Tadeu Porto: Minha trajetória como petroleiro e a de Castello, ex-Vale e atual presidente da Petrobras

Já vi, vivi e ouvi muita coisa nessa década de Petrobrás. Talvez seja por isso que a gestão da empresa tente, junto ao TST, me fazer "responsável e solidário" a essa greve histórica que estamos fazendo.

Tadeu Porto (Reprodução/Facebook)
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No 16° dia de Greve Nacional dos Petroleiros já são 20 mil petroleiros paralisados em 116 unidades do sistema Petrobras: 57 plataformas, 11 refinarias, 23 terminais, 7 campos terrestres, 7 termelétricas, 3 unidades de tratamento de gás (UTG), 1 usina de biocombustível, 1 fábrica de fertilizantes, 1 fábrica de lubrificantes, 1 usina de processamento de xisto, 2 unidades industriais, 3 bases administrativas aderiram à greve.

Já é a maior greve da categoria desde a histórica greve de 2005, que durou 32 dias.

Os petroleiros têm como pauta: a suspensão imediata das demissões na Fafen-PR, o cancelamento da nova tabela de turno que foi imposta pela gestão aos trabalhadores das unidades operacionais, o restabelecimento das negociações para solução dos pontos do Acordo Coletivo que estão sendo descumpridos sistematicamente pela direção da Petrobras.

A Petrobras, que afirma que a greve não afetou a produção, pediu ao TST que os cinco integrantes da Comissão Permanente de Negociação da Federação Única dos Petroleiros (FUP), que desde o início da greve ocupam uma sala do prédio Edise no Rio de Janeiro, fossem responsabilizados pessoalmente. No entanto, o ministro Ives Gandra Martins não acrescentou novas sanções aos funcionários e negou na última sexta-feira (15/02) o pedido da Petrobras para a “responsabilização pessoal e solidária” dos cinco petroleiros da FUP.

No texto a seguir, Tadeu Porto, diretor da FUP e um dos integrantes da Comissão Permanente de Negociação, que ocupa uma das salas do Edise desde 31/01-, compara a sua trajetória de petroleiro e sindicalista com a do presidente da Petrobras e reflete sobre responsabilidades, considerando que Roberto Castello Branco foi diretor financeiro da Vale, antes de assumir a presidência da Petrobras.

Conheça ambas as trajetórias e avalie quem deveria estar na Justiça sendo responsabilizado pessoal e solidariamente.

Sobre trajetórias e responsabilidade

Por Tadeu Porto, no site da FUP

Certa vez, na primeira plataforma que embarquei na vida, presenciei, in loco, uma tubulação estourar e vazar muito gás. Era uma linha ligada ao "slop vessel" no Cellar Deck da unidade. Me lembro de como o supervisor do turno, como um raio, entrou na densa nuvem de gás e fechou a válvula que alimenta o vazamento. Ele não poderia ter feito isso, mas fez. Se tivesse alguma ignição, iria ele, eu e talvez a plataforma para o fundo do mar, como foi a P36.

Esse supervisor, chegou a virar coordenador, contudo não aguentou o assédio e saiu da empresa. A última vez que falei com ele, numa assembleia em Imbetiba, vi sua desmotivação enquanto me falava de sair do país.

Também vi sair da Petrobrás outro companheiro, um dos melhores cipistas que já presenciei. Ele tinha todas as pendências da P48 num caderno e queria resolver todos os problemas da plataforma. Dava gosto de ver ele atuar.

Uma vez ele me ligou pra informar um grande incêndio na unidade e me disse num tom de voz que misturava orgulho, alívio e medo: "todo mundo desceu pra combater". Foi um dos maiores incêndios dos últimos tempos, a equipe combateu durante horas e horas chamas lambendo a lateral da plataforma.

Falando em fogo, me recordei, com tristeza, de outro compa. Esse teve a perna esmagada por uma mangueira de incêndio ano passado. Ele é jovem, entrou no mesmo concurso que eu em 2010, e nunca mais terá a mesma mobilidade de antes.

Das lembranças que marcam, a mais forte é a do Sandro, o guindasteiro de PNA2 morto em um acidente de trabalho a bordo. Um dos momentos mais difíceis que vivi no sindicato. Sandro morreu "sugado" por um cabo, teve o corpo partido ao meio e ficou mais de 24h enroscado junto com o cabo no tambor do guindaste.

Já vi, vivi e ouvi muita coisa nessa década de Petrobrás. Talvez seja por isso que a gestão da empresa tente, junto ao TST, me fazer "responsável e solidário" a essa greve histórica que estamos fazendo.

Não entendo de direito e leis, sou operador de produção e não advogado. Mas me parece bem descabido colocar multas milionárias, nunca antes aplicadas na Justiça do Trabalho, junto a um CPF assalariado e CLTista.

O presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, disse na GloboNews que nenhum barril foi afetado pela greve. E mesmo assim quer nos processar.

Me lembrar dessa década, me fez pensar justamente na trajetória recente do Castello. Ele passou mais tempo no financeiro da Vale do que eu tenho de Petrobrás. Saiu da mineradora um ano antes do desastre de Mariana, tragédia que culminou na morte de dezoito pessoas e no desaparecimento de uma.

Minha alma de ferro itabirana e minha experiência sindicalista, me fazem querer entender. Acho que, talvez, Castello tenha economizado além da conta enquanto diretor financeiro da Vale. Acho que ele deveria ter investido mais em saúde, segurança e meio ambiente e pagado menos a acionistas. Se fosse assim, sua política poderia ter evitado essa e outras tragédias, como a de Brumadinho, uma grande tragédia ambiental e o maior acidente de trabalho da história do país, com mais de duzentas mortes confirmadas.

Mas não sei, não sou operador do direito, sou operador de produção. Sou também cidadão e achava, assim, que as mortes causadas pela Vale deveria ter mais atenção da Justiça do Trabalho que uma greve que "não afeta nenhum barril de petróleo".

Há trajetórias e, com elas, responsabilidades. A vida tratará de demonstrar as ligações lógicas entre essas. Hoje em dia, ocupando uma sala no Edise, minha consciência tranquila me faz dormir bem, mesmo que seja no chão que Castello pisa.