DIÁRIO DA CHINA

As mulheres azuis da China

Conheça as vestimentas tingidas com índigo pelo povo Yao que são cultivados e produzidos pelas mulheres dessa etnia

Créditos: Reprodução internet - Mulheres Yao preparam o suco índigo para tingimento natural de tecidos
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Em mais um texto da série sobre as roupas tradicionais das diferentes etnias chinesas, que   variam em materiais, confecção, cores e desenhos, de acordo com os estilos de vida, o meio ambiente e as crenças de cada um, a indumentária típica é um dos elementos mais visíveis da identidade cultural de cada uma das minorias étnicas. Hoje, conheça as 'Mulheres azuis da China', do povo Yao.

Com uma população de mais de 2 milhões e 600 mil pessoas (dados de 2000), essa etnia vive nas regiões montanhosas do sul da China, especialmente em Hunan, Yunnan, Guangdong, Guizhou e Jiangxi.

O índigo azul é parte central da cultura e da identidade dos Yao. A planta Indigofera tinctoria e espécies relacionadas são cultivadas desde a antiguidade no leste da Ásia, Egito, Índia, Bangladesh e Peru. As evidências mais antigas do uso desse pigmento natural datam de 4 mil aC na região onde hoje é o Peru. Há indícios de que o índigo da China tenha sido importado da Índia pela Rota da Seda. 

Para as mulheres da minoria étnica Yao, a produção, o tingimento e a confecção de roupas de índigo azul é tão importante que podemos chamá-las de 'Mulheres Azuis da China'. O índigo é parte central da cultura e da identidade desse povo. É fácil reconhecer essas comunidades porque a maioria, mesmo os mais jovens, ainda usam as roupas tradicionais de algodão azul.

Xinhua - Mulheres Yao

Os Yao costumam cultivar variedades de arroz e milho adaptadas às montanhas e terras secas, pois geralmente habitam altitudes de 800 m a 1.500 m. Essas áreas de maior altitude também são adequadas para o crescimento de várias espécies de plantas que produziram índigo.

As atividades de produção têxtil são uma parte essencial da economia tradicional desse povo. Eles têm uma longa história de cultivo de plantas índigo, processando-as como corante e tingindo tecidos de algodão tradicionais. Esses tecidos e as roupas tradicionais foram por muito tempo o principal produto comercializado por essa etnia. 

Os Yao praticam uma antiga forma de taoísmo em um substrato de confucionismo, tudo misturado com adoração de ancestrais e espíritos. A religião está sempre presente nos principais aspectos de suas vidas. Os rituais elaborados exigem livros e pinturas cerimoniais, muitos deles lindamente elaborados e refletindo antigas tradições taoístas agora extintas na China.

Os tecidos azuis tradicionais são muito importantes nas cerimónias religiosas. Todo homem Yao deve ter um ritual religioso chamado “dujie” quando se tornar adulto. Nesse ritual é preciso preparar uma nova roupa tradicional e não pode usar roupas velhas, pois “dujie” simboliza o novo começo.

No passado, os Yao produziam índigo para roupas tradicionais duas vezes por ano, com horários de produção escolhidos de acordo com o calendário lunar. O primeiro período de produção de índigo ocorreu de junho a agosto e o segundo de setembro a outubro. 

Além disso, o processo de tingimento só era realizado em dias de cabra de acordo com o calendário lunar. Acredita-se que isso ocorreu porque as cabras de sua região são pretas, e a roupa de cor mais escura é um símbolo de distinção entre elas. A cabra preta, portanto, ajuda a escurecer as roupas. 

Em 2014, o centro cultural do condado de Qiubei, prefeitura autônoma de Wenshan, na província de Yunnan, no sudoeste do país, realizou um um censo da cultura tradicional étnica e folclórica do povo Yao.

Foi conduzida uma investigação detalhada do processo de fabricação de índigo na vila de Shangchongge. Os pesquisadores constatam que quase todas as casas de famílias dessa etnia têm um tanque de corante cheio de suco de índigo. Quem visita uma casa do povo Yao pode sentir a fragrância do azul índigo.

Um ancião Yao entrevistado durante essa pesquisa explicou que a etnia costumava usar roupas e calças feitas de linho branco. Mas como as peças claras sujam com facilidade durante o trabalho, uma esperta garota inventou uma maneira de tingir as roupas de azul e preto com suco de índigo. Com o tempo, o artesanato tradicional de fazer e tingir índigo entre esse povo foi formado, e é seguido até hoje.

O processo de fabricação do suco de índigo é bastante complicado. O método de produção específico é o seguinte: em junho e julho de cada ano, os Yao pegam as folhas e galhos do índigo que cultivaram e os colocam em um "poço de índigo azul" especialmente projetado para embeber por cinco dias e cinco noites. Quando a água do poço fica azul escura e emite um cheiro de matéria orgânica em decomposição, os galhos e folhas de índigo são removidos. 

Uma quantidade adequada de pó fino de cal é polvilhado no poço índigo e o líquido é mexido vigorosamente com uma vara de madeira. Após cerca de uma hora de operação, uma grande quantidade de espuma verde flutua na superfície da água e indica o fim dessa fase. Em seguida, são usadas folhas de bananeira e palha para selar o poço e evitar que o suco de índigo estrague. 

Após dois ou três dias, cal e índigo se combinam e ficam depositados ao fundo do poço. Então, a água residual na extremidade superior do poço índigo é desprezada e fica apenas o suco índigo semi-sólido solidificado. Alguns dias depois, o suco de índigo solidificado é embalado em cestos de bambu e levado para casa para armazenamento. Esse produto é a base do processo de produção do suco de índigo.

Tingir roupas com suco de índigo é outro processo complexo que requer uma operação cuidadosa e meticulosa. O suco de índigo solidificado é colocado dentro de uma cuba e é adicionada água para diluir e, então, é acrescentado vinho de milho caseiro para, então, se transformar em um corante. Essa substância é retornada ao poço do índigo.

Todas as manhãs o corante é mexido com um bastão de madeira. Após sete dias e sete noites, a água do poço ficará amarela e indica que o líquido está pronto para receber o tecido para tingimento. 

O tecido é mergulhado no corante líquido no poço uma vez por dia durante cerca de três horas, quando é retirado, lavado com água corrente e colocado para secar ao sol. Esse processo é repetido ao longo de dois meses, até que o tecido chega a um azul escuro.

Esse processo complicado e demorado é conduzido pelas mulheres da etnia e é um teste de paciência e cuidado. 

O povo Yao cultiva a planta do índigo e produz o suco de índigo por conta própria. Além de atender às necessidades de próprio tingimento, o corante natural também é vendido no mercado local. 

Xinhua - Mulher Yao com o tecido tingido de índigo e bordado.

As roupas tingidas com suco de índigo são lustrosas, a fragrância é duradoura, as cores são simples e dignas, e o bordado artesanal e outros ornamentos de prata a tornam ainda mais bonita. Pode-se dizer que um conjunto de trajes Yao é um símbolo da sabedoria e engenhosidade feminina desse povo. 

As vestes tradicionais dos Yao foram listadas como patrimônio cultural imaterial nacional da China.

Até amanhã!