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Desde que a presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Judith Brito, declarou que o papel da imprensa é agir como oposição ao governo (federal, bem entendido), a mídia hegemônica tem abandonado completamente os fundamentos básicos do jornalismo, subordinando-os quase que completamente a uma militância política. Rigor na apuração, critérios os mais objetivos possíveis de construção das pautas e das manchetes, isenção na cobertura de eventos políticos que envolvem, necessariamente, polêmicas partidárias e ideológicas – tudo isto foi abandonado pela auto-decretação de ser oposição ao governo federal.
Para demonstrar esta ideia, cito dois casos emblemáticos que podem ser classificados como verdadeiras aulas de antijornalismo. Primeiro, o caso da suposta entrevista do publicitário Marcos Valério que diz que Lula sabia do caso do mensalão, numa clara tentativa de envolver o ex-presidente em um momento que a sua popularidade tem auxiliado candidatos petistas em eleições municipais e que o mesmo é um fortíssimo candidato a voltar à presidência da República.
A matéria que ganhou capa na edição passada da revista Veja – e foi repercutida por Globo e Folha de S. Paulo, repetindo o tripé base do partido midiático – foi produzida sem qualquer apuração aparente. O advogado de Marcos Valério disse que o seu cliente não concedeu entrevista nenhuma, a própria revista diz que a matéria não foi produto de entrevista, mas de “conversas” do publicitário com terceiros a que a publicação teve conhecimento (!) e depois circula-se o boato de que o publicitário tenha dado a entrevista mas depois se arrependeu, a revista teria o áudio e ameaça divulgá-lo.
O mais interessante deste caso é a repercussão nas redes sociais entre profissionais mais ativos desta militância midiático-oposicionista: Ricardo Noblat, Merval Pereira (o mesmo que foi pego em documentos do WikiLeaks como uma “fonte” da embaixada dos EUA nas eleições presidenciais brasileiras) e Cristiana Lobo. A publicação da matéria, a sua repercussão em redes sociais e colunistas, bem como em outros meios de comunicação deixou bem nítida tratar-se de uma operação de cunho puramente ideológico e militante, como bem analisa Marco Aurélio Weissheimer neste artigo.
O segundo caso ocorreu na Folha de S. Paulo e portal UOL (da mesma empresa) no dia 15/09: a manchete "Haddad diz que é degradante ser ligado a Dirceu, Delúbio" e Maluf (portal UOL) e, um pouco mais sutil, a "Haddad diz que associá-lo a José Dirceu é degradante" (Folha de S. Paulo). Ao ler a manchete, fica a impressão de que o candidato petista declarou publicamente que é degradante associar-se às pessoas mencionadas. Mas o fato é outro: trata-se de uma ação do comando da campanha petista contra a propaganda do candidato do PSDB, cuja argumentação da qual foram tiradas as manchetes acima é: "A publicidade é manifestamente degradante porque promove uma indevida associação entre Fernando Haddad e pessoas envolvidas em processos criminais e ações de improbidade administrativa".
Primeiro que não foi o Haddad que disse e sim uma petição do advogado da campanha; segundo que o adjetivo degradante está vinculado a estratégia publicitária questionada por se basear em uma INDEVIDA associação. Na sequência da argumentação, o questionamento da assessoria jurídica da campanha de Haddad afirma que o candidato não é réu nas ações que envolvem as personagens citadas, não as nomeou para cargo algum e também compara se seria correto a associação do candidato José Serra ao seu correligionário Marconi Perilo, governador de Goiás, envolvido no escândalo de Carlos Cachoeira.
Ora, a manchete de uma matéria como essa deveria se centrar no fato que é o questionamento de Haddad com a campanha de Serra ou até mesmo a negação do juiz eleitoral do pedido do candidato. Há um claríssimo objetivo na manchete de criar uma celeuma interna no PT e na coligação que sustenta o candidato petista. Ou ainda reforçar a estratégia tucana de colocar o caso do mensalão como um elemento central na disputa eleitoral.
O mais grave de tudo isso é que esta militância midiático-oposicionista eclipsa um debate de ideias alicerçado em fatos e dados e transforma o embate eleitoral em um combate irracional de “torcidas”. Basta ver os comentários de leitores e visitantes dos sites destes órgãos como a coisa se desenvolve: as opiniões se centram na desqualificação do outro e não proposição de ideias. Disto para posições extremistas e preconceituosas é um pulo – aí não é estranho surgirem pessoas como Mayara Petruso (aquela aluna da FMU que propôs acabar com os nordestinos) ou a candidata tucana Dany Schwery (já comentada pelo meu amigo Renato Rovai neste post). É esta a “contribuição” para a democracia que a mídia hegemônica vem prestando.