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Todo mundo fala que "prevenir é melhor do que remediar" e que os exames de rastreio vão evitar doenças e complicações. O que nem sempre é colocado é que alguns cuidados em excesso podem implicar em riscos desnecessários. Muitos exames podem oferecer mais riscos do que os próprios diagnósticos desencadeados por eles, podem ter mais riscos do que benefícios.
Por Bruna Silveira
Todo mundo fala que "prevenir é melhor do que remediar" e que os exames de rastreio vão evitar doenças e complicações. O que nem sempre é colocado é que alguns cuidados em excesso podem implicar em riscos desnecessários. Muitos exames podem oferecer mais riscos do que os próprios diagnósticos desencadeados por eles, podem ter mais riscos do que benefícios, e podem produzir resultados falso-positivos, sobrediagnósticos e, consequentemente, sobretratamentos e iatrogenias.
Falso-positivo é quando o resultado indica a presença de uma doença que na realidade não existe. Sobrediagnóstico é achar uma doença ou condição que nunca provocaria sintoma algum ou morte - e que o diagnóstico em si pode ser mais prejudicial do que a própria questão. Como consequência, existe o sobretratamento, que é, portanto, uma intervenção desnecessária. Por fim, a iatrogenia consiste em um dano, material ou psíquico, causado ao paciente pela intervenção médica.
Temas como esses têm sido amplamente discutidos no Brasil e no mundo, e já são considerados importantes questões de saúde pública. Um artigo do periódico “British Medical Journal” (BMJ) já aponta a iatrogenia como a terceira causa de morte nos EUA.
Nesse contexto, o médico de família belga Marc Jamoulle criou o conceito de Prevenção Quaternária, que é definido por “ação tomada para identificar um paciente sob o risco de medicalização excessiva, para protegê-lo de novas invasões médicas, e para sugerir intervenções eticamente aceitáveis”. Atualmente existem movimentos mundiais para evitar esses excessos de exames e intervenções em saúde, como a campanha Choosing Wisely (ou "escolhendo sabiamente", em português), iniciada em 2012 nos Estados Unidos, que já acontece no Brasil.
Apesar de recente, essa campanha dialoga com um dos conceitos mais antigos em atenção à saúde: Primum non nocere, que significa "primeiro, não prejudicar" – também conhecido como princípio da não-maleficência.
"Mas e os exames anuais?"
Nem sempre precisam ser feitos.
Em boa parte da vida, pessoas saudáveis, sem sinais, sintomas ou fatores de risco, realmente não precisam fazer nenhum exame laboratorial ou de imagem anual. Os riscos individuais variam, por exemplo, com a idade, a história clínica, o histórico familiar de doenças e os hábitos de vida. Muitas vezes é mais importante, portanto, uma avaliação qualificada de um profissional de saúde que aborde essas questões, do que os exames complementares que detectam doenças precocemente.
"Mas é sempre melhor achar a doença precocemente pra ter mais tempo de resolver"
Nem sempre também.
A rede global de pesquisa Cochrane lançou uma metanálise que mostra que check-ups padronizados não reduzem mortalidade - nem mesmo em casos de doenças cardiovasculares ou de alguns tipos de câncer. Com o avanço da tecnologia, podemos rastrear cada vez mais rápido doenças em estágio inicial. Com isso, estamos observando o aumento da prevalência de muitas doenças sem a redução da mortalidade - sendo que, em muitos casos, observamos o aumento de complicações pelos tratamentos desnecessários. É o que temos observado, por exemplo, no rastreio do câncer de próstata: exames desnecessários, sobrediagnósticos e sobretratamentos podem trazer graves problemas de saúde e, inclusive, aumentar a mortalidade.
É por isso que o Choosing Wisely incentiva que, ao procurar um serviço de saúde, todas as pessoas façam as 5 perguntas a seguir:
- Eu realmente preciso deste exame, tratamento ou procedimento?
- Quais são os riscos e desvantagens?
- Quais são os possíveis efeitos colaterais?
- Existem opções mais simples e seguras?
- O que ocorrerá se eu não fizer nada?
Para a escolha de um cuidado adequado, é preciso cobrar dos profissionais de saúde uma postura isenta, atualizada e, principalmente, não vinculada à grande indústria farmacêutica. Nesses casos, vale a máxima: não existe escolha sem informação qualificada.