Durante a minha temporada na China, tive oportunidade de trocar ideias com um jovem universitário chinês que é estagiário no programa do qual participo aqui no país sobre aspectos do cotidiano. Um dos temas sobre o qual conversamos foi a presença do pensamento marxista no dia a dia dos chineses.
Marcos, o nome ocidental dele que pela explicação rende um texto exclusivo, mas dou logo um spoiler: remete ao significado em mandarim: três pontos de água (mar, rio e lago). Um idioma que é pura poesia e conexão do ser humano com a natureza.
De volta ao tema central, o marxismo é ensinado nas escolas desde cedo e é extremamente valorizado nas universidades chinesas. Os que alcançam nível de pós-graduação recebem até casa para morar.
Um contraste enorme com o ensino brasileiro. Ao contrário do que os desvairados da extrema direita alardeiam, o marxismo está bem longe das salas de aulas do Brasil. Muito pelo contrário. O que impera é o ensino do pensamento liberal. Quem quiser aprender sobre marxismo que lute.
É extremamente curioso que uma civilização milenar tenha incorporado uma teoria elaborada por dois homens brancos europeus, Karl Marx e Friedrich Engels, sem abrir mão das condições nacionais da China.
A base teórica da construção do socialismo com características chinesas, o motor da nova longa marcha desse gigante asiático, é ancorada no marxismo, mas também nas tradições culturais e história chinesa.
A origem ideológica dessa fusão entre o modo chinês de ver o mundo e o marxismo, a sinonização, foi proposta pelo líder revolucionário Mao Zedong (1893-1976) no livro Oposição ao Culto de Livros, de 1930.
Anos depois, outro líder chinês, Deng Xiaoping (1904-1997), propôs a “reforma e abertura” do país, em dezembro de 1978. Foi um passo importante para a sinonização do marxismo, e consolidou as diretrizes do socialismo com características chinesas, que passou a participar da economia global que podemos chamar de “economia socialista de mercado”.
A sinonização do marxismo é um movimento político encampado pelo Partido Comunista Chinês (PCCh). Muitos livros de política de universidades chinesas ensinam que a história do PCCh é a história da sinonização do marxismo.
Em 2004, o PCCh lançou o "Projeto de Pesquisa e Construção da Teoria Marxista", e a Universidade de Pequim começou a realizar o “Projeto de Pesquisa e Construção da Teoria Marxista” durante o Congresso Mundial do Marxismo, realizado em 2015. O objetivo é fazer da China o centro de pesquisa do marxismo contemporâneo.
Em novembro de 2021, durante a Sexta Sessão Plenária do 19º Comitê Central do PCCh, foi dado mais um passo importante na longa marcha da China na construção do socialismo chinês.
O destaque do evento foi o 'Pensamento sobre o Socialismo com Características Chinesas na Nova Época', elaborado pelo atual presidente chinês, Xi Jinping. As ideias do líder chinês representam o mais recente avanço de adaptar o marxismo ao contexto chinês.
A teoria de Xi tem como base, entre outros, o marxismo-leninismo, o pensamento de Mao Zedong e a teoria de Deng Xiaoping. A meta dessa nova etapa do marxismo chinês é transformar o gigante asiático em um poderoso país socialista moderno. Para isso, foi elaborado um plano com duas etapas, de 15 anos cada uma.
A primeira fase começou em 2020 e segue até 2035 e tem como meta a modernização do país. A segunda etapa, a partir de 2036, pretende transformar a China num poderoso país socialista moderno que seja próspero, forte, democrático, culturalmente avançado, harmonioso e belo.
Uma inspiração e tanto para uma comunista brasileira, que acredita de coração que é possível construir um Brasil próspero, forte, democrático, culturalmente avançado, harmonioso e belo a partir da nossa própria história. Quem sabe um dia? O próximo passo para nossa marcha nacional será nas urnas, no dia 2 de outubro. Oxalá nos permita ser feliz de novo, com a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva.