Já era de se imaginar que as mulheres ficariam sobrecarregadas no período de isolamento social em decorência do novo coronvírus, sugerido pela OMS e por todas as organizações e governos sensatos do planeta.
Considerando que as mulheres já trabalham, em média, 7,5 horas a mais do que os homens, a famosa dupla jornada, que engloba tarefas domésticas e trabalho remunerado, não seria diferente em um isolamento, especialmente para as mulheres que têm filhos. É bom lembrar que apesar da taxa de escolaridade das mulheres ser mais alta, a jornada também é. Importante ressaltar que, segundo o Ipea, entre 1995 e 2015, a população adulta negra com 12 anos ou mais de estudo passou de 3,3% para 12% - mesmo patamar que os brancos já tinham em 1995. A população branca com tempo de estudo igual ao da negra dobrou nesses 20 anos.
Durante esse período de pandemia e quarentena, as mulheres estão à beira do colapso - e ainda estamos no começo, ou ainda nem estamos no começo. Os chefes repetem que a produtividade deve seguir e até dobrar nesse período, enquanto algumas mulheres precisam se desfolhar em mil com crianças em casa e suas tarefas de escola. Quem aguenta trabalhar, fazer tarefas domésticas e ainda praticar o romantizadíssimo homeschooling, ou ensino à distância, elogiado pelo presidente?
"Quinta passada eu contei, em segredo, quantas vezes eu levantei da mesa para resolver algo que a criança estava pedindo/fazendo e quantas vezes ele levantou", contou uma mãe, que prefere ficar anônima. "Eu levantei 23 vezes, e ele, 7, e ainda fala para todo mundo que estamos dividindo o cuidado da casa".
"Um verdadeiro inferno", escreveu outra mulher, que também pediu para não ter o nome publicado. "Tenho 2 meninas e moro com o pai da caçula, os dois estão de home office, mas adivinha quem precisa terminar o trabalho a noite, só quando as crianças dormem? Aliás, a minha caçula tem 1 ano e o dormir dela se resume a 2h de sono e acordar de vez as 5h30 da manhã", desabafou ela. "Além disso, preciso parar pra dar banho, remédio, fazer e dar a comida, colocar pra dormir porque meu ilustre conge não consegue fazer nenhuma dessas tarefas sozinho. Essa quarentena só escancarou o que já estava insustentável", completou.
Mais uma que pediu para se anônima, certamente para não passar pelos julgamentos que a sociedade despeja em cima das mães, conta: "Home office em período de crise, muito trabalho remoto. Gerencio uma área de marketing. Filha única de 7 anos que não aceita homeschooling e acha que nada que eu ou meu marido explique é como os professores. Escola manda várias atividades e acha que tá arrasando. Enfim, um horror".
É consenso, entre as mães, que as escolas deveriam desistir das atividades remotas e decretar férias, como fizeram alguns outros países em meio à crise.
Se as mulheres com companheiros já estão sobrecarregadas, as que não contam com apoio algum estão arrancando os cabelos. As que antes podiam contar com a escola, as avós, as vizinhas para conseguir realizar algum tipo de trabalho, agora, durante a quarentena, estão desamparadas. Muitas delas, sem seus trabalhos informais, estão tendo dificuldades financeiras extremas que se agravam com a falta da merenda que as escolas públicas proporcionam.
Nenhum dos depoimentos colhidos disse que estava tudo bem.