O pai dele era baiano, o avô pernambucano. O bisavô, mineiro e o tataravó baiano.
Um nome simples, três consoantes e duas vogais. Um Chico como tantos, um Chico diferente de milhões. Um Chico único.
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Francisco Buarque de Hollanda, um filho do Brasil, completa 80 anos neste 19 de junho, que deveria ser feriado nacional.
Se os rubro-negros se cumprimentam com um Feliz Natal todo 3 de março, dia de aniversário de Zico, o Brasil deveria homenagear seu filho mais ilustre. Uma quase unanimidade. O quase fica por conta de Nelson Rodrigues, garantindo que toda unanimidade é burra e Chico, até seus inimigos sabem, está muito longe de estar de mal com a inteligência.
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Ele, o filho do Brasil, sempre estava ao lado do Pai e de seus irmãos, 200 milhões. Nunca faltou. Desde o início, quando embalou a todos com aquela banda que deixou todos com inveja. Há maneira mais gostosa de estar à toa na vida do que ver a banda passar, tocando coisas de amor?
Não foi a única canção singela. Quem, na infância, não foi herói, não teve um cachorro que falava inglês e não enfrentou os alemães e seus canhões? Ah, Chico...
Da simplicidade à maravilhosa complexidade de Construção? Um cubo mágico sonoro, um caleidoscópio de rimar proparoxítonas. Afinal, o operário se acabou no chão, como se fosse um pacote flácido ou tímido. Bêbado? E, antes, ele flutuou no ar como se fosse um príncipe? Ou um pássaro? Ou um sábado?
Também há a simplicidade enganosa, que lhe valeu uma vaia imensa no Maracanãzinho. Naquele festival, todos estavam embalados pela cantiga guerreira de Geraldo Vandré, todos estavam caminhando e cantando, querendo fazer a hora. Eram tempos bicudos, tempos de chumbo. E Chico vem com uma musiquinha falando de sabiá. Ouvidos mais atentos perceberiam que aquela era uma nova canção do exílio, de Gonçalves Dias. Se ele queria voltar porque as aves que aqui gorjeiam não gorjeiam como lá, Chico e o Quarteto em Cy diziam “vou voltar, sei que ainda vou voltar, para o meu lugar, foi lá e ainda é lá, que eu hei de ouvir cantar uma sabiá, cantar o meu sabiá”
Chico nunca deixou o Brasil sozinho, junto com milicos usurpadores. Denunciou a Ditadura em Roda Viva, em Cálice (Cale-se), fez o Brasil entrar em catarse coletiva quando garantiu que ia passar nesta avenida um samba popular, dormia a nossa pátria-mãe tão distraída, sem saber que era subtraída em tenebrosas transações.
E deixou claro que apesar deles, haveria um novo amanhã, com o povo a sorrir.
Vibramos quando Chico driblou a censura como Garrincha driblava seus joões. Foi Julinho da Adelaide o seu pseudônimo e dizendo para os governantes de plantão que você não gosta de mim, mas a sua filha gosta.
E que tal um samba para espantar o tempo feio, para remediar o estrago, para alegrar o dia, para zerar o estrago, que tal um samba depois de tanta mutreta, cascata, derrota, demência e uma dor filha da puta?
E há o Chico do amor. Eu, pobre escriba, nunca fiz um soneto, mas já tive retratos em branco e preto. E quem não chorou atrás da porta, muitas amaram por um sonho de valsa, e quantos não mergulharam no amor com a intensidade acima da prudência, recomendada em Futuros Amantes. “Não se afobe, não, que nada é pra já, o amor não tem pressa, ele pode esperar em silêncio, num fundo de armário, na posta restante, milênios, milênios no ar...futuros amantes, quiçá, se amarão sem saber, como a mor que um dia eu deixei pra você.
Aqui, me despeço, Chico. Sou um de seus irmãos brasileiros, e como você, fã de Dorival, Jackson, Ari, Vinícius, Nelson, Pixinguinha, Gonzaga, Noel, Cartola, Orestes, Caetano, João Gilberto, Erasmo, Ben, Roberto, Gil e Hermeto, Edu, Bituca, Nara, Gal, Betânia, Rita, Clara.....
Estou com a vista enevoada. Obrigada, irmão, meu artista brasileiro.