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A 66ª Assembleia Geral da ONU teve um simbolismo duplo: foi aberta, pela primeira vez, por uma mulher, a presidenta Dilma Roussef. Na sequência, o segundo a discursar foi um negro, o presidente Barack Obama, dos EUA. O órgão maior das nações unidas abertos por uma mulher e um negro, justamente grupos sociais dos vitimizados dos processos de violência e miserabilização no planeta em toda a história.
Mas comparando os discursos, percebe-se a diferença ideológica. Enquanto a presidenta Dilma, apoiada por uma coalizão progressista, fez referências claras a discriminação de gênero, lembrando a subalternização social das mulheres no mundo; o presidente estadunidense não fez qualquer menção a questão étnica pois ele só está lá – e continua no poder da maior superpotência do planeta – porque abriu mão de qualquer discurso de afirmação racial.
E o discurso da presidenta, dentro dos limites de um discurso governamental em um órgão internacional e com todos os cuidados de espaços diplomáticos, tocou nas questões essenciais do mundo contemporâneo: a ausência de regulação dos fluxos dos capitais especulativos, a necessidade do reconhecimento do Estado da Palestina, a reforma do Conselho de Segurança da ONU, tudo apontando para a necessidade da construção de uma ordem internacional mais equilibrada.
Li as coberturas do discurso da presidenta Dilma nos portais. Tirando a turminha facistóide da revista Veja, entre eles o provocador Reinaldo Azevedo (que insiste em querer que o país continue com o complexo de vira-lata rodrigueano chamando a postura altiva do país de “megalomaníaca”), a maioria dos comentaristas do PIG foi até respeitosa. Ficaram um tanto preocupados com o apoio explícito do Brasil à criação do Estado palestino, principalmente após Obama, na sequência demonstrar sua oposição – porém esta posição anti-palestina anda tão desgastada ultimamente que somente um pensamento absurdamente conservador (Reinaldo Azevedo considerou a posição brasileira de “irresponsável”) explicitamente se coloca contra. A crise entre Israel e Turquia motivou até um editorial contrário ao governo israelense do insuspeito jornal O Estado de S. Paulo.
Interessante foi que a maioria dos analistas do PIG passou ao largo, ou minimizou, a fala da presidenta Dilma contra a farra do livre fluxo dos capitais especulativos, culpando este modelo pela crise internacional e apontando para a necessidade de uma regulação. Colocou a necessidade de se articular desenvolvimento com distribuição de renda e fez duras críticas aos países desenvolvidos, comparando as taxas de desemprego de lá com as daqui. Com isto, sustentou a ideia da necessidade de uma nova governança global que passa pela reforma do Conselho de Segurança da ONU. Em outras palavras, o discurso da presidenta apontou para a falência do modelo neoliberal – aquele mesmo projeto que foi comprado pela mídia hegemônica nos anos 90 como o “redentor” do mundo – e, mesmo sem apresentar uma proposta alternativa ou uma saída m ais radical, demonstrou a necessidade de se repensar a atual ordem mundial. E nesta nova ordem, a presidenta foi clara em dizer que o Brasil não está para ser vira-lata.