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Os dados do Ministério do Desenvolvimento Social sobre o Cadastro Único e o Bolsa Família (clique aqui para ler) demonstram como as desigualdades de oportunidades do racismo fazem coincidir o perfil social e racial. Segundo o relatório do ministério de 2011, tendo como base os dados encaminhados pelos Centros de Referência de Assistência Social, 69,5% dos cadastrados no Cadastro Único são negros. Entre os beneficiários do Bolsa-Família, o percentual de negros sobe para 73,7%.
Cadastro Único e Bolsa Família não é a mesma coisa. O Cadastro Único é um sistema que credencia famílias com uma renda per capita de até meio salário mínimo e renda total de três mínimos. Possibilita aos cadastrados neste sistema, o acesso a um conjunto de políticas públicas como o próprio Bolsa Família, Tarifa Social de Energia Elétrica, isenção de taxa para concursos públicos, Pronatec, telefone popular, programas habitacionais populares, entre outros. O Cadastro Único é realizado nos centros de referência de assistência social e os seus dados são sistematizados nacionalmente, permitindo assim que se tenha um diagnóstico sobre a pobreza e as vulnerabilidades sociais no Brasil.
Alguns dados no relatório de 2011 chamam a atenção: mais de 50% dos beneficiários tem menos de 24 anos; em torno de 60% possuem apenas o ensino fundamental incompleto. Das famílias cadastradas no Cadastro Único, 90,3% são chefiadas por mulheres e 9,7% por homens. Entre os beneficiários do Bolsa Família, 93,1% tem a mulher como principal responsável. Dos responsáveis pelas famílias beneficiadas, 69% são negros e 30% brancos.
Cruzando dados
É possível fazer alguns cruzamentos destes dados com outros indicadores sociais. Um deles é o da evasão escolar. Segundo estudo realizado pela Unicef em 2009, dos 51 mil adolescentes brasileiros que nunca foram a escola, 29 mil (56,87%) são negros. Os adolescentes de 15 a 17 anos representam 42% das crianças e jovens que estão fora da escola. O perfil destes excluídos da educação bate com o do cadastro único: famílias com renda inferior a 1,5 salário mínimo e chefiadas por mulheres negras e jovens.
Os dados oficiais mostram que o grande gargalo do sistema educacional brasileiro atualmente é o ensino médio. A escolaridade média do jovem brasileiro está em torno de 7,8 anos, portanto inferior ao período previsto para o ensino fundamental (9 anos). De acordo com o Censo Escolar de 2010, dos 9,4 milhões de jovens de 14 a 17 anos (idade prevista para estar no ensino médio), apenas 8,4 milhões estavam matriculados no ensino médio (89,37%). Dos matriculados, pouco mais da metade (50,2%) concluem e, de acordo com as avaliações do MEC, apenas 10% dos que concluíram demonstram ter o conhecimento esperado neste nível de ensino. A importância desta fase dos estudos pode ser sintetizada pela fala da dirigente do Centro de Estudos e Memória da Juventude, Fabiana Costa: “A fase do ensino médio é crucial para ganhar ou perder a geração. Ali são apresentadas várias experiências aos adolescentes. Ele pode se tornar um ótimo cidadão pelas décadas de vida produtiva que tem pela frente ou cair na marginalidade”.
Desafios
As políticas públicas de assistência social dos últimos governos têm impacto significativo nas famílias negras. O fato da esmagadora maioria dos seus beneficiários ser mulher, negra e jovem evidencia os mecanismos de opressão social do Brasil. O racismo e o machismo atuam como sistemas de opressão combinados gerando este perfil de exclusão.
Ao mesmo tempo, tais políticas evidenciam os gargalos institucionais que precisam ser enfrentados para que se caminhe para a constituição plena da equidade social e da igualdade de oportunidades. Os perfis se assemelham: jovens negros são os maiores beneficiados pelo Cadastro Único e Bolsa Família (portanto, são os que estão na faixa da pobreza extrema), são os que estão excluídos do sistema escolar e também compõe o perfil dos que estão sendo exterminados fisicamente nas periferias, conforme demonstram os dados da campanha contra o genocídio da população negra.
Como estão se discutindo as políticas educacionais nos Estados e municípios; quais têm sido os investimentos na educação; as prioridades; como está se discutindo as políticas de promoção de direitos humanos; quais são as concepções presentes nos organismos de segurança pública; quais são as concepções presentes sobre as relações de gênero, a paternidade responsável, a precarização do trabalho feminino e a resultante disto, a feminização da pobreza – enfim, os mecanismos em que as opressões múltiplas de raça e gênero que transformam a mulher negra e jovem no segmento mais vulnerabilizado da sociedade brasileira.