como se desenvolver regenerando o meio ambiente.
Foto: Presidência do Peru